pluie

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Harry olhava a cidade de cima. Sentado na beira da cama com sua camisa aberta por completo, seus pés nus contra o chão gelado. Entre seus dedos ele brincava com a bandana azul e seus pensamentos voando. Voando para alguns quilômetros ao leste onde uma festa em um café estava acontecendo.

Ele deveria estar lá.

Ao longe, um raio corta o céu. O som vem logo depois e seus olhos fecham com força o levando para uma imagem desfocada de um azul intenso no qual ele queria se afogar.

Louis.

Louis era o sol nos dias nublados, o sol que invadia suas noites chuvosas, ele irradiava um calor que Harry não sentia desde... Desde Anne e Gema.

Fechou os olhos com força. Essas lembranças agora não, pensou.

Enrolou a bandana nos cachos compridos. Suspirou fundo. Fechou alguns poucos botões de sua camisa florida, calçou suas botas e foi em direção à porta, sentiu a maçaneta gelada contra sua mão suada. Respirou fundo mais três vezes e saiu.

- Vai querer o carro, Sr. Styles?

- Não, obrigada Josh.

Josh assentiu e continuou ouvindo seu radinho de pilha. Harry o dera no natal passado. Josh não era muito ligado em tantas tecnologias e preferia as coisas menos complicadas para mexer.

Eles se conheceram quando Harry estava pronto para sair daquele maldito orfanato, um dia após completar seus vinte e um anos, de agora em diante, seria ele por ele mesmo. Só que lá estava Josh com sua grande limusine, de brinde a noticia que seu pai havia morrido e deixara toda a fortuna para o único filho quando esse se tornasse maior de idade. Fortuna essa que Harry nem sabia que existia. 

Desmond havia sumido quando ele tinha só algumas semanas de vida, ele nunca mandara um cartão de aniversário ou qualquer quantia em dinheiro para ajudar nas despesas de casa, saber que ele tinha conseguido uma fortuna ao longo dos anos, enquanto sua mãe se matava de trabalhar e sozinha cuidava de duas crianças, o deixou furioso, mas ele não tinha escolha, para onde ele iria?

Tudo bem que Josh passou mais de quatro meses o seguindo, levando comida e roupas para um Harry irritado e sem teto, a cada novo beco ou rua que o mesmo encontrava para passar a noite. Até que um dia Harry cedeu.

Josh era viúvo e nunca tivera filhos, por mais que eles não admitissem, havia uma cumplicidade entre os dois que ia muito além da relação patrão-mordomo-motorista.

Os estrondos dos trovões eram silenciados ao longe pelas luzes e barulhos da cidade, Harry caminhava entre as pessoas, as mãos nos bolso do jeans apertado tentando evitar aquela sensação de déjà-vu, o tempo parecia o mesmo, o jeito como o vento batia no seu rosto, era doloroso, mas ele não conseguia afastar da mente as lembranças daquela noite e tudo que se sucedeu após o acidente.

Anne era o tipo de mãe que levava seus filhos para o barro ao lado de fora e rolava junto com eles, sem a preocupação com toda a sujeira que ficaria nas roupas ou no chão de carvalho que os levaria ate o banheiro de lajotas rosa bebê para um banho cheio de piratas e monstros marítimos.

A pipoca e o chocolate quente nos dias mais chuvosos e frios, os filmes de animação e os jogos de tabuleiros era uma das lembranças mais preciosas que Harry levava consigo.

Gemma montava um forte de lençóis quando os trovões eram altos demais assustando um Harry de bochechas rosadas e pijaminha colorido de aviões. Com uma lanterna, eles deitavam entre cobertores e almofadas, Gemma o ensinando a ler enquanto lia histórias até pegarem no sono. Anne os encontrava embolados um no outro, Harry com sua mãozinha agarrada a de Gemma que babava em seu travesseiro. 

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