Capítulo 66

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Inverno, segunda-feira 31 de dezembro.

>> 1 semana após o sequestro de Abgail.

Devia ter uns três dias que eu não conseguia dormir ou comer direito. Meu reflexo no espelho mostra meus olhos vermelhos, junto à olheiras fundas e um cabelo bagunçado. Tomei o comprimido para ficar acordada e fui até a cozinha, notando que Markus provavelmente já devia ter saído. Nós praticamente não conversamos desde tudo que aconteceu, a situação está estranha, o clima pesado e isso só tem deixado tudo pior.

- Como você está? ( Beatrice abraçou-me )

- Acho que eu não poderia estar pior. ( soltei o ar ) - Eu juro que não aguento mais, Trice.

- ( ela segurou minha mão ) - Vai ficar tudo bem.

- ( respirei fundo ) - Eu espero que sim.

- E quanto a Markus? Como ele está?

- Eu não sei. ( dei de ombros ) - Tem uns dois dias que eu não o vejo.

- Vocês precisam ficar unidos nessa. Um é a força do outro agora.

- ( neguei ) - Ele...prefere ficar sozinho. Vou respeitar isso.

- ( suspirou ) - Nenhuma notícia?

- Nenhuma. ( mordi os lábios ) - Ela simplismente sumiu. ( meu celular tocou ) - Um segundo. ( levantei e caminhei até a saída do café ) - Lydia Logan.

- Sou eu. ( A voz de Markus ecoou estressada ) - Vai ter que me buscar na delegacia.

- O que aconteceu?

- Um paparazzi idiota. ( rosnou ) - Não me deixam ir embora.

- Já estou chegando. ( desliguei ) - Preciso ir.

- Aconteceu alguma coisa?

- Markus está na delegacia.

- Alguma notícia de Abgail?

- Não acho que tenha sido isso. ( joguei a nota na mesa e segui pro carro )

Peguei o primeiro táxi que apareceu, mas acabei por sair do carro e ir apé metade do caminho, o trânsito estava péssimo e eu demoraria muito tempo para chegar. Fui recepcionada pelo delegado que me levou até a sua mesa.

- O que aconteceu?

- Ele agrediu um fotógrafo. ( o delegado disse ) - E pelo que parece, ele está bêbado.

- Não sabia que ele estava bebendo.

- O fotógrafo desistiu de prestar queixa, mas é melhor que ele não continue com esse tipo de atitude.

- ( suspirei )

- Eu entendo que a situação não é nada boa, mas continuar do jeito que ele está... Só vai piorar as coisas.

- Vou conversar com ele. ( forcei um sorriso ) - Obrigada. ( andei até Markus que estava sentado em um dos bancos no fim do corredor ) - Vamos embora, por favor.

XXX

- Precisamos conversar. ( disse assim que entramos )

- Conversar? ( virou-se irado ) - Acha que eu preciso conversar? Olha a merda que tá a minha vida, Lydia! ( aumentou o tom de voz ) - As pessoas estão me chamando de estuprador lá fora! Minha filha foi sequestrada! Minha carreira interrompida! Acha que eu preciso conversar?

- SOCAR PESSOAS NA RUA! ABANDONAR A SUA CASA E VIVER BÊBADO TE AJUDA DE ALGUMA FORMA? ( gritei ) - QUANDO ABGAIL VOLTAR, É ASSIM QUE VOCÊ ESPERA RECEBÊ-LA? VOCÊ ESTÁ FEDENDO ÁLCOOL, MARKUS! VOCÊ ESTÁ HORRÍVEL! NÃO PIORE A SUA SITUAÇÃO.

- E TERIA COMO SER PIOR, LYDIA? ( socou a mesa ) - MINHA VIDA ACABOU! ACABOU O SONHO! VOCÊ NÃO PERCEBEU? ( aproximou de mim ) - EU NÃO CONSIGO FICAR DENTRO DESSA CASA, PORQUE PARECE QUE AS PAREDES GRITAM PRA MIM QUE NADA TERIA ACONTECIDO SE EU ESTIVESSE AQUI! ( encarou meu rosto ) - E eu não consigo olhar pra você e não sentir raiva de tudo que aconteceu.

- ( engoli em seco )

- ( umedeceu os lábios ) - Então sim, descontar a raiva socando pessoas na rua e ficando bêbado, é melhor do que isso. ( deu as costas )

- Por que você é assim? ( perguntei )

- ( ele me encarou )

- Está sendo injusto comigo. ( neguei ) - Estou tão péssima quanto você e você ainda insiste na única coisa capaz de me deixar pior. ( ri ) - Você continua me culpando por estar fodido agora. ( suspirei ) - Acabamos por aqui.

- O que você quis dizer?

- Que talvez você se sinta melhor sozinho, que talvez nós dois nos sentiremos melhor sozinhos.

- Você está terminando comigo? ( aproximou-se )

- E o que você espera que eu faça? ( ri, mesmo sem sentir nenhuma emoção ) - Que eu abaixe a cabeça e engula os seus julgamentos? Não, Markus. Isso é uma das poucas coisas que eu não faria por você.

- E pra onde você vai?

- ( respirei fundo ) - Parece que isso já não é mais da sua conta.

Parece que o mundo inteiro desmoronou nas minhas costas, tudo tem acontecido rápido demais, tanto que mal consigo respirar em meio às merdas que aconteceram. Deixar Markus era doloroso, mas talvez fosse mesmo o melhor para que os dois tivessem seu espaço e tempo para se recuperar, colocar as ideias no lugar e esfriar a cabeça.

- Você está mesmo indo embora? ( ele disse quando entrou no quarto e me viu terminando de arrumar as malas )

- Estou. ( limpei as lágrimas do rosto )

- Eu estava nervoso, Lydia. Foi...

- Eu sei que estava.

- Então qual é o motivo de você ir? Foi idiotice minha e eu peço desculpas. Não podemos simplesmente esquecer?

- Markus... ( parei de arrumar as malas pra fitá-lo ) - Eu amo você, amo muito mesmo e não duvide disso. Mas...enquanto você não esfriar a cabeça, ficaremos separados. Porque eu não vou ficar aqui preocupada com você, sendo que você parece não dar a mínima pra mim.

- É mesmo isso que você acha?

- Você me deixava sozinha mesmo sabendo que eu não estava bem, saia sem avisar e não falava comigo, bebia loucamente e não pensou no quanto me magoaria jogando na minha cara que eu sou a culpada por tudo.

- Eu estou sendo um babaca, mas eu não sei lidar com tudo isso!

- E eu não posso ficar aqui sendo seu saco de pancadas até você aprender a lidar. Acho que esse tempo vai ser bom pra nós.

- ( umedeceu os lábios ) - E você pretende voltar?

- Eu não sei. ( dei de ombros ) - Isso só depende de você.

XXX

- Lydia? ( perguntou ao me ver na porta ) - Eu entendi. ( abraçou-me após notar as malas ) - Pode ficar o tempo que quiser.

- Eu não aguento mais, Trice. ( agarrei-me nela e soltei o choro que prendia ) - Está doendo demais.

- Eu sinto muito. ( acariciou meu cabelo ) - Vamos entrar. Eu te faço um café.

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