São Paulo, junho de 2002.
O país todo está enlouquecido!, penso ao passar por mais uma blitz policial sem nenhum problema, acelerando a moto ao máximo, capacete preto espelhado impossibilitando qualquer um de ver que quem pilota essa máquina é um garoto, não um homem.
Eu não sou um homem! Não sou! Se fosse, não estaria aqui neste momento, mas sim na delegacia, gritando por aí, fazendo qualquer coisa que não apenas dar uma de burguesinho filho da puta endinheirado, acelerando uma moto que custa o mesmo que um apartamento popular, mesmo sem ter habilitação para isso, apenas para esquecer os problemas.
Eu sou um merda! E sou isso por causa "dele"!
Caralho! A Paulista está fechada por conta das comemorações do pentacampeonato. É, o Brasil conseguiu mais uma estrela no futebol, o país está eufórico como se não houvesse crianças na rua, assassinos à solta, a corrupção impedindo todo o sistema público de funcionar. Foda-se, somos penta!
Faço uma manobra rápida com a moto, deixando marcas dos grossos pneus no asfalto e sigo para outra direção, à procura de mais uma avenida extensa e reta para que eu possa extravasar todo o ódio dentro de mim indo ao limite da velocidade.
Paro a moto de repente e quase sou arremessado para frente. Meus músculos começam a tremer, meus olhos se enchem de lágrimas, sinto frio, meus dentes batem um no outro. Engulo em seco. Não vou chorar! Não choro mais, não há muitos anos.
Cada soco, cada pontapé, cada xingamento e mentira secaram minhas lágrimas. Elas até se instalam em meus olhos, porém não caem. Sufocam-me, quebram meu coração, desequilibram-me.
Caio no chão em um baque só, gemo de dor por causa do peso da moto sobre minha perna esquerda, mas não choro. Respiro fundo para controlar a dor, parar de tremer, diminuir os batimentos do meu coração. Estou acostumado a essa rotina de tentar não sentir dor, de tentar não sentir mais nada.
Levanto-me calmamente, sinto calafrios, manco, mas volto a subir na moto, acelerando-a, fazendo o motor girar e um ruído alto e potente se misturar aos sons das comemorações pelas ruas da cidade. Respiro fundo várias vezes e, quando não sinto mais nada, tiro o pé do chão e deixo a máquina me levar.
Eu queria poder fugir para o mais longe possível desta cidade, mas não dá, infelizmente não posso ir a lugar algum, estou preso, revivendo o mesmo inferno todos os dias, aceitando meu destino com resignação até poder livrar a mim e a Kyra do demônio que nos formou.
Eu poderia pedir ajuda ao Tim, mas sei que ele tem a própria merda para lidar e que conseguiu sair há pouco do inferno. Sei que precisava ir. Meu irmão estava por um fio, assim como eu, e, se ficasse lá conosco, seria para morrer ou matar, e, como não é da sua natureza matar, iria perecer aos poucos, como Nikkós gostaria que acontecesse.
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Alexios - Os Karamanlis #3 (DEGUSTAÇÃO)
Romance⚠️ Já se encontra completo na Amazon Os Karamanlis #3 Com um passado nebuloso, marcado por traumas, rejeições e violência, há anos Alexios Karamanlis busca entender a si mesmo e, para isso, começa uma caçada sem fim pelo destino de sua mãe biológica...