Tudo igual

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Estou a ler, na manhã seguinte, no meu sofá branco quando entra a Carla.

- Feliz Cumpleaños - canta.

Baixo o livro.

- Gracias.

- Como é que foi o teu dia de anos? - começa a esvaziar a sua mala de material médico.

- Divertimo-nos.

- Bolo de baunilha com cobertura de glacé de baunilha? - pergunta.

- Claro!

- Frankenstein Júnior?

- Sim.

- E perdeste naquele jogo? - pergunta.

- Somos muito previsíveis, não é?

- Não ligues ao que eu digo - diz ela a rir. - Só estou com ciúmes por tu e a tua mãe serem tão queridas.

Pega no meu registo de saúde do dia anterior, dá uma vista de olhos às medicações da minha mãe e acrescenta uma folha nova.

- Hoje em dia, a Rosa não está disposta a passar nem um dia comigo.

A Rosa é a filha de dezassete anos. A Carla diz que eram muito próximas atá ao dia em que as hormonas e os rapazes tomaram conta da situação . Não consigo imaginar que isso pudesse acontecer entre mim e a minha mãe.

A Carla senta-se ao meu lado no sofá e eu estendo-lhe a mão para ela colocar a braçadeira de medir a pressão. O seu olhar recai sobre o meu livro.

- Flores para Algernon outra vez? Esse livro não te faz sempre chorar?

- Um dia vai deixar de fazer - digo eu. - Quero ter a certeza de que nesse dia o estarei a ler.

Ela revira os olhos e pega-me na mão.

É uma espécie de resposta torta mas depois fico a pensar se será verdade.

Talvez eu esteja a perder a esperança de que um dia, num dia qualquer, as coisas mudem.


Tudo, Tudo e NósOnde histórias criam vida. Descubra agora