Uhgood

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"Tudo que você precisa é de você."

Às vezes existem dias ruins, dias em que a chuva, o inverno, a neve não passam, tanto no seu interior como no exterior, existem dias em que você se questiona o por quê nasceu, o por quê ainda não desistiu de ser você, mas acredite em mim quando afirmo que com certeza o inverno precisa vir antes da primavera, não só porque naturalmente e biologicamente falando as quatro estações funcionam assim, metaforicamente isso também ocorre sem que nós notemos. Aconteceu comigo, em um dia eu estava no meio da chuva, no outro eu simplesmente floresci, a primavera chegou a mim como uma brisa suave e culminou para que eu florescesse, para que a esperança voltasse a mim, e ela voltou em forma de casa, em forma de Ilsan, minha cidade natal.

Estar em casa.
Até meses ou dias atrás não saberia sentir o que é, sentir o cheiro de café misturado com morangos frescos, que só inverno e primavera juntos foram capazes de fazer; mas ter um lar é isso, é sentir, sentir que não está sozinho, sentir que você e as pessoas quem ama são o seu lar independentemente de onde elas estejam e o mesmo ocorre com você, o mesmo ocorre comigo, a cada dia aprendo a me amar, a colocar isso em prática. Minhas mãos cravadas no volante e o rádio que toca uma música com melodia suave, mas dançante, evidenciam que agora me cobro um pouco menos, tudo porque estou aqui, porque não desisti, porque optei passar por todas as fases para dar frutos, posso arriscar a dizer que a estrada a minha frente é a prova disso.

O carro que conduzo parece contar toda a minha trajetória desde Seoul para Ilsan, lar para lar, decidi ir até o meu, não perdi tempo pegando bagagens, roupas, suprimentos, nem mesmo uma barrinha de cereal a qual aprendi a apreciar tanto, não peguei nada além das chaves do carro e uns trocados para gasolina, afinal tudo que importa está nesse veículo, eu. Minhas mãos involuntariamente são levadas até o pequeno aparelho de som instalado no velho sedan, definitivamente aumentar a música é necessário, posso até mesmo comparar este momento com o final de uma comédia romântica americana, aonde tudo costuma terminar bem, o mocinho casa com a mocinha, os vilãos costumam se redimir, e tudo acaba em uma música alegre, com uma melodia que faz seu coração pulsar junto, agora me sinto exatamente assim.

Meu coração pulsa juntamente com o ritmo da música alta e de ansiedade em ver meus pais, meus avós e minha irmã, em principal Jeongmin, minha irmã mais nova que engravidou há quatro meses atrás, eu prometi que a veria, tentei de todas as maneiras me sentir feliz por ela, mas como ficar feliz por alguém sendo triste consigo? Sinto que posso ter a desapontado, nós éramos como unha e carne antes da mudança para Seoul acontecer, lembro como ela chorou enquanto colocávamos algumas caixas no carro, eu faria tudo, na época, para cessar suas lágrimas, foi então que decidi deixar minha pulseira favorita, com vários pingentes de notas musicais, prometendo que eu iria fazer o melhor por ela e não desistir. Também pedi para que ela não desistisse por mim, para que terminasse os estudos e cuidasse de nossos pais, é extremamente incrível como a vida passa em um piscar de olhos, como tudo muda, como tudo são fases, me sinto grato por tais mecanismos ocorrerem.

Firme no volante, sigo cantarolando cada parte da nova canção que agora é reproduzida, mantenho os olhos atentos em cada canto da estrada, uma nova placa avisa que cheguei, entretanto é impossível ignorar a paisagem que me recebe, uma praia que há muito não vinha ou cogitei vir, Ilsan Beach, a praia de areia fina e pedrinhas onde costumava escrever minhas primeiras canções, olhar as ondas baterem contra a água calma me inspirava, eu me sentia como o mar, um tanto quanto parado, mas a música era e é minha onda, minhas ondas que me tiraram da zona de conforto, faziam com que me sentisse vivo, expressando todo tipo de sentimento somente com caneta e papel, voltar as origens me mantém mais vivo ainda.

Após diminuir cada vez mais a velocidade do carro, decido parar no acostamento e atravessar a rua de vez, cada célula minha clama por sentir a areia fina e clara do meu lar nos pés, assim retiro os tênis, em seguida pisando na areia, a sensação é revigorante, me traz inúmeras lembranças, é como verdadeiramente estar em casa, descubro mais uma vez que o mar é essa casa, uma casa infinita e feita de tijolos de areia, uma casa com espaço ideal para caber todos os meus sonhos, que agora mais do que nunca tornaram-se infinitos.

— Oppa? — Alguém cutuca minhas costas enquanto caminho pausadamente.

— Min?! — Eu poderia reconhecer sua voz do outro lado do oriente, irmã. — O que faz aqui? — Pergunto, Jeongmin nunca foi fã de lugares com tanta areia assim.

— Senti saudades de você, então vim para o seu lugar. — Ela sorri radiante enquanto acaricia a barriga saliente.

— Senti tanto a sua falta. — Me pego puxando a mais nova para um abraço, o que não contava era que lágrimas começassem a descer pelo meu rosto, enxarcando seu vestido azul.

— Oppa? Está tudo bem? — Sinto seu coração se acelerar ainda junto de meu corpo.

— Está sim. — Fungo enquanto me afasto, secando algumas lágrimas. — Apenas passei por momentos difíceis, tão difíceis que não consegui nem vir para casa. — Confesso.

— Mas você finalmente veio, Joonie, isso é tudo que importa. — Ela afaga uma de minhas bochechas, é involuntário não sorrir diante disso.

— Sabe, Min, haviam dias em que eu me perguntava quando o inverno iria embora e a chuva iria passar, quando eu finalmente iria voltar a ser quem era e pararia de procurar respostas mesmo sem saber as perguntas. — Falar tudo isso é como tirar o peso de minhas costas.

— Você deveria ter me telefonado. — Respira fundo, posso ver seus olhos lagrimarem um pouco. — Desculpe, os hormônios me deixam emotiva. — Leva sua mão esquerda até um dos olhos. Posso notar o balançar das notas musicais ainda presas em seu pulso através da pulseira.

— Puxa, você ainda a tem!
— É a nossa promessa, prometemos não desistir, lembra? — Apenas concordo com a cabeça.

— Aprendi a ser melhor, Min, aprendi a não desistir, aprendi a me tornar eu novamente. — Comento orgulhoso. — Lembra de uma frase que te disse quando foi a Seoul me visitar?

— "Eu não posso deixar o eu que você conhece ir" — Ela acaricia a barriga mais uma vez, e então se encosta em uma das pedras maiores ao nosso lado. — Jamais me esquecerei, você prometeu continuar, por todos os seus ideais, e bom, vejo que funcionou, eu e Sakura ouvimos todos os dias suas composições. — Aponta para a barriga.

— É uma garotinha, então? — Ela confirma sorrindo orgulhosa. — Bom, então jamais posso deixar o eu que vocês conhecem ir. — Levo uma de minhas mãos até o abdômen saliente da mais baixa.

— Puxa, ela gosta mesmo de você, até chutou!

— Acho que ela gostou de ter uma promessa só nossa. — Sorrio.

"Fracassar é algo tão doloroso
Se você não passar por isso, não tem como saber
Meus ideais e realidade, tão distantes
Mas ainda assim, atravessando essa ponte, quero me alcançar."

Escrito por: pjmcoeur
Revisado por: LuaInAHoodie
Capa e Arte por: LuaInAHoodie e pjmcoeur

Mono: Monster No MoreOnde histórias criam vida. Descubra agora