PILOTO

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Capítulo 01

Aprender a descascar uma laranja até a parte branca, dormir cedo e acordar mais cedo ainda, conseguir imitar o Mickey, fazer cocô com companhia, sempre lembrar que Ohana significa família, nunca esquecer que trovões são simplesmente os anjos trocando a mobília, aprender que quando você chorar outra pessoa chorará junto, levar bronca da pediatra e mais outras milhões de coisas você só vai aprender quando for mãe!

Se você já achou complicado me imagine ao seu lado nesse momento dando uma gargalhada exageradamente sarcástica, pois ter uma criança na sua responsabilidade é bem mais difícil e embaraçoso que isso…

Ninguém está realmente preparado, eu não estava realmente preparada quando o médico sorriu e disse "Parabéns Ingrid, você está grávida". Eu estava no meu último ano de faculdade, pronta para entrar no mercado de trabalho, e ter um filho com certeza não estava nos meus planos... A verdade é que a quatro anos atrás quase nada estava nos meus planos

Quatro anos atrás...

Enquanto eu corria a vários quilômetros por hora, num táxi qualquer na esperança de não dar a luz ao meu filho no meio da rua, pensei que seria bom ter Lucas ao meu lado. Pensei em apressar mais o motorista, mas vi pelo retrovisor que ele estava mais assustado e apreensivo que eu, tentei me acalmar,minhas mãos derramando gotas de suor. Eu não conseguia parar de pensar em quando aquilo acabaria, em como minha vida mudaria — para melhor, não me levem a mal — em como eu já tinha planejado cada detalhe da vida de Pietro, de como eu já amava aquele bebê como se tivesse passado anos com ele

— Aguenta moça, a gente tá chegando… — o motorista disse quase chorando

Por um instante pensei que era ele quem estava tendo um filho...

E foi aí que eu me lembrei do verão com Lucas, de como foi tão mágico, e a dor foi aumentando cada vez mais, senti como se meu espírito começasse a se esvair…

Minutos depois chegamos no hospital e eu não sei ao certo o que aconteceu.

— Senhora Ingrid? — Alguém, aparentemente médica me perguntou olhando fixamente nos meus olhos.

— Que mané senhora… — disse e a dor voltou tão forte que berrei.

— Acho que seu bebê está com um pouquinho de pressa, não é melhor chamar alguém? O pai talv…

— Não! — disse num tom elevado

— Desculpa, mas temos que chamar alguém…

Pensei em discutir com aquela mulher, talvez até ela entender que não existia ninguém a ser chamado, mas aparentemente o destino se encarregou disso. Não dava mais tempo de nada, era naquele instante ou nunca, senti muito medo, um medo tão grande que chamei o nome de Lucas várias vezes

E alí, por volta das dez da manhã, Pietro nasceu, e com ele um turbilhão de emoções nasceu em meu coração também. Enquanto segurava aquele pedacinho de pessoa em meus braços diversos pensamentos tomavam de conta da minha mente

— Ele é muito lindo Sr. Ingr…

— Só Ingrid! — disse para enfermeira e sorri

— Ele é lindo Ingrid!

— É mesmo! Será que eu vou conseguir? Ai meu Deus agora é pra valer… — meu sorriso se desmanchou e senti a adrenalina correndo pelo meu corpo

— Claro que vai senho… Ingrid, você foi muito forte hoje e tenho certeza que será uma ótima mãe! Com licença! — A enfermeira disse e saiu do quarto.

Aquele dia foi o mais feliz, o mais doloroso e o mais confuso da minha vida, mas tudo isso valeu a pena...

...

Desculpe, desculpe, aquela primeira lista está totalmente equivocada, são coisas bem superficiais. O que você realmente precisa aprender são tantas coisas que não caberiam em uma lista.
Quando me vi sendo mãe em uma cidade metrópole como o Rio, cheia de pessoas tão diferentes umas das outras e cheia de obstáculos na vida pessoal e interpessoal me perguntei: “por que diabos não existe um manual de como ser mãe/pai?”, algum tempo depois eu finalmente entendi; se algum louco se sujeitasse a escrever um, provavelmente passaria a vida toda escrevendo e não terminaria. A fórmula para ser um pai perfeito tende a ter muitos ingredientes, tantos que não caberiam em uma só receita

No começo era bem difícil, éramos apenas Pietro e eu — mais eu do que Pietro — nós dois contra o mundo.

Tivemos que lidar com muitas experiências novas, obstáculos, insônia e além de tudo o preconceito. O preconceito de uma sociedade hipócrita onde os bons costumes tem de serem seguidos custe o que custar, onde a família tem que ser constituída por pai e mãe e caso isso não possa ser possível azar da pessoa e que se dane!
Essa é a ideia de família nuclear do século 19, onde se é esperado que as mulheres tivessem filhos, ficassem em casa, fossem prendadas enquanto os homens trabalhavam e conseguiam sustentar a casa... Seria lindo se não fosse trágico.

No começo achei que não seria um problema, mas com o passar do tempo se tornou um, e dos grandes, a minha sorte é que eu não ligo para a opinião alheia…

Nunca liguei para o fato de ser uma mãe solteira e muito menos para o que pensariam disso, mas quando meu próprio pai virou as costas para mim mudei minha perspectiva sobre isso.

Simplesmente Acontece - Lucas OliotiOnde histórias criam vida. Descubra agora