Ao fechar os olhos Jungkook ainda conseguia ver as luzes ofuscantes dos corredores austeros do hospital. Seus ouvidos ainda podiam escutar o choro dela, as falas preocupadas do médico, o arrastar das rodas daquela maca, além do estridente "piiiii" do seu monitor de sinais vitais. Em seu olfato o cheiro vivido de sangue e álcool ainda era tão latente. Em suma, todos os seus sentidos o faziam reviver bem a noite, que mesmo tão recente, o garoto de dezenove anos queria esquecer.
Era para ser um dia feliz, não tinham planejado, no entanto, ambos os jovens estavam eufóricos com aquela novidade, além da nova etapa de suas vidas. E, no momento inicial, por mais preocupado que estivesse, o Jeon sentia toda a euforia de ser pai, consumi-lo, além da curiosidade e ânsia de ver o rostinho de seu filho. Tinham lido sobre partos e até visto alguns vídeos no YouTube, então aquele início assustador, não deixou o moreno em completo terror.
Mas tudo mudou tão drasticamente. Ele estava ali, ao lado dela, segurando a sua mão a incitando a ter força, o parto já durava algumas horas e Jungkook podia ver como Sowon se sentia cansada e até o um pouco pálida demais. No entanto, os médicos estavam ali, não? Sabiam o que estavam fazendo, os sintomas de sua namorada podia ser uma reação natural em um parto. Por isso, Jungkook continuou tentando dar conforto a garota, — que era apenas um ano mais nova que si —, ao limpar o seu rosto suado e dizer que já estava próximo do fim.
E, de fato, o jovem não mentiu. Poucos minutos depois daquela afirmativa, o choro alto e esgoelado tomou conta da sala. A atenção do Jeon se voltou para a pequena criança ensanguentada, o enchendo de um sentimento instantâneo de: talvez amor? Não sabia, era difícil para ele distinguir um sentimento apenas por um laço sanguíneo, afinal, ao crescer em um orfanato, nunca conheceu a sua e as pessoas que amava tiveram que lhe cativar. Entretanto, aquele pequeno ser na sua frente, fazia o seu coração bater mais forte e o enchia de felicidade, porém se aquilo era amor, Jungkook não sabia dizer.
O jovem Jeon se sentiu em uma bolha de felicidade, ao olhar para a criança que tinha os olhos tão pretos quanto os seus. Todavia, logo esta fora estourada quando escutou o tom preocupado da médica que fazia o parto.
"Hemorragia grave!", " Tirem o garoto da sala", "A pressão arterial está muito alta. Rápido, tragam o balão de oxigênio"
Os olhos do jovem rapaz logo saíram da "prisão" magnética, que o pequeno recém nascido exercia sobre si, e voltou para a garota na maca. Sowon estava mais pálida ainda e ao olhar para o monitor multiparâmetro, o moreno viu as linhas vitais de sua namorada ficando cada vez mais fracas.
Jungkook gritou o nome dela, desesperado, e se negava a sair daquela sala. Tentou tocar mais uma vez o rosto dela, que estava mais suado e, naquele momento, mais quente. Toda a felicidade tinha sido drenada do moreno, Jungkook sentia-se em completo temor! E, céus, como ele conhecia aquele sentimento. Os anos no orfanato e as poucas fugas da tal instituição, a vivência nas ruas frias e nada acolhedoras, fizeram o jovem conhecer, com intimidade, a sensação de medo e, também, de desamparo.
E, bem, desamparo era a melhor definição para Jungkook naquele momento. Em dezenove anos de vida, Jeon Jungkook, não conhecia a definição comum de família e lar tradicional, com pai, mãe e irmãos. Nunca conheceu esse tipo de amor predeterminado por um laço sanguíneo. Nos orfanatos tinha um teto, uma cama, vestes, alimentação e educação, mas o afeto era praticamente inexistente; geralmente os profissionais das instituições governamentais eram frios e, algumas vezes, sádicos. Poucos demonstravam carinho com as crianças, ainda mais quando estas envelheciam. Então aquela garota, sangrando e lutando por sua vida, era a única família que conhecia e aquela simples possibilidade de sua morte, deixava o Jeon aterrorizado. Pois sem Sowon, Jungkook, praticamente, voltava a ser uma ovelha solitária naquele mundo.
Mas ninguém controla quem vive ou morre e por mais esforços que os médicos tenham feito, por mais súplicas de Jungkook a qualquer Deus, o destino de Lee Sowon era outro. E a ciência daquele destino se fez clara para o Jeon quando escutou o bipe que indicava que nada mais poderia ser feito. Que o fundo do poço lhe tocava mais uma vez, assim como a solidão.
E, naquela madrugada, Jungkook não sentia o sono chegar. Seu corpo estava exausto, mas sua mente revivia, várias e várias vezes, os últimos momentos de Sowon, a sua doce e companheira Sowon. E o Jeon não sabia se podia aguentar mais, afinal, quanto mais teria que lutar contra a vida para ser feliz? O luto e, claro, todas as péssimas experiências passadas, — que naquele momento parecia ser mais latente — o deixava incerto sobre a sua força de se reerguer de mais um round contra a vida.
(...)
Dedico essa estória a uma amiga muito especial. Feliz aniversário minjeonj.
Quero agradecer a _pomelo pela betagem ncione um usuário
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Lullaby - Yoonkook
FanfictionToda a pouca felicidade que Jungkook tinha construído estava se desmoronando como um frágil castelo de cartas ao ter que lidar com o luto pelo falecimento da namorada e a criação de um bebê recém nascido. Toda a situação, e fantasmas vividos de seu...