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Por Aires.

Amarrada em uma cadeira de madeira escura, a mulher sacolejava como se assim pudesse se soltar.

- Não vai conseguir, não vê? - Sr.Murter incitou.

- O que querem comigo? - Ela balbucia com rancor.

Estou mesmo fazendo isso?

- Você não quis colaborar...Bom usamos outros métodos - Murter diz sarcástico. - Sei tudo sobre você, Loreta! Vamos, diga-nos o que queremos, o que sabe sobre a Mariel e sua doença?

- Doença? - Ela sussurra pensativa

- Queremos a história completa - Sentencio e Sr. Murter a tortura chacoalhando a cadeira, passando a corda em seus pulsos.

- B-bom...Ela chegou como em todas as histórias, de noite, em um cesto, no portão principal. Eu a recolhi. E como sabem, ela criou-se no orfanato. Nada muito incomum...- Sussurra dando de ombros, tentando se soltar.

- E quem lhe escolhera o nome? E o sobrenome? De onde tiraste? -
Sr. Murter questiona balançando a cadeira de forma nervosa e ruidosa.

- H-havia...- Ela gagueja e respira fundo - havia uma manta, bordada na lateral, Havia o nome Mariel Berenice Avelar - 21/05/1993. Acreditamos ser o nome dela e data de nascimento. A encontramos no dia 25. - ela sussurra em um soluço.

- E essa manta? - Questiono olhando-a atentamente.

- Era uma manta de boa qualidade, usávamos em todas as crianças menores e com o tempo, se desfez e jogamos fora.

- E a doença? - Sr. Murter relembra

- Que doença? - Ela sussurra confusa.

- Nossos detetives investigaram e existe uma doença! - Ele grita esporadicamente e volta a chacoalhar a cadeira.

- Pare! Por favor, pare. Está me machucando - ela mostra os pulsos avermelhados pelas cordas.

- Fale! - Ele sentencia

- A cegueira? - Ela questiona em tom de dúvida.

Cega?

- O que quer dizer? - levanto abruptamente.

- Mariel possui apenas cinco por cento da visão, mas...Isso nunca foi uma doença, acredito que o senhor viu com seus próprios olhos. - Ela aponta e eu afirmo com a cabeça.

- Não pode ser verdade! Ela toca e pinta, anda correndo pela propriedade e...- Sussurro desviando o olhar.

- Alguém deve ter a ajudado, ela precisaria decorar e contar os passos- Ela Sussurrou.

- Mas quem? - Sr. Murter balbuciou

Magda...

- Posso ir embora? - Loreta sussurra.

- O que mais sabe? - Sr. Murter é incisivo.

- Nada...- Ela sussurra.

- Nada mesmo? Cartas, bilhetes? - Ele insiste e ela nega. - Está liberada. - Ele desamarra as cordas e ela corre para a porta, sumindo de minhas vistas em segundos.

- Magda sabia o tempo todo?! Sussurro.

⊰᯽⊱┈──╌❊╌──┈⊰᯽⊱

Loreta, escondida em seu pequeno quarto, de paredes em papel florido, em tons pastéis de verde e rosé, e assoalho de madeira, surrado, uma pequena cama de solteiro, com uma colcha macia, na cor azul marinho, um criado-mudo apoiando uma vela e uma estátua, de uma santa, de porcelana, cortinas longas brancas, com pequenas flores vermelhas, um guarda-roupa pequeno na outra parede, um tapete cinza ao meio do quarto e uma escrivaninha com uma pequena lamparina a gás e uma máquina de escrever. Manteve portas e janelas devidamente fechadas e com certo nervosismo, ela abre a terceira gaveta de seu guarda roupa, puxando de um fundo falso uma caixa retangular, abrindo-a com voracidade.

Ela se aproxima da cama e puxa, debaixo do colchão, um plástico com a manta que dissera ter jogado fora. Mariel Berenice Avelar - 21/05/1993.
Ela relê passando o dedo, a manta exatamente igual e cuidada por ela e pelo plástico em que a mantém.
Senta-se sobre a cama, abrindo a pequena caixa, tirando a carta que trouxera sua menina, que lhe contara da doença da mãe, que lhe serviu de complemento para entender a cegueira de sua menina. Foi tirando tudo da caixa, as fotos que tirara de Mariel, fios de cabelo, quando cortou-lhes na infância, os desenhos de Mariel, coloridos e cheios de vida, outras cartas que no aniversario de cinco anos recebeu uma quantia para levá-la ao médico, aos dez quando lhe mandaram outra com dinheiro e outra parte da história de sua amada menina, aos quinze outra carta com documentos sobre a doença, com dinheiro para o presente e a história do pai de Mariel.

Loreta se perguntava se quando ela completasse vinte, iria receber alguma carta, o dinheiro ela sempre usou com Mariel, jamais roubaria o que lhe era direito, sempre temeu que o pai - ou quem quer que fosse - voltasse e tirasse a menina, ela vivia para ela, andava sofrendo por não tê-la em seus dias, sofria por ser estéril e perdido tantas crianças e sua única que foi lhe dada, haviam lhe arrancado.

Como sentia falta da pequena Mariel, a quem ensinou lhe a ler, que comprou livros especiais para sua deficiência, para ser livre. E agora queriam saber mais dela, o que será que queriam? O que buscavam?

Abraçou tudo que tinha em seus braços e encarou o cesto, no fundo do guarda roupa, em que lhe entregaram seu presente, naquela noite chuvosa, ela a queria de volta, queria sua menina. E faria de tudo para ter de volta. Não por obrigação, jamais obrigaria sua pequena, ensinou-a a ser livre, ter liberdade para voar. Mas queria vê-la e cuidar dela.

O que faria se recebesse outra carta? E se quisessem levar ela?

Naquela noite, chorando ela dormiu abraçada as roupas e objetos que pertenciam a Mariel e na primeira hora do dia, outra carta fora deixada na caixa de correspondência do orfanato.

E com certeza mudaria a vida de Loreta e de Mariel.

MarielOnde histórias criam vida. Descubra agora