1. Bom começo ?

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Uma chuva torrencial desabava sobre Quirinópolis, gotas grossas que chegavam a brilhar sob a luz dos postes de iluminação. Naturalmente, as casas estavam de portas e janelas fechadas, casas essas que variavam muito quanto a cor e ao estilo, mas cujos tons não eram visíveis através do negro da noite. Pelas ruas a água corria forte e se misturava com os detritos de uma construção inacabada, sendo levada rapidamente morro abaixo. As árvores farfalhavam ao serem agitadas pelo vento e regadas pela chuva e as suas folhas grossas caiam constantemente nas calçadas, por onde podia se observar uma figura um tanto incomum: uma jovem andava a esmo por aquela calçada. Sophia era uma jovem alta, bela a seu modo, com seus cabelos loiro-escuros, seu corpo curvilíneo vestido em um bonito vestido vermelho, que agora estava encharcado pela chuva. Seu penteado agora se desfazia aos poucos, os cabelos aderindo as costas e ao pescoço. Em seu rosto era possível perceber que ela carregava muita dor, suas próprias lágrimas escorriam pela face se misturando as gotas de chuva.

"Como fui idiota", pensou ela.

Curiosamente alguns dos estabelecimentos estavam abertos, como se esperassem que um milagre fizesse as pessoas saírem de casa e ir consumir seus produtos. Sophia rapidamente correu até um supermercado, tentando inutilmente parar suas lágrimas que caíam em grandes feixes.
Neste supermercado estava Maurício, cercado por várias pessoas que também se abrigavam da chuva.

" Se não houvessem tantos no-maj por aqui, eu poderia aparatar direto para casa ! Mas é melhor não dar motivo para uma visita ao conselho mágico... ".

Tão logo Maurício pensou isso, ele notou que uma garota vinha correndo para onde ele e as outras pessoas estavam abrigadas e discretamente pegou sua varinha de dentro da jaqueta que vestia. As outras pessoas começaram a apontar e Sophia se assustou, congelando onde estava e enfiando a mão no bolso como se fosse sacar uma arma, um gesto que não era desconhecido para um mago como Maurício.
Ele escondeu sua varinha e se aproximou da garota acompanhado de um senhor:

- O que aconteceu ? Foi o que o trouxa perguntou para Sophia, a chuva caindo volumosa ao redor deles.

Claro, ela não diria a verdade. Em vez disso ela enxugou as lágrimas e preparou uma mentira apropriada, ainda com a mão direita no bolso do vestido:

- Eu... Eu fui assaltada, eles levaram o meu carro... Foi horrível.

O no-maj acreditou facilmente em sua mentira, mas o rapaz lhe olhou com desconfiança, porém não disse nada. Eles a acompanharam até o supermercado e lá Sophia repetiu sua mentira para as outras pessoas. Elas eram claramente trouxas, mas aquele rapaz que a observava... Ela sabia, podia sentir. Ele era como ela. Ela desviou os olhos para não ficar o encarando, mas ele veio devagar até Sophia.

"Ele e bonito", foi o que pensou Sophia.

Realmente, Maurício era um jovem bem apessoado, de ombros largos, lábios finos e olhos cor de mel.

"Não, sua idiota ! Você sabe o que aconteceu quando se apaixonou!" pensou ela rispidamente, se afastando e retirando a mão do bolso.

O rapaz pegou o braço de Sophia para impedir que ela se afastasse.

- Espere... Vamos conversar. E acrescentou mais baixo: - Eu sei que você é como eu...

Sophia somente se virou e assentiu.

- Tem um bar aqui perto se você quiser tomar algo, disse Maurício, vendo que a chuva já havia passado.

Os dois seguiram para o bar e se sentaram naquelas cadeiras de plástico. Maurício pediu dois copos de refrigerante, já que a garota não quis fazer um pedido.

- Me chamo Maurício, falou lhe entregando um copo de refrigerante.

- Sophia, foi o que disse a jovem que parecia se concentrar somente no refrigerante que acabara de chegar.

Passado o momento de silêncio, Maurício se apresentou melhor e vendo que Sophia se encolheu com uma rajada de ar frio lhe ofereceu sua jaqueta e Sophia aceitou. Estava mesmo frio. No começo, conversaram coisas simples como idade e amenidades. Sophia começou a falar mais, contudo ao perceber o quão tarde estava disse que precisava ir embora.

- Tão cedo ? OK, então posso acompanhar você até em casa ?

- Claro, concordou Sophia.

Maurício pagou a conta e saiu com a moça para levá-la em casa. Os dois ainda conversaram pelo caminho e descobriram que moravam a apenas algumas quadras de distância um do outro. A casa da jovem era bem cuidada, com uma varanda ampla, pintada de um verde que combinava com o jardim que Sophia cuidava com muito esmero. Sophia morava sozinha desde que sua mãe havia se mudado para outro país, atrás de aventuras e sonhos que sua filha não compreendia. Os dois chegaram rápido e entraram por um portão gradeado pintado de um azul vívido e antes de se despedirem Maurício falou:

- Acho melhor você se secar antes de entrar..
Só então Sophia percebeu que ainda estava molhada e corou levemente.

-Posso fazer isso pra você.

Ele lhe disse e puxou a varinha que estava no bolso da calça, olhando para os lados para se certificar que não havia ninguém olhando e conjurou o feitiço com um gesto de mão :

- Quenterralopus.

Um jato de ar quente foi expelido da ponta da varinha e o jovem o usou como um secador para secar a roupa da moça. Em alguns minutos Sophia estava pronta para se despedir.

- Obrigado por tudo Maurício, até logo.

Sophia acenou para ele.

- Até.

Enquanto Maurício voltava para sua casa ele percebeu que havia esquecido de pegar sua jaqueta que ainda estava com Sophia e sorriu.

"Pelo menos agora tenho uma desculpa para encontrar ela novamente ".

Ambos sentiam-se nas nuvens.
Enquanto contavam a história para seu filho o casal podia sentir ainda toda aquela êxtase dos primeiros encontros e conversas e sorriam com as lembranças.

- E não é que eu voltei no outro dia para buscar minha jaqueta ? Maurício lembrou e riu com o acontecido, contando a história para o seu filho.

- E foi assim que eu conheci seu pai Fabinho. Depois daquele encontro vieram muitos outros e com o tempo nos aproximamos muito mais, foi o que falou Sophia, passando a mão pelo cabelo do seu filho.

A noite chuvosa daquele outubro de 2017 lembrava muito aquele encontro inusitado e os três conversavam abertamente no sofá cinza enorme.

Fábio Magno Fernandes. Esse era o nome de Fabinho, um bruxo mestiço, de cabelos encaracolados e escuros, de lábios finos e olhos castanhos como a mãe. Desde que se lembrava moravam naquela casa, na Travessa Rubens Fonseca, a casa em que sua mãe nasceu e se criou. Fábio usava aparelho desde maio:

" Nenhum feitiço poderia consertar estes dentes tão tortos !", sua mãe lhe disse e o pensamento o divertiu. A família observava pela janela a chuva que caía. O garoto abraçou seus pais: ele os amava demais.

Seu pai trabalhava muito no Conselho Mágico Nacional, apesar de Fabinho não saber o que ele fazia. Sophia, sua mãe, trabalhava no Correio Noturno como um tipo de repórter e as vezes passava a noite escrevendo. Além disso, sua mãe cultivava no jardim de casa lindas flores e por isso a casa vivia perfumada. Tantas sensações levaram o garoto ao sono e ele dormiu ali mesmo, entre os seus amados pais, ainda sentindo a mão macia de sua mãe entre os seus cabelos.



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