002. Āeksākogon

406 4 0
                                    

Cersei Lannister, a Luz do Oeste.
Jaime Lannister, o Jovem Leão.

Implacabilidade. De impossível forma de se mitigar, amuar, ceder ─ inexorável. Nascera com o pensar de que o desistir era pura vexatória, e quando uma problemática surgisse diante de seu rosto, que empunhasse e brandasse o afiar da espada até que lhe arrancasse a cabeça. Problemas degolados eram problemas bem resolvidos, ele aprendera. Assim que rasgasse as artérias e dilacerasse a carne, o resto era seu para deleite.

Que ocorria quando um simples homem descobrisse o leão dentro de si mesmo, arranhando as paredes das entranhas como a fera que bem era? Ele urrava, dentro de si; pedia para sair e estalava a cauda como chicote agourento. Solte-me, pedia a besta dourada. Solte-me!

Sair de Rochedo Casterly fora como um apunhalar no abdome. Maestria com as mãos, era casar com as espadas ─ torná-las suas noivas, beijá-las, venerá-las ainda de pé. Não era preciso genuflexório quando o seu deus ardia entre os dedos, sujismundo de sangue daqueles que ele permitia que você conquistasse. Matar era oferecer em agradecimento, se o sujeito fosse poético o suficiente para acreditar naquelas ladainhas.

Suor, sangue e saliva. Fora tudo que ele provara por muito tempo, mais tempo que era acostumado a contabilizar. As artes da sabedoria e estudos em afinco cabiam ao mais novo, ao anão ─ mas Jaime nunca fora ambicioso. Não quando era lecionado acerca da insistência, da dramatização e do poder. Que era o poder? Nunca pegava-se em filosofias, em questionamentos flutuantes acerca da existência de algo, mas todo homem que amava, transmutava no que era um animal enjaulado, melancólico e faminto demais.

Tocá-la dava sede, mas não da garganta; não era como tomar a espada ou manejar bem os próprios punhos contra um queixo. Tocá-la era tocar a si mesmo, porque Cersei era mais Jaime do que Jaime era ele mesmo. Era um órgão, uma extensão corpórea de madeixas maiores e lábios quentes, reluzente ao Sol e maliciosa nas palavras pelos corredores do Rochedo. Não a vira até casar-se, e lembrava-se do quão bem ela o pedira para ficar. Queria-o perto, como tanto quis anos antes; Cersei o concedia, mas Jaime pedia. E, mesmo assim, seu ronronar de leoa fora tão melodioso, palpável ao estalar da língua entre as presas, que a fera dentro de Jaime cantarolava tudo que ela dizia em um eco apaixonado.

Cersei viera primeiro, Jaime viera depois. Aonde Cersei ia, Jaime seguia com passos sonoros. Nascera adaptável, coerentemente desejoso ─ um leão de pernas atadas, mas ainda assim, um leão. Entre o sorriso ladino repleto do sarcasmo de Lannister e as ondas sujas de cabelo ouro, Jaime encontrava o arfar de boca em gemido cálido, reza antiga de tormenta lenta, tortura bem demorada, relinche em vontade cada vez que ela movimentava as mãos da base até onde ela sabia que ele gostava; fizera o mesmo movimento já tantas vezes, em escadarias, quartos escuros e torres altas. Mas, sempre que o repetia, Jaime via-se no limbo da entrega, dando-a o que ela queria, manchando-a em branco júbilo da maneira que ela sempre pedira, vendo as marcas do gozo despejarem por um dos cílios, abaixo do nariz e no meio dos lábios, entrando na boca como água a um moribundo.

Ela era quente, porque viera do Sol. Era mais forte ao dia, quando o ar era leve e os raios, intensos; via como se movia entre os recintos do castelo. Furiosa, ela era, tremendamente furiosa. Carregada de ódio, sua amada. Tanto quanto ele mesmo era, porque Jaime Lannister era o homem mais odioso dos Sete Reinos ─ maldito Regicida, desgraçado da Guarda Real que tomara o Rei pelas costas e tirara-lhe a vida como se tira o ar do corpo. Um bafurar de morte àquele que incendearia Porto Real, àquele que urrava condenações pelo fogo. Mal soubera que fogo nada era a um homem vindo do sol, brilhante por debaixo dos clarões, uma besta implacável.

Valar Dohaeris 〃 G. of ThronesOnde histórias criam vida. Descubra agora