Capítulo 8

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Capítulo 8

Correr livre, sem restrições, sem preocupações, apenas... colocar as patas no chão e correr. Impulsionar o corpo para frente e sentir a grama deslizando por debaixo das patas, o ar batendo com força em seu pelo, os cheiros da mata e dos animais assustados ao redor. A liberdade que gerações antes da sua tiveram, e que aproveitaram até o último suspiro. A liberdade que somente um shifter de lobo saberia.

Descansou as patas nas pedras do rio, o vento gelado batendo em seu grande corpo, os pelos estavam encharcados, estava chovendo por toda a cidade. Virou sua cabeça para os lados, seus olhos de lobo vendo melhor que qualquer outro ser ali. Sabia muito bem que as criaturas menores fugiam com medo, mas que elas estavam ali, a espreita, esperando que ele se fosse para que pudessem voltar a normalidade, mesmo com a chuva forte.

Abaixou-se e bebeu da água fria, seu corpo estava gelado, mas sua mente ainda fervia. Tudo o que aconteceu em apenas alguns dias, era muito. Encontrar sua companheira, saber que ela não era apenas uma garota, mas uma mulher feita, uma médica, uma forasteira... aquilo mexeu com sua cabeça de uma forma que Adrien não estava preparado.

Sentou o grande corpo nas pedras escorregadias, pensando. Seu lobo estava feliz, alegre, ele havia encontrado a mulher com quem ficaria o resto da vida. Isso sempre foi motivo de comemoração em sua tribo, era um grande acontecimento, todos os lobos e lobas que encontravam seus companheiros, comemoravam. Todos sabiam que a busca acabava, que eles agora eram um, e toda aquela coisa melosa que Adrien odiava escutar. Que por toda sua vida, desejou que nunca acontecesse com ele.

Porém, a realidade era diferente. Sua companheira era mais velha, não conhecia as lendas, não sabia como as coisas funcionavam, não foi educada dentro de nenhuma tribo, era uma forasteira e com a vida feita, uma carreira... alguém que poderia ir embora à qualquer momento. Balançou o corpo com força, retirando o excesso de água dos pelos. Sua cabeça girava em todas as possibilidades, todos os caminhos que poderia existir, e não queria pensar que, na pior hipótese, Alice iria embora.

Pois essa era uma realidade sobre forasteiros, eles simplesmente poderiam partir. O lado do vínculo deles era mais fraco, eles sentiam pouco o elo que ligava o shifter à outra parte. Para um shifter, era algo devastador. E Adrien lembrava de ver um lobo mais velho sofrer quando sua companheira o deixou. Era diferente quando um companheiro morria, a perda era natural, era o ciclo da vida reiniciando. Outra coisa era quando um companheiro fazia as malas e ia embora. O shifter definhava, morria por dentro, e isso amedrontava Adrien até o último pelo.

Levantou o enorme corpo e começou a correr na direção de casa. Sua avó havia dito que deixaria algo na geladeira para ele, e mesmo que tivesse comido na casa de Alice, estava com fome novamente. Sua cunhada diria que era ansiedade, Anne diria que era porque estava nervoso. Adrien apenas estava com fome, as pessoas precisavam entender que às vezes fome, é apenas isso, fome.

Correu, derrubando pequenas árvores com seu grande corpo, amassando cascas velhas e apodrecidas, deixando uma trilha fácil de ser seguida pela mata. Transformou-se assim que chegou no quintal, mas não quis entrar. Ficou alguns segundos observando a residência de madeira. Seu avô e seu pai a haviam construído, com as próprias mãos, madeira a madeira, telha a telha. Sorriu ao pensar que sua casa, seu próprio canto, não estava longe de ficar pronto.

Pisou na cozinha, olhando ao redor, vendo a casa vazia. Sua avó deveria estar no Centro comunitário da tribo e seu pai no trabalho. Não sabia se queria encontrá-los realmente. Passou novamente a madrugada com Alice, e eram explicações demais para coisas de menos. Nada aconteceu, nada de importante, apenas conversaram. Palavras e explicações que foram necessárias e que cansaram Adrien além do que esperou que fosse acontecer.

Meu Lobo - DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora