Capítulo 2
A única coisa que incomodava Alice era que tivesse comprado uma casa tão afastada do Centro e da Clínica, mas era linda, e não poderia simplesmente recusá-la. Mas o tempo que passava dentro do carro era cansativo após um dia cheio. Entrou pelo arco de pedra na entrada do terreno e estacionou seu carro, desligando tudo e ficando feliz de ter deixado a luz da sala acesa, não conseguiria ver um palmo à frente de seu rosto, caso contrário. Precisava urgentemente colocar uma luz por toda a varanda. E também outra luz no arco de entrada, talvez até mesmo um holofote bem forte.
Desceu de seu carro carregando a bolsa e o jaleco na mão esquerda, a chave de casa na direita, mas antes mesmo de subir o único degrau que a levava a pequena varanda, viu movimento à direita. Todo seu corpo travou, alguém estava escondido nas sombras da casa. Parecia que estava apenas esperando por ela chegar.
— Eu tenho uma arma. — disse sem pensar e ouviu um riso baixo como resposta. Pensou já ter ouvido o riso em algum lugar. — Estou falando sério.
Levou a mão à bolsa, fingindo que pegaria alguma coisa, mas a pessoa se aproximou, saindo das sombras completamente, ficando em frente a janela da sala, o corpo e o rosto agora iluminado fracamente.
— Adrien? — sua voz saiu esganiçada. O rapaz louco daquela manhã estava em sua casa. Engoliu em seco e afastou-se um passo.
— Ei, Doutora. — Adrien disse ainda sorrindo. Sabia bem que ela não tinha arma nenhuma na bolsa, e que também estava com medo. Evitou se aproximar mais e assustá-la um pouco mais.
— O que está fazendo aqui? — Alice perguntou sem tirar a mão da bolsa, precisava continuar fingindo que tinha algo ali dentro, não tinha ideia do que o rapaz era capaz e como ele havia descoberto qual era seu endereço.
— Bem... — Adrien pensou bem se deveria apenas contar tudo, mas ali fora ela poderia correr para a floresta, e se isso acontecesse, seu lobo ficaria um pouco descontrolado e a caçaria. — Vim lhe dar boas-vindas à cidade.
— Às onze da noite? Ficando escondido igual a um perseguidor? — perguntou começando a ficar irritada. O viu dar de ombros. — Boa noite, Adrien.
Subiu o degrau de madeira e colocou a chave na porta, temendo olhar para trás, mas sabendo que precisaria. O viu parado no mesmo lugar. As mãos enterradas na calça jeans, o rosto virado para a floresta, mas um sorriso de lado nos lábios.
— Não vai embora?
— Não quero. — respondeu se virando para ela, deixando sua jaqueta de couro se abrir devagar, revelando que estava sem camisa. A viu olhar seu corpo por inteiro e engolir em seco. Gostou daquela reação.
— Não quer? — perguntou se virando e respirando fundo. — Adrien, vá para casa... seja onde for.
— É perto. — respondeu subindo na varanda, indo para perto dela. A viu arregalar os olhos castanhos e encostar as costas na porta ainda trancada.
— O que pensa que está fazendo?
— Vim te fazer companhia. — respondeu dando de ombros, olhando-a de cima. Ela era um pouco mais baixa. Sorriu disso, ela era perfeita para ele.
— Como assim? O que quer dizer com isso? — Alice estava a ponto de gritar com aquele moleque insuportável. Mas seus olhos traidores seguiam a todo momento para o abdômen definido dele, e aquele V no quadril era impossível de não olhar.
— Te disse que sou um lobo, Doutora. Gostamos de fazer os forasteiros se sentirem bem vindos e protegidos.
— Você tem um problema grave.
Adrien riu disso e aproximou mais seu corpo ao dela, vendo-a arregalar ainda mais os olhos, colando ainda mais à porta, como se assim pudesse fugir dele. Deixou seus olhos se transformarem por alguns segundos, vendo-a semicerrar os dela, como se não tivesse certeza do que viu. Sorriu de lado e inclinou para frente, o cheiro dela era delicioso.
— Quer que eu faça outra vez, Doutora?
— Como fez isso? — perguntou curiosa e com medo. Nunca havia visto uma anomalia tão interessante.
— Já disse... — deu de ombros e inclinou o corpo ainda mais, espalmando as mãos ao lado dos ombros dela, vendo-a lhe mirar surpresa agora.
Transformou seus olhos castanhos humanos em amarelos de lobo, deixando-os apenas duas fendas, vendo-a observando aquilo com assombro, mas com uma curiosidade imensa, sem conseguir desviar o olhar.
— Gostou? — perguntou bem próximo, vendo-a estremecer com o tom da sua voz. Gostou desse efeito também.
— É maravilhoso... — Alice sabia que aquela anomalia precisava ser estudada, com toda certeza aquela cidade tão afastada dos grandes centros não teria nenhum especialista em anomalias como aquelas. Se é que houvesse algum especialista de alguma coisa ali. — Já procurou um médico...
— Posso te mostrar o resto da minha mudança.
Alice ficou pensativa. Aquele garoto com toda certeza tinha problemas mentais, teria que ser avaliado e talvez fosse internado na ala psiquiátrica. Mas entraria no jogo dele, faria com que ele visse que estava em uma ilusão muito grande sobre ser um lobo.
— Certo. Quero ver. — disse e o viu sorrir, se afastando e descendo o degrau da varanda.
Adrien sabia que ela não acreditaria em nada que falasse até vê-lo transformado, e estava pronto para isso. Retirou a jaqueta e a viu franzir o cenho. Quando abriu sua calça, ela se adiantou com a mão direita levantada querendo pará-lo.
— O que está fazendo? — Alice entrou em desespero ao vê-lo começar a se despir por completo.
— Não quero ficar preso dentro da minha calça. É extremamente desconfortável e não vou conseguir sair sozinho dela depois.
— Adrien...
Ele a ignorou e tirou a calça, e Alice olhou para cima, evitando ver mais que já tinha visto. Deus, ele era todo grande? Respirou fundo e afastou esse pensamento inconveniente e indecente. Ela tinha que pensar nele como um paciente. Um louco que precisava ser internado e tratado.
— Doutora, se não olhar, não vai fazer sentido.
Gostou da reação dela. Ela ficou interessada, mesmo que tivesse desviado o rosto logo após. Esperou que ela voltasse a olhar para baixo, então deixou que o lobo viesse a tona, rasgando sua pele de dentro para fora.
Seus ossos estalaram e ganharam um novo formato, um novo lugar, e logo ele estava de quatro no chão, pelos cobrindo sua nova pele, um focinho comprido no lugar de seu rosto, um longo e peludo rabo no final de suas costas, e que balançava feliz em estar perto dela.
Alice assistiu tudo parada no mesmo lugar, seu corpo em choque. Apertava as coisas nas mãos com força, como se fossem um bote salva-vidas. Sabia o que estava vendo, mas seu cérebro não estava registrando corretamente, aquilo não existia. Aquele rapaz havia desaparecido e de dentro dele saíra aquele lobo enorme e com os olhos amarelos como os de Adrien ao lhe mostrar a anomalia. E o lobo estava lhe fitando de forma atenta, analisando seus movimentos, como se estivesse lhe perguntando alguma coisa.
— Como... — não conseguiu terminar a frase, todo seu corpo amoleceu e tudo ficou escuro.
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Meu Lobo - Degustação
RomanceLANÇAMENTO AMAZON DIA 21/09. 'Ela nunca se sentiu em casa em nenhum lugar, com ninguém... até encontrá-lo! Alice pulou de cidade em cidade até chegar em Brookings, e encontrar um jovem rapaz ferido em sua clínica. Pouco sabia que ele era um shifter...