Era a terceira vez essa semana que o Dr. Pats me chamava em sua sala, e ainda era quarta feira. Não que fosse um problema, ele sempre falava a mesma coisa: Escreva Olívia, escreva para se lembrar de algo que você não vai esquecer nunca, escreva pra que o pior dia da sua vida fique marcado pra sempre na sua cabeça.
E lá estava eu, sentada em frente a sua enorme mesa de madeira, com meu caderno vermelho sob meu colo, esperando para que ele diga a mesma coisa que sempre diz, olhando para a parede lotada de quadros dos seus pacientes no dia em que deixaram esse lugar. Ele diz que se eu fizer tudo certo a próxima foto na parede vai ser a minha. Não que tudo que eu queira seja uma foto minha na parede de um psiquiatra, mas a foto na parede significa que eu finalmente vou pra casa.
- Desculpe a demora Olívia, vejo que trouxe seu caderno.
Ele entrou na sala de supetão, interrompendo um dos meus devaneios favoritos, aquele onde eu corro em direção ao meu quarto e pulo na minha cama.
- Eu sempre trago meu caderno. - apesar de ter dois cadernos, aquele que o Dr. pats me deu, com a capa vermelha como as letras do logo do Hospital Santa Lúcia para pessoas mentalmente debilitadas, e outro que minha mãe trouxe de casa, azul escuro, como a cor favorita da Alisson.
- Sabe porque está aqui querida?
- Para que eu escreva.
- O que eu quero que escreva Olívia? - nesse ponto ele já estava sentado em sua cadeira, eu costumava pensar nele como um diretor nessas situações, ou como um reitor de faculdade, apesar de eu nunca ter visto um. Sua voz era tão calma e constante que se eu não estivesse vendo seu rosto teria certeza que estaria dentro da minha cabeça.
- Sobre o dia 14 de agosto.
- Exatamente. Quero que me conte o que aconteceu, como aconteceu, como se sentiu naquele momento, tudo, de novo.
Eu suspirei, como sempre fazia naquele momento e olhei para a parede de fotos.
Aquela era a terceira vez essa semana, e ainda era quarta feira, eu já havia feito aquilo tantas vezes que havia perdido a conta, meu caderno já estava na metade, e eu continuava escrevendo tudo de novo e de novo, porque por mais doloroso que fosse eu queria muito ir pra casa.
Acenei com a cabeça, e esperei que ele me dispensasse para que eu pudesse voltar para o meu quarto.
A enfermeira responsável pela minha ala estava me esperando no corredor, ela quem me acompanhava para o quarto todas as vezes que eu era chamada na sala do Dr. Pats, ela era doce e se preocupava com cada um daqueles que estavam ali, eu até a considerava minha amiga, apesar de ela ser muito mais velha do que eu.
Ela costumava colocar uma mão no meu ombro quando eu estava frustrada, o que acontecia com frequência dada a quantidade de vezes que eu escrevia os acontecimentos do dia 14 de agosto. Dizia pra que eu me concentrasse, que talvez estivesse esquecendo de algo, que talvez ele tivesse querendo ter certeza de que aquilo não tinha me feito um mal irreversível.
Eu apenas acenava com a cabeça, e voltava para o meu quarto em silêncio, para continuar escrevendo. Eu não interagia com os outros pacientes, minha estadia se resumia ao meu quarto, as consultas do Dr. Pats, e as visitas dos meus pais, que vinham pelo menos três vezes por semana ter certeza de que eu não havia enlouquecido.
Todas as vezes minha mãe pedia desculpas por ter que estar ali, dizia que logo me levaria pra casa e que eu deveria me comportar e fazer o que o Dr. pedisse. Ela ainda perguntava se ele havia passado dos limites alguma vez comigo. Nós assistíamos muitos seriados sobre serial killers e o maior medo dela era que a pobre caçula fosse estuprada em uma instituição tão assustadora como aquela. Eu ria, não achava que o Dr. Pats fosse capaz de tal ato, nem nenhum outro ali, todos me tratavam muito bem.
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Querida Alisson
Mystery / ThrillerInternada em um hospital psiquiátrico após a morte da irmã, Olivia e outros pacientes decidem investigar sua morte para descobrir se realmente foi um acidente ou se foi um assassinato. Será que a morte de Alisson realmente foi acidental ? "Escreva O...