Sempre que dizia ser pansexual as pessoas tiravam conclusões precipitadas de todos os tipos. Desde as classicamente ofensivas como "você deve pegar geral então" até as mais absurdas como "Isso quer dizer que você se relaciona com plantas e animais, eca!".
Já estava acostumado em responder esse tipo de perguntas sem noção com uma frequência que variava de uma vez por semana a dez vezes por dia. E mesmo com todo o desconforto de ter sua sexualidade questionada e muitas vezes ironizada, ele se sentia feliz pela primeira vez em tempos. Quer dizer, até aquilo acontecer a algumas semanas. Seu namorado de longa data terminou o relacionamento por email.
Ele não tinha lá um histórico muito longo de relacionamentos, Pablo foi seu segundo namorado sério e ainda não conseguia perdoá-lo por ter feito aquilo de um jeito tão informal. O email não dizia muito, além de informar que "esse negócio de relacionamento a distância não está funcionando" e "eu conheci outra pessoa aqui em Barcelona". Foi um choque, como se o chão tivesse sumido e ele fosse engolido por um buraco negro sem fim.
O termino refletiu negativamente no seu desempenho no trabalho. Ele era programador em uma grande empresa de softwares e por mais que estivesse se esforçando para ser profissional, as coisas não estavam indo muito bem.
– Juan, você está bem? – ergueu o olhar da tela do computador para encarar a pessoa dona da voz que o chamou. Era Carmelita, colega de trabalho de longa data e amiga inseparável. Ela o encarava com aqueles grandes olhos negros e profundos que pareciam ser capazes de ler dentro da sua alma. Tentou negar e retomar o trabalho, mas a moça o impediu tampando a tela do computador com as mãos.
– Você está mal e eu não sou a única que notou. Venha, vamos pegar um café, você bebe um chá. – ela emendou ao vê-lo torcer o nariz para a sugestão.
Durante os talvez dez minutos de intervalo que tiraram enquanto os chefões da empresa sairam para almoçar, Juan contou tudo a amiga que não poupou expressões de surpresa e alguns palavrões em voz baixa. "perro sem vergonha", foi o mais leve que ouviu ela falar.
– Mas você merece coisa melhor Juan, sério. Um cara que te trate bem e te respeite. Agora que vocês terminaram, acho que eu posso te dizer, nunca gostei do Pablo. – ela tomou um gole de café e então arregalou os olhos como se tivesse tido uma grande ideia.
– Por que você não tenta um aplicativo de namoro? Eu sei que existe uma área específica para caras gays, eu sei; você não é gay, mas não custa tentar, não é? – no inicio ele relutou, já havia sido chutado via computador, não queria começar um novo relacionamento através de um. Mas Carmelita foi insistente o bastante para que acabasse cedendo.
– E para não dizer que se esqueceu de criar uma conta, vamos fazer uma agora mesmo! Eu não me importo com a política da empresa, na verdade não vejo a hora de sair dessa pocilga! – ela disse animada enquanto voltava para a mesa de Juan, seguida de perto pelo rapaz. O perfil foi criado em poucos segundos e até o fim do dia ele já tinha alguns possíveis pretendentes, os quais, escondido da amiga, ele recusou.
O perfil do site de encontros permaneceu inativo até que numa bela tarde preguiçosa de domingo recebeu um email desconhecido. No assunto lia-se "Queria falar com você". Abriu desconfiado apenas para descobrir que Carmelita havia feito o favor de colocar seu email pessoal no cadastro do perfil e que um cara estranho estava entrando em contato.
"Olá, meu nome é Pedro Gutierrez, tenho 32 anos e me interessei pelo seu perfil, mas, como mandei várias mensagens e você não me respondeu, imaginei que não acessasse mais o site, ainda assim, resolvi arriscar. Assim como você, estou atrás de algo sério e duradouro. Será que esse algo pode ser você?
Abraços, Pedro"
Encarou a tela do computador por quase dez minutos até que uma buzina na rua o fez voltar para a Terra. Respirando fundo e pensando, "por que não? enquanto for digital, é inofensivo", começou a responder o email.
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Nuances do Horror
HorrorO Horror é como uma enorme paleta de cores, repleta das mais diversas nuances de pavor e medo, agora imagine cada um desses tons de medo com protagonismo LGBT. Imaginou? Pois é o que você vai encontrar nestas histórias aqui. Temos de tudo! Assassi...