Sentimentos à tona

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— Aqui estão os cobertores, essa noite promete ser ainda mais fria. Fique à vontade. — Pulei de susto e encarei Fernando que acabou de entrar no quarto de hóspedes em que eu estava, segurando cobertores e um travesseiro extra. — Ué, devendo?

— Nunca em um dia chuvoso dê um susto desses em alguém. — Coloquei a mão no peito e me aproximei tirando dos seus braços os acolchoados que trouxe. — Muito obrigada, isso é gentil da sua parte.

— Estou recebendo um elogio? — E lá estava o sorriso malandro.

— Não force a barra, caubói — sorrio por seu jeito e sento na cama. — Sério, tenho que agradecer por ter ajudado a concertar nosso telhado, estaríamos perdidas a essa hora, nem o Marcelo estava nos atendendo. — Ele torceu o rosto após eu mencionar o nome do Marcelo e fiquei sem entender o porquê.

— Que bom então que resolvemos. Sinta-se em casa, você pode tomar um banho se quiser e daqui a pouco venho chama-la para o jantar. — Era estranho estarmos comportados e não um xingando o outro como sempre fazíamos, parecia que estávamos nos comportando de forma automática, como robôs.

Esperei ele sair e comecei a reparar onde estou, o quarto tem um bom tamanho, uma cama simples de casal coberta por lençóis cinza e travesseiros com fronhas salmão, um tapete persa redondo com formas geométricas e dois criados-mudos, sendo um adornado com um vaso com flores e o outro com um relógio. Do lado direito da cama havia um guarda-roupa de mogno e eu, como a curiosa que sou, abri verificando o que havia dentro dele constatando duas blusas, uma calça masculina e um vestido longo. Interessante.

Abri a porta do banheiro e entrei, tudo com aparência muito clean. Retirei minha roupa com cuidado para não sujar ou molhar e entrei no espaço do chuveiro. A massagem que a água quente fez caindo em meus ombros era bem-vinda e relaxei um pouco, toda a tensão da semana foi se esvaindo. A reforma da pousada estava indo bem, terminamos o terceiro andar e os outros dois estavam praticamente prontos, após isso faltaria escolhermos quais móveis e utensílios seriam necessários. Massageei meu coro cabeludo com o shampoo e condicionador, lavei cada parte do meu corpo com o sabonete líquido que ali estava disponível.

— Droga! — praguejei ao abrir a porta do box e perceber que esqueci de pegar uma toalha. Torci meu cabelo e passei a mão no corpo para retirar o excesso de água e sai da área do chuveiro, indo até o armário do banheiro para verificar se havia toalhas de banho nele. Nada. Achei que se eu der alguns pulinhos seria capaz de tirar a água do meu corpo.

Pulo uma... duas... três vezes. Nada de novo.

Abri a porta do banheiro e olhei de um lado para o outro. Ótimo, quarto vazio ainda. Sai do banheiro na ponta dos pés e fui até o guarda-roupas, retirei uma das blusas masculinas que estavam ali e comecei a me secar com ela. Sequei minhas duas pernas e minhas partes íntimas e coloquei minha calcinha extra que havia trazido na pequena bolsa que aprontei, após secar meus braços e minha barriga coloquei meu sutiã de volta. Estava secando meu cabelo quando a porta se abriu e Fernando entrou como se fosse o rei do pedaço. Gritei e cobri a frente do meu corpo com a blusa.

— Se você queria ficar com meu perfume em seu corpo era só ter pedido, não precisava se secar com minha blusa. — Ele se escorou na porta e cruzou seus braços, seu olhar subiu por minhas pernas e parou quando chegou no meu rosto.

— Tem como você ser mais inconveniente? — bufei. — Eu esqueci de pedir uma toalha de banho, só percebi isso depois que eu terminei meu banho. Minha única opção foi pegar uma peça no guarda-roupas para me secar.

— E você não pensou na possibilidade de abrir a porta e me chamar? — Ele subiu uma sobrancelha de modo questionador, me fazendo ficar mais irritada. Passou o momento de paz.

— Encerrou o assunto. Tem como você virar para eu terminar de me vestir? — Depois de revirar os olhos, ele virou e eu coloquei minha roupa novamente. Dei um jeito de amarrar a blusa como um turbante em minha cabeça e fui até ele, cutucando seu ombro. — Pode me emprestar um pente?

— Pelo menos isso pediu, pensei que iria pentear os cabelos com um garfo — zombou de mim e saiu do quarto, voltando logo após com uma escova de cabelos.

— O jantar está pronto, espero que você goste de macarrão. — Assenti e fomos em direção a cozinha. Percebi que pelo caminho havia alguns quadros com fotos espalhados pelas paredes e uma me chamou a atenção, Fernando e a mesma mulher que encontrei em seu Facebook, ambos com camisetas da Universidade Federal e com os rostos cobertos de tinta, certamente foi tirada no primeiro dia de aula, quando os alunos veteranos fazem o trote com os alunos calouros. A questão de quem é ela ainda passa pela minha cabeça.

— Então você fez um curso universitário... — comentei apontando para a foto. — Namorada?

— Irmã. Sobre o curso, não é algo que eu goste ou fale sobre. Como você diz — fez sinal de aspas com as mãos —, encerrou o assunto. — Terminamos de descer a escada e entramos no grande espaço da cozinha. — Pensei em comermos aqui mesmo na bancada ao invés de prepararmos a mesa do jantar. Acho mais prático. — Na bancada havia uma travessa com macarrão à bolonhesa, pratos e talhetes, duas taças e uma garrafa de vinho tinto. As banquetas estavam dispostas uma ao lado da outra, sentei-me na da direita.

Ao pegar o macarrão, fios de queijo derretido o acompanharam até meu prato. Gemi ao ver a cena, eu era apaixonada por queijo.

— Não faça isso perto de mim, potranca. — Fernando apertou minha coxa e vi a intensidade que havia em seu olhar. — Gostaria de saber o que há em você que me afeta tanto. — Ele levantou do banco e ficou em pé ao meu lado, sua mão subiu pelo meu pescoço deslizando até chegar a minha bochecha. Fechei os olhos sentindo esse contato, deixando-me ser acariciada. — O que há em você? — Ele sussurra mais para si do que para mim e acabei avançando o sinal e o beijando. Ele ficou surpreso com minha atitude mas retribui na mesma intensidade.

Tentei não pensar que podia me arrepender daqui a alguns minutos, amanhã ou nos próximos dias, apenas embarquei nisso.

Descrevo as próximas cenas como um emaranhado de línguas e braços, suas mãos subiam e desciam pelo meu corpo até o momento em que estava sentada em cima da bancada com as pernas enroladas em seu quadril. — Deixa eu te amar, hoje e quando você quiser. Chega de brigar, chega de nos passarmos por estranhos quando nos encontramos por aí, chega de intrigas.

— Eu não quero ser apenas mais uma na sua cama, caubói — retruquei. — Eu não quero transar com você e quando estivermos satisfeitos você me enxotar como uma qualquer. Eu não sou esse tipo de mulher.

— Não, você com certeza não é esse tipo de mulher. Você é selvagem, não guarda desaforos e fala o que dá na telha. Você é espontânea, defende suas amigas com unhas e dentes e tem um lindo sorriso, mesmo que nunca tenha direcionado a mim. Eu quero ter a chance de ganhar um desses sorrisos. — O anjo no meu ombro dizia para que eu tivesse cuidado, enquanto o diabinho no outro ombro dizia para que eu aproveitasse enquanto podia.

— Eu juro que se você me tratar como um lixo amanhã, eu farei da sua vida um inferno. Você não vai me querer como inimiga, sabemos o que acontece. — Dei meu melhor olhar malvado e ele sorri.

— Acontece que eu sou o pavio e você é a ignição. — Ele aproximou sua boca do meu pescoço lambendo o espaço entre minha clavícula e minha orelha e sussurrou no meu ouvido — Você não vai se arrepender, potranca. — Fui içada em seu colo e recebi um aperto com força em minha bunda. — Hoje você vai ter uma aula de montaria. Vamos ver quanto tempo você consegue ficar montada no touro.

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