No dia seguinte acordei de ressaca. Amanda e Yuri estavam na cozinha preparando o almoço. Ninguém disse nada, apenas me deram uma caneca com café e algo para comer e fui para a sala. Haviam algumas pessoas lá e todas vieram me cumprimentar. O barulho das conversas começou aumentar e minha cabeça estava quase explodindo de tanta dor. Voltei para a cozinha para pegar algum remédio, onde Amanda e Yuri estavam se beijando. Amanda me olhou com cara de assustada, mas Yuri não se importou e eu fiquei sem entender o que estava acontecendo.— Tha, oi. Eu posso explicar!— Tá tudo bem. Eu já imaginava, só não esperava que isso tinha que ser em segredo.— Foi eu que pedi pro Yuri não contar.— É, ela disse que você entenderia.— Sim! Eu não me importo com quem você fica, só que vocês são meus melhores amigos, porra! Deveriam ter me contato.— Eu sei, eu sei. Me desculpa amiga.— Olha, tá tudo bem. Eu vou pra casa tomar um banho e me curar dessa ressaca. Mais tarde a gente se fala, tá?— Tem certeza que não quer ficar para o almoço? Yuri fez ratatouille, berinjela e guacamole. São suas comidas preferidas.— Não se preocupem, combinei com mamãe de almoçar com ela e já são duas horas da tarde. Aliás meu Uber tá chegando também. Vou lá em cima pegar minha bolsa.O almoço com mamãe era só uma desculpa pra poder sair o quanto antes dali e ir para casa. Amanda me acompanhou até o quarto, tentando se explicar. Eu estava tão distraída que não ouvi uma palavra dita por ela. Peguei minha bolsa e desci. Na cozinha, Yuri não disse nada, apenas me abraçou. Amanda foi até a porta comigo.— Amiga tá tudo bem mesmo?— Sim, eu só tô cansada e quero ir pra casa. E eu não ligo de você e o Yuri terem um caso, seja lá o que for. Só queria que tivessem me contado.— A gente ia te contar.— Agora eu já sei. Enfim, até mais amiga.Entrei no Uber e fui para casa. Quando cheguei, Mimi estava no sofá dormindo. Minha casa era fria, a luz do sol que batia da varanda para dentro da sala servia apenas para iluminar. Eu não conseguia lembrar o que tinha acontecido na noite passada e isso me irritava. Fui para o quarto tomar banho. Enchi a banheira e fiquei ali por uns 30 minutos, tentando lembrar o que havia acontecido. Lavei o cabelo para tirar o cheiro do cigarro e sai. Vesti uma camiseta tão grande que parecia um vestido, sem calcinha e sutiã, só ela.Eram quatro horas da tarde e estava calor lá fora, então fui para a sala onde batia sol. Pedi comida japonesa pelo celular e acendi um cigarro sentada no chão. Eu amava minha independência, tudo que conquistei para ter. Mas eu não sabia mais como preencher alguns espaços e o meu vazio existencial só aumentava.O último cara com quem me relacionei era abusivo, queria mandar nas minhas coisas e na minha vida. Foram quase dois anos assim, até que um dia eu cheguei tarde em casa e ele estava com outra mulher na minha cama. Não pensei duas vezes em expulsar os dois do jeito que estavam, sem roupas. Hoje eu lembro disso e dou risada.Minha comida chegou e pedi para que trouxessem até o apartamento. Agradeci ao entregador e fui para a cozinha. Eu amo comida japonesa e na geladeira tinha suco de laranja para acompanhar. Meu final de tarde foi calmo e solitário. Assisti alguns filmes que passavam na televisão, mas sem terminar, trocando de canal todo momento. Ia dar seis horas da tarde quando recebi um SMS de um número desconhecido. A mensagem dizia: "Me encontre em meia hora no Museu Lasar Segall, garanto que será de seu interesse o que tenho a dizer. Não tenha medo, nada de ruim vai acontecer. Apenas tirarei suas dúvidas sobre tudo o que está acontecendo. Vai ser fácil me achar, desfrute do museu e tudo será esclarecido."O museu fechava às sete da noite aos sábados e eu comecei a ter uma crise de ansiedade. Quem era essa pessoa? O que ela queria me contar? Antes de tomar qualquer decisão liguei para o número remetente da mensagem, mas ninguém atendia. Então mandei uma mensagem de texto perguntando quem era, não demorou para a resposta chegar."Não posso me identificar nem atender sua ligação. Preciso que você chegue antes do museu fechar, é muito importante."Fiquei um pouco assustada e liguei de novo, ainda sem sucesso. Decidi me trocar e ir pra lá. Enquanto me vestia peguei o celular e liguei para Amanda.— Alô, Amanda?— Oi Tha.— Preciso da sua ajuda. Acabei de receber um SMS de alguém pedindo pra eu ir até o MLS, acho que pode ser meu pai ou o cara do parque. Posso deixar minha localização ligada caso aconteça algo e você saiba onde me achar?— Thalassa, você tá maluca? Como assim você vai encontrar alguém que não se identificou, assim do nada? Eu vou com você.— Não dá tempo, o museu fecha às 19h. Eu já tô quase saindo de casa.— Mas amiga por que você vai fazer isso?— Eu não sei, mas fica de olho no celular. Beijos.— Se cuida e toma muito cuidado.Sai de casa e pedi um Uber. Eram apenas algumas quadras dali até o museu e dentro do carro aproveitei para ver qual era a exposição do dia. Mandei uma mensagem para Amanda pedindo para me encontrar lá assim que o museu fechasse.Quando cheguei não estava tão cheio e faltavam quarenta minutos para fechar, então aproveitei para conhecer o museu. Nunca tinha ido e nem cogitado visitar o local, mas achei muito bonito e interessante. As obras ali expostas e a história do museu eram muito inspiradoras. Parei diante de uma obra que me instigou muito. Parecia que ela me encarava e queria dizer algo. Quase que se movimentando e saindo do lugar. Não tirei meus olhos da tela. De repente alguém parou ao meu lado. Qualquer pessoa que se aproximasse de mim poderia ser quem mandou as mensagens, mas ninguém falava comigo ou demonstrava querer fazer contato. Continuei andando pelo museu, cabisbaixa, me xingando por ter acreditado e ter vindo até aqui. Peguei o celular para tentar contato com a pessoa misteriosa, mas sem sucesso. Aproveitei para mandar mensagem para Amanda pedindo para vir me encontrar, pois já estava indo embora.Enquanto esperava, decidi andar mais um pouco pelo museu. Fui ao banheiro e depois de mais vinte minutos andando pelas obras, fui em direção a recepção. Meu celular vibrou e era outra mensagem."A cor do seu cabelo fica radiante com a luz do sol que passa pelas janelas. Realmente seu pai não mentiu quando disse que você era como uma rosa vermelha em um jardim cheio de neve."Meu coração palpitava rápido, meus olhos percorriam todo o salão, todos os lados, de cima para baixo. Meus pés me giravam a procura de um rosto. Mas afinal, quem eu estava procurando? De repente, outra mensagem."A tua esquerda, perto do quadro mais complexo e radiante, vai encontrar o que procura."Eu não sabia qual quadro era, mas voltei até aquele que me fez parar. Não havia nada ali, apenas um banco onde as pessoas se sentavam para contemplar aquela obra. Cansada dos joguinhos, tentei ligar novamente, ainda sem êxito. Mandei mensagem e não tive respostas."Meu Deus, o que estou fazendo?" pensei, e me sentei com os olhos estáticos para o quadro. Não sei ao certo quanto tempo passou, podiam ser apenas alguns minutos que pareciam horas.Quando me dei conta, um segurança já vinha me informar que o museu estava fechando. Apenas eu e mais algumas pessoas estavam ali, então me levantei e fui em direção a saída. Senti outra mão em meu ombro e pensei que pudesse ser o autor das mensagens, mas era o mesmo segurança.— A senhora deixou cair isto.— Ah, obrigada.Peguei o envelope sem entender o que estava acontecendo. Eu não estava com nada além da minha bolsa, o que será que está acontecendo?Quando saí, o sol já estava baixo e o céu um tom azul escuro. Meu celular começou a tocar, era Amanda.— Oi, estou saindo daqui agora.— Não precisa vir, estou indo para casa.— Tem certeza? Eu te encontro lá.— Não precisa amiga, quero ficar sozinha.— Tudo bem, me liga.— Está bem, eu te ligo. Beijos, te amo.— Te amo também.Pedi outro Uber para casa. Não tive coragem de abrir o envelope e reli as mensagens várias vezes. Quem era essa pessoa que dizia conhecer meu pai? Por que tanto mistério? O que eu devo fazer? Por que mamãe nunca me disse nada?Eram muitas perguntas e nenhuma resposta. Cheguei em casa e coloquei o envelope em cima da mesa. Sentei no chão e acendi outro cigarro. A noite estava apenas começando, o silêncio do meu apartamento era interrompido pelo ronronar de Mimi e uma angústia que me assolava. O silêncio, a gata e minha ansiedade se tornaram minhas companhias neste sábado caótico.
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Um Infinito Desconhecido
Short StoryCom a mãe doente, o aparecimento do pai, uma suposta promoção no emprego e sua vida amorosa em jogo, como Thalassa irá driblar os desafios do dia-a-dia e descobrir quem é o homem do parque? Acompanhe sua rotina para saber quais serão seus próximos p...