"A minha memória ouve ainda agora as pancadas do coração naquele instante. Não esqueças que era a emoção do primeiro amor."
(Machado de Assis – Dom Casmurro)
Depois do nosso pacto na capela, eu e Anderson nos encontramos no Bosque dos Jequitibás, um dos mais bonitos parques de Campinas. Aquele dia era o único da semana em que não tínhamos aula em período integral. Com a tarde livre, decidimos bater um papo e alinhar como iríamos dar andamento ao nosso trato.
Eu e Anderson estávamos sentados em uma mesa de pedra, quase isolada, no meio daquele braço urbano de floresta. Por ser plena terça-feira, não tinha muito movimento. Não corria risco de alguém atrapalhar a gente. Ou pior: ver nós dois juntos.
— Calma aí, meu filho! — reclamei enquanto escrevia com frenesi em meu caderno, tentando fazer apontamentos sobre as valiosas orientações que Anderson me passava a respeito de Alana. Gostos musicais, filmes favoritos, o que ela amava ou abominava.
— Que lerdo, mano! — Anderson cruzou os braços, impaciente.
Pelo menos não sou corno manso.
Não respondi. Abri meu estojo em busca de uma das minhas canetas marca-texto. Essa era uma obsessão pessoal que eu trazia comigo desde, sei lá, a quinta série. Tinha várias, de todas as cores. Peguei uma rosa e tentei sublinhar um trecho que dizia "Adora comida japonesa", mas falhou. Troquei a cor, falhou de novo. Bufei exasperado, lembrando-me que Lara era responsável por secar a ponta de todas as minhas canetas. Em época de prova ela fazia a festa, rabiscando sua apostila inteira. De vez em quando eu precisava lembrá-la que a ideia era grifar somente as informações mais importantes e não sair pintando as páginas como se fosse um livro de colorir.
— Agora vamos ver se eu consigo usar tudo isso que você me passou pra virar BFF da Alana. — comentei enquanto lia as minhas anotações.
Em vez de me responder, Anderson abriu sua sacochila da Nike e tirou um estojo de óculos de dentro. Ele ficava bem nerd por trás da armação fina e das lentes quadradas. Depois, contornou a mesa e veio até o meu lado. Tentou ler minhas anotações por cima do meu ombro.
Senti sua respiração roçar levemente pela minha nuca e senti uma mistura de arrepio com desconforto. Virei a folha do caderno imediatamente, como forma de tentar afastá-lo.
— É isso, mano. — Anderson se sentou ao meu lado e, no processo, passou suas pernas grossas por cima do banco. Foco, Otávio! — Só preciso te dar mais um toque: muita calma na hora de tentar o esquema com a Alana. Ela não é o que parece, manja? Tem que ficar esperto para não espantar ela.
— Legal. Vou fazer essa nota mental...
Peguei uma caneta marca-texto verde e sublinhei no topo da página em branco a frase: "Termos de Proteção". Ao meu lado, Anderson leu atrás das lentes dos seus oclinhos e fez uma careta intrigada.
— Que isso? — ele perguntou, sem entender.
— Qual é a nossa proposta, Anderson? Eu fico amigo da Alana em troca de informações e você me protege dos seus amiguinhos babacas — relembrei. — Então eu resolvi fazer um Termo de Proteção com as condições que você tem que seguir pra manter nosso acordo. Vamos lá, no topo da lista, nada de ser chamado de Sininho...
Comecei a anotar, mas Anderson protestou:
— Calma aí, mano, não é assim também. Eu não vou conseguir fazer os moleques pararem com isso assim fácil, manja?
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Operação Capitu
Teen FictionQUANTOS SEGREDOS ESCONDE UMA TRAIÇÃO? Um acidente (quase literal) do destino acaba aproximando dois garotos completamente diferentes: o franzino e aparentemente frágil Otávio, que é desprezado pelos machões do colégio onde estuda por só fazer amizad...