Capítulo 4 - A proposta

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Mesmo sentindo-se lisonjeada, Salma estava ansiosa. À medida que o céu alaranjava, com a aproximação do crepúsculo, um desagradável frio no estômago a incomodava em razão do inusitado convite do patrão. Há muito tempo não se sentia dessa forma.

Diante do armário, pensava, insegura, sobre o que vestir. Sua primeira intenção foi pegar o tailleur mais novo, recém-adquirido por uma pequena fortuna. – Não, não vou para o escritório – pensou. Deveria, então, escolher algo mais casual, quem sabe uma calça jeans? – Também não! Seria um exagero. Prestes a entrar em desespero, olhou para o fundo do armário e viu um velho vestido preto de crepe. É esse! – disse aliviada. Estendeu o braço para pegá-lo e pensou que nada pode sair errado quando se recorre ao confiável pretinho básico. Após vesti-lo, fez um coque no cabelo e colocou um colar de pérolas no pescoço – presente de Heitor.

Não demorou muito e ele chegou, bem-vestido e perfumado. Enquanto estavam a caminho da mansão, um silêncio não comum pairou no ar.

– Querida, você está tão calada.

– Estou? Nem percebi – fez um a pausa. – Isso é tão constrangedor. Não consigo parar de pensar como será o jantar e qual será o seu propósito.

– Fique tranquila. Se for o que estou pensando, será uma boa surpresa. Mas não me pergunte, são só suspeitas.

Isso deixou sua mente curiosa mais atiçada. Porém, para não parecer insistente, controlou seus ânimos e silenciou novamente.

Ao chegarem à mansão, o mordomo abriu a porta.

Salma já havia estado lá em outras ocasiões, ainda assim, sempre se impressionava com o requinte da propriedade. De estilo greco-romano, sua fachada era marcada por imponentes colunas brancas, aos moldes Pártenon. Um maravilhoso jardim dava boas vindas aos visitantes, repleto de estátuas gregas, circundando um chafariz; o interior da casa era composto por uma deslumbrante decoração neoclássica, com formas e objetos posicionados com simetria. O piso, em mármore xadrez, dava um ar bicolor à decoração.

Victor os aguardava na sala de estar, folheando o jornal do dia.

– Que bom que chegaram – disse, sorridente. – idosos jantam cedo, sabiam?

– Boa noite, dr. Adamatti – cumprimentou Salma, com um tímido sorriso.

A simpatia no rosto do italiano era novidade. No trabalho, sempre estava com ar preocupado e sisudo. Dessa vez era diferente; sua aparência inspirava tranquilidade. Pediu que se sentassem na sala de estar e o aguardassem. Com o andar vacilante e curvado, foi em direção a uma estante de livros. Abriu a gaveta e retirou dois volumes.

O primeiro era um precioso álbum de família, que mostrou aos convidados. Com a voz um tanto rouca, contou sua história: de onde veio, quem eram seus pais, a família que construiu com Judith e sobre sua adorada filha. O casal já conhecia parte dessa história, já que os boatos a respeito eram abundantes, porém, nunca a tinham ouvido do próprio Victor.

Após encerrar a cronologia genealógica, Adamatti fez uma breve pausa, então voltou a falar:

– Sabe... sou um homem velho. Minha saúde não está lá essas coisas. Há alguns meses tenho pensado em descansar – falou, enquanto folheava o segundo volume. – Mas isso não é algo tão simples para um homem sem descendentes. Aguentei até onde pude. Agora não dá mais – assegurou, com profundidade. – A minha carreira iniciou com uma proposta, agora pretendo finalizá-la com outra. Essa farei a vocês!

Os jovens permaneceram estáticos. A advogada estava com o coração acelerado e as mãos frias. Não imaginava aonde Victor queria chegar com aquela conversa.

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