Eu juro que vivi

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Era a hora.

Ramón e os pais entraram. Caminhavam lentamente, as pessoas fotografavam e filmavam aquele momento. Mas no meio do caminho todo mundo foi surpreendido.

Uma música mais agitada começou a tocar e os três começaram a dançar. Ramón e Bruna definitivamente não optaram por um casamento convencional e nos fizeram ensaiar por quatro meses aquela entrada - Julio precisou treinar com um professor em Tóquio, que ficou em contato com a professora no Brasil. 

Era a vez dos padrinhos. Hot N Cold da Katy Perry passou a tocar, nós entramos e dançamos por alguns minutos. Não tinha música mais adequada pra representar Bruna e Ramón e seus infinitos anos de rolos e mais rolos. Atrás de nós, veio o trio mais lindo do mundo. Gabriel, Felipe e Marco entraram ao som de Vou Deixar, do Skank. Jogavam pétalas pro ar, e alguns papéis coloridos e brilhantes, em formato de coração, que continham algumas mensagens de amor. No altar, Ramón acompanhava a dança e nós, os padrinhos, fazíamos alguns passinhos, enquanto os meninos dançavam pelo corredor de entrada.

Era a vez da noiva. Bruna apareceu na entrada com seus pais e era de se esperar que, depois daquilo tudo, não haveria Marcha Nupcial tocando. Quando ela e os pais deram alguns passos pelo corredor, Bruna iniciou uma entrada triunfal com Crazy in Love e seus pais, logo atrás, faziam suas partes da dança. Era a coisa mais fofa do mundo. Já quase na metade do caminho, Ramón foi de encontro a Bruna e começaram a dançar juntos.

Ainda que aquela entrada toda tenha causado a risada dos convidados e tenha divertido geral, a cerimônia conseguiu arrancar lágrimas. Tinha sido um dos casamentos mais lindos que eu já havia presenciado.

Hugo apertava minha mão e, às vezes, me dava umas olhadinhas. Seu olhar fofo era cativante, me deixava sereno, me fazia feliz. Ele olhava encantado aquele momento que Bruna e Ramón passavam.

Depois da cerimônia, os convidados seguiram para o espaço da festa. Os padrinhos ficaram fazendo algumas fotos com os noivos, enquanto nós nos cumprimentávamos.

Enquanto caminhávamos pelo gramado, Hugo me fez uma pergunta daquelas que são despertadas dentro da gente sempre que alguém casa.

— Você quer viver alguma coisa assim um dia?

— Não vou mentir pra você que eu já pensei sobre isso sim. E você?

— Sei lá, eu fui criado com o sistema de que o casamento era uma coisa meio que obrigatória em algum momento da vida. Mas não vejo mais assim. Tipo, ainda assim eu quero. Só que agora eu enxergo diferente. É uma decisão a ser tomada se e quando os dois quiserem, né? E não porque são obrigados a casar.

— Sim. E só pra deixar claro, eu também quero.

— Poxa, por que que não me disse antes? Eu esqueci a aliança em casa. — Hugo disse e nós rimos.

— Não precisa de aliança. Nunca assistiu o comercial do sonho de valsa? É só fazer com o plástico do bombom. Ou então com um cabinho de planta. — Brinquei. 

Quando nós entrávamos no espaço da festa, Julio apareceu atrás de nós e me deu um abraço sem dizer mais nada por um bom tempo. Fez o mesmo com Hugo.

— Eu nunca pensei que teria um sobrinho tão cedo, e tô feliz pra caramba. Obrigado. — Ele disse de forma fofa. 

— Pelo jeito a família inteira vai ser babona... — Hugo disse e Julio concordou com a cabeça. 

— Já tô vendo ele maior e passando as férias comigo em Tóquio. 

— Só ele? A gente quer também! — Reclamei e Julio riu. 

— Me deixa ter meu momento de tio, por favor?

— Me deixa ter meu momento de pai ciumento, por favor?

— Brincadeiras a parte, mas olha, eu não pensei que veria a mãe e o pai aceitarem a gente tão bem. Não sei o que vocês fizeram, mas obrigado.

— Não sei se a gente fez alguma coisa, exatamente. — Respondi. — Acho que a mãe foi conhecendo o Hugo, o Arthur, e depois que soube que a gente tava junto ela foi lidando. Os dois começaram a entender que aquilo ali era de verdade e que eu tava feliz. 

— Bom, mas independentemente de como foi, deu certo. — Julio respondeu. — Agora preciso beber e conhecer alguém. Algum amigo ou alguma amiga de vocês disponível pra bater um papo por aí?

— Baixa o Tinder, garoto. — Felipe apareceu.

— Ah, essas coisas não são muito a minha praia. Prefiro à moda antiga.

— Mas pouca gente usa a moda antiga ainda, você não vai conseguir nada assim.

— Vou tentar. Vamo ver se tô com sorte.

— Tá bom, deixa eu te ajudar. — Felipe disse e arrastou Julio pelo salão. 

As emoções não pararam na cerimônia. Depois de um tanto de discursos de amigos e padrinhos, Ramón e Bruna discursaram e conseguiram tirar ainda mais lágrimas de nós, se é que a fonte já não tivesse secado nessa altura. Após os discursos todos, o mais novo casal dançou a sua valsa por alguns breves minutos e depois convidou os demais casais para fazer o mesmo. Hugo me arrastou até a pista. Pra minha surpresa, ele era um super pé de valsa. 

— Já fui o príncipe de umas cinco debutantes. Mas só namorei uma delas. — Ele respondeu quando perguntei de onde ele tinha tirado tanta habilidade. 

— Uau, entendi de onde vem o talento então. Tá acostumado.

— Mais do que você pensa. 

A valsa foi trocada por uma música familiar. I Lived, do OneRepublic, numa versão mix, trazia o sentimento que todos tinham ali. A todo novo momento, a gente se deparava com novos ciclos e mudanças. E a todo novo momento, precisávamos celebrar o que havíamos vivido até ali. 

I, I did it all (Eu, eu fiz tudo isso)

I, I did it all (Eu, eu fiz tudo isso)

I owned every second that this world could give  (Eu aproveitei cada segundo que esse mundo poderia dar)

I saw so many places, the things that I did (Eu vi tantos lugares, as coisas que fiz)

Yeah with every broken bone, I swear I lived (Com cada osso quebrado, eu juro que vivi)


— Rafa. — Hugo me chamou enquanto ainda dançávamos com a música. Olhei pra ele. Sem dizer nada por um momento, ele tirou algo do bolso que parecia ser o cabinho de alguma planta, enrolado em formato circular e com um nózinho feito pelas pontas. — Talvez não seja amanhã, nem ano que vem, mas eu quero isso. E quero que seja com você. 

Ele pegou a minha mão e colocou aquele caulezinho enrolado no meu dedo anelar. Nós nos olhamos por um instante e nossos sorrisos apareceram. Eu não cabia dentro de mim. Meu coração explodia. 

I swear I lived (Eu juro que vivi).

Nós nos beijamos, enquanto o mundo pulava a nossa volta com a batida da música. 

Amor de Areia (Romance LGBT)Onde histórias criam vida. Descubra agora