Sangria [ 2jae ]

blue curaçao

Blue Curaçao: destilado feito à base de laranjas proveniente das ilhas de Curaçao no Caribe. De cor característica azul, pode ser usado como base na preparação de outros drinques de coquetéis

Eram inevitáveis os pesadelos que Youngjae tinha nas últimas semanas. Era só ele deitar a cabeça no travesseiro que eles estavam lá, sondando, ou melhor, lhe aterrorizando e perseguindo em seu inconsciente. Um olho negro e um azul. Heterocromáticos. Mas não era exatamente a assimetria que lhe causava repulsa, na verdade não era este o sentimento que lhe acometia durante os sonhos, mas era a intensidade, aquela sensação de estar sendo observado pelo desconhecido, fazendo o gelo subir da base da espinha até a sua nuca, sua mente gritando em alerta, para enfim acordar pingando de suor frio, com a sensação de mais uma noite mal dormida.

Estava sendo tão cansativo acordar daquela forma todas as semanas, carregando uma bolsa escura debaixo de seus olhos que sua pele pouco vívida também não ajudava nem um pouco em disfarçar, que até mesmo a sua chefe havia lhe presenteado com um corretivo para os olhos para que ele cuidasse melhor da aparência antes de chegar no seu trabalho, cujo qual ter a postura apresentável era essencial.

Youngjae trabalhava como barman num distrito boêmio, numa propriedade que se chamava Scarlet Bar & Pub. Até hoje não sabia como havia conseguido ser chamado para trabalhar logo ali, pois de todos os lugares daquele bairro, o pequeno bar parecia um dos mais bem frequentados no que se dizia a respeito da classe social de seus clientes, assim como um dos mais estritos também, pelo menos quanto aos seus empregados. Jeongyeon, a sua gerente, uma garota alta de traços finos e elegantes, havia lhe dado uma lista extensa de regras para lidar com o atendimento aos seus clientes quando havia começado a trabalhar ali. É claro que ele já esperava uma série de instruções, mas aquilo definitivamente o pegou de surpresa:

Não podia dirigir a palavra aos clientes primeiro em nenhuma hipótese, nem mesmo para dar lhe dar boa noite, somente deveria responder se solicitado. Não deveria olhá-los nos olhos. Manter a vista sempre baixa, nos próprios pulsos. Não encostar em seus clientes em nenhuma hipótese. Não fazer a sua voz ouvida por outros clientes que não seja o que esteja atendendo. Não respirar alto, bocejar ou espirrar. Manter a aparência sempre alinhada. Esconder sempre o pescoço e os pulsos.

Bem, ele sabia que ser invisível era essencial para lugares de alta classe, mas se preocupou um pouco com o tom de exagero das exigências. Mas mesmo assim, aceitou o trabalho. Com o tempo, ele percebeu que não era tão difícil assim. Os clientes realmente não se importavam. Só pediam o que queriam, ele servia, eles pagavam, eles iam embora e no final do mês ele recebia o seu salário. O seu trabalho era absolutamente tranquilo. Tão tranquilo que tinha tempo de pensar em outras coisas, como em cozinhar uma receita nova estava em casa, como em comprar roupinhas para Coco na promoção, ou sobre Jackson Wang, poderia pensar nele também.

Jackson era um cara que ele conheceu através de um amigo em comum, Bambam. O rapaz era chinês, atleta profissional de esgrima, embora treinasse na Coreia, e por algum motivo ele havia se interessado por Youngjae. Marcaram um encontro às cegas que até deu bastante certo, a conversa havia rendido noite a dentro e estavam saindo desde então. Youngjae desconhecia a sensação de estar dando certo com alguém, principalmente dessa forma, num encontro às cegas assim do nada, e principalmente também com um cara tão bonito e perfeito quanto Jackson Wang. Se o rapaz tinha algum defeito era somente o fato de ser ocupado demais, viajar demais, mal tinha tempo de parar para se encontrarem, mas eles tentavam. O chinês constantemente mandava mensagens para ele e fazia o seu coração bater mais rápido por ser sempre tão fofo e prestativo. Era uma ótima distração para a sua vida pacata de barman.

Não que ele reclamasse da sua vida parada. Era um bom salário e nunca havia tido qualquer problema, apesar todos clientes do recinto lhe darem calafrios na maioria das ocasiões. Todos pareciam ter o semblante soturno e uma aura sombria quieta demais, mas eram bem educados todo o tempo, nunca se alteravam ou ficavam bêbados como os jovens boêmios nas ruas se dirigindo às boates tarde da noite. Mesmo assim Jeongyeon sempre lhe observava pelo canto do olho, atenta a qualquer mínimo movimento errado por parte de Youngjae, o que nunca acontecia, é claro. A garota gostava de pegar no seu pé, mas ele nunca dava brecha.