Capítulo 7 - Decepção

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Milena ainda encarava fixamente o advogado, quando ele repetiu:

– É, não tem jeito... A circunstância de culpa exclusiva da vítima tira desse motorista qualquer tipo de responsabilidade criminal e civil. E isso também vale para a empresa empregadora. Não foi à toa que a doutora Carmen se empenhou tanto nessa defesa.

César se angustiou com a expressão de inconformismo de Milena, porém antes que ele dissesse qualquer coisa para consolá-la, ela explodiu em revolta:

– Mas isso não é justo! Agora são só os dois e eles já têm idade... O pouco de dinheiro que eles tinham usaram para pagar a faculdade do Danilo. Isso não é justo! - a voz dela ficou falha, então não pôde mais conter o choro.

Vendo-a chorar, César se sentiu de mãos atadas. Ele concordava, não era justo. Cerrando os punhos, ele logo tratou de retrucar:

– Pelo amor de Deus, senhor Roberto, todo mundo sabe da péssima reputação dessa transportadora. O jurídico deles nunca joga limpo e eles são podres de ricos! Por maior que fosse uma indenização paga a esse casal, isso não é nada perto do que eles faturam em um só mês. Agora para os dois fará toda a diferença! Eles já perderam o filho e ainda vão ter que ficar assim sem qualquer tipo de assistência? Não, isso não tá certo!

Ouvindo aquele exaltado discurso, Milena manteve o olhar fixo no colega, surpresa e até desconcertada com a entrega dele à causa dos Sales.

– Eu concordo com você, César... - disse o advogado. – E imagino que o promotor de justiça do Ministério Público deve ter insistido na acusação desse motorista, ao invés de optar pelo arquivamento do caso, fazendo vista grossa para esse laudo, justamente porque ele pensou na família da vítima. Mas a doutora Carmen não quis saber de ser tão compreensiva. Uma empresa mais humanitária, mais responsável socialmente, talvez tivesse se prontificado a prestar um auxílio ao casal.

Diante das dificuldades expostas pelo advogado e percebendo que não havia muito a fazer, Milena foi abatida pelo desânimo.

– Como vou poder ajudar eles, meu Deus? - ela murmurou consigo.

Passados alguns instantes, César se obrigou a encontrar uma solução.

– Tudo bem, senhor Roberto, agora eu entendi porque o senhor disse que estávamos em um impasse. Mas o senhor acha que não dá mesmo pra ganhar com o que temos?

Após fitar a jovem Milena momentaneamente, triste com a decepção dela, Roberto respondeu:

– O que acontece, César, é que um pedido de revisão do laudo pode ser encarado como uma tentativa de colocar em dúvida a idoneidade dos peritos que trabalharam nele. Em geral, solicitações assim costumam ser negadas, já que atendê-las acaba forçando o órgão envolvido a reconhecer que alguém não fez seu trabalho direito. Agora, surgindo uma nova prova, a revisão passa a ser mais que justificada.

Um pesado silêncio pairou na sala. Milena ficou cabisbaixa e César cerrava os punhos, inconformado.

Roberto suspirou fundo, claro que não era a primeira vez que ele se via em uma situação tão triste quanto àquela. Ainda assim, ele sentiu que devia aproveitar a oportunidade para ensinar uma difícil lição àqueles dois estudantes, assim, em tom brando, mas bastante sério também, ele voltou a falar:

– Eu sei que é muito triste que um rapaz tão jovem tenha perdido a vida desse jeito. E que tudo deve parecer ainda mais triste com a lei cumprindo seu papel assim de forma tão imparcial, sem levar em conta toda a dor desses pais.

– Sim, é muito triste... - Milena entrecortou.

Mesmo com o coração apertado, firme em seu propósito, o advogado continuou:

– Nós seres humanos somos passionais, mas a lei não é assim, a lei é imparcial. Posso imaginar o que está sentindo, senhorita Milena. Sei o que é perder uma pessoa querida em um acidente de carro, um primo meu também morreu assim. Eu sei que é difícil se conformar, mas, independente da má reputação dessa transportadora, infelizmente, o que aconteceu ao seu namorado foi uma fatalidade.

Os olhos de Milena ficaram ainda mais brilhantes pelas lágrimas, porém ela assentiu.

– Espera, senhor Roberto, o senhor não pode estar tentando nos dizer que teremos que nos conformar! - exclamou César.

Sob o olhar atento de Milena, o advogado respondeu:

– Por pior que seja dizer isso a vocês eu não acho uma boa levar esse caso adiante, ao menos não no pé em que as coisas estão, porque talvez isso só sirva para expor esse casal a mais sofrimento.

– Mas esse recurso é um direito deles! - insistiu o estudante.

Milena fez um gesto ao colega, como quem dissesse que estava tudo bem, e depois voltou-se ao advogado.

– Senhor Roberto, posso perguntar como foi o processo do seu primo?

Roberto demonstrou surpresa com a pergunta, mas logo respondeu:

– Claro... Eu não era formado na época, então foi outro advogado que cuidou do caso. O meu primo morreu, mas tanto ele como o motociclista envolvido tiveram culpa no acidente. Eram veículos particulares, não havia empresas na história. As duas famílias receberam uma indenização da Prefeitura, porque um semáforo próximo do local do acidente estava quebrado. Enfim, foi um caso bem diferente.

Milena assentiu e depois olhou na direção do colega.

– Não vamos levar isso adiante, César. Mesmo antes de ouvir o senhor Roberto, eu estava na dúvida. E agora que sei que as chances de ganhar são tão pequenas, eu não quero correr o risco de fazer com que os pais do Danilo voltem a se decepcionar, mesmo porque eles já estão conformados com a decisão do juiz.

– Mas você mesma disse que eles precisam demais dessa ajuda!

– Eu sei, mas se entendi o que o senhor Roberto explicou, por pior que o pessoal da Sideral seja, pelo menos nesse caso eles estão jogando limpo. Foi o Danilo quem cometeu um erro - ela pestanejou e inspirou fundo antes de continuar -, e foi um erro fatal. Por isso eu vou ter que pensar em outra forma de ajudar os pais dele.

Roberto ficou impressionado com a maturidade da jovem estudante.

– Calma, Milena, ainda não está... - dizia César, mas ele se calou ao ouvir o som de um celular.

Era o celular do advogado, mas dessa vez não era uma chamada e sim um alerta.

– Ah, eu lamento, mas preciso sair agora. Tenho uma audiência daqui quarenta minutos - ele se levantou –, mas vocês podem continuar aqui pelo tempo que quiserem. Também podemos retomar essa reunião hoje à noite.

– Não é necessário, senhor Roberto - disse a jovem. – O senhor já nos ajudou até demais. Eu agradeço muito pela sua atenção.

– Não, não precisa agradecer. Eu tenho mesmo que ir, mas prometo que se eu pensar em algo, entrarei em contato.

Milena e César assentiram em agradecimento. Instantes depois, Roberto se despedia, porém antes que deixasse o escritório, ele se aproximou de Milena, pousou gentilmente a mão no ombro dela, e lançou-lhe um olhar muito fraterno.

– Sei que esse não é o melhor momento, mas eu vi seu empenho e não posso deixar de dizer isso: não desista de ser uma advogada!

Pega de surpresa, Milena vidrou um pouco os olhos, mas assentiu.

César se manteve em um perturbado silêncio, mal acreditando no desfecho da reunião.

Assim que Roberto se foi, Milena e César ficaram encarando um ao outro. Ambos, não achavam o que dizer, então Milena abaixou a cabeça e deixou que as lágrimas rolassem outra vez.

Continua...

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Notas do Capítulo:

1) Fonte da imagem original:

https://aettransportes.com.br/images/servicos/carga-dedicada.jpg

É, a situação segue dramática, né? Me contem o que estão achando nos comentários. Agradeço a todos que estão acompanhando por todo o incentivo e também pelos votos e comentários. Grande abraço e até o próximo capítulo. ^_^

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