Croissant de chocolate

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Volto para casa com a tensão invadindo cada pedacinho de meu corpo. Ao abrir a porta do carro, observo o olhar de raiva que meus pais carregam. Eu definitivamente estou frita.

O silêncio impera no ambiente, meu pai para na padaria onde geralmente tomamos café da tarde e compra alguma coisa. Não sei o que é, mas sem pre que olho para esse lugar, consigo quase sentir o sabor de todas as coisas deliciosas que eles preparam lá dentro. De todas, a melhor é o croissant de chocolate. Observo enquanto meu pai volta para o carro, ainda em silêncio, mas com uma sacola. Ele entrega a minha mãe e dá partida no carro mais uma vez.

Minha mãe me lança um olhar pelo retrovisor em determinado momento, a decepção o torna pesado. Sinto meu coração gelar quando meu pai estaciona o carro em nossa casa, desço, ainda ninguém disse nada. Acredito que irão esperar chegarmos na sala de casa para descarregarem tudo que estão sentindo e pensando sobre mim, antes mesmo de ouvir qualquer versão minha sobre a história. Permaneço com o olhar no chão e em meus pés, sem prestar atenção no que me rodeira e nem ousando respirar alto demais, preferia ser invisível neste momento.

O trinco da porta de nosso apartamento gira e eu entro depois de meus pais, que já vão em direção a mesa, que fica de frente a porta. Cada um escolhe sua cadeira em um dos lados, deixando a que fica de costas para a porta pra mim. Sento nela sem dizer uma palavra. Meu pai coloca o saco pardo da padaria em cima da mesa, antes de qualquer coisa. Fico me perguntando o que teria lá dentro, mas minha atenção se volta a ele quando ouço o som de sua voz.

- Por que você não voltou para casa ontem? - meu pai pergunta, abrindo a conversa, sinto vontade de gargalhar, mas apenas sorrio com deboche, mediante a toda a situação.

- Por que vocês não foram para a Biogincana, de novo?

- Clarice, este não é o momento ideal para tratarmos...

- Como não, mãe? É exatamente este o momento. - digo, brava.

- Eu fiz uma pergunta. Quero que ela seja respondida. - meu pai fala, tentando manter a compostura.

- Eu quis ir pra festa. - cruzo meus braços, desafiando os dois.

- Bom, graças a sua rebeldia e desobediência, você vai ficar de castigo. Nada de Paintball até segunda ordem. - meu pai fala, com a maior plenitude do mundo.

- Mas o paintball é uma tradição, vocês não podem tirar isso de mim! - me exalto, olhando desesperadamente para ambos.

- Não importa. - meu pai coloca de uma forma calma e assustadora uma das mãos sobre a mesa, como se ainda estivesse em um tribunal - Nós tínhamos um combinado, era para você estar em casa às 22h...

- Pai, eu... - tento justificar, mas ele apenas continua falando, com a mesma calma, mas um pouco mais alto.

- ...não é admissível para mim que minha filha, menor de idade, esteja por aí com garotos de madrugada...

- Nossa, mas...

- ...embriagada, se envolvendo em brigas... - ele apenas me ignora todas as vezes em que tento falar, então apenas me calo - ...ao ponto de Rodrigo ter que ligar para mim e para sua mãe no meio da madrugada - ele frizza a palavra "meio" - pedindo para que nós dois conversássemos com você sobre os ocorridos.

- Nós nos decepcionamos muito com você, Clarice. - minha mãe fala. Não digo nada, apenas permaneço encarando ambos.

Realmente, ao olhar assim, eu tenho uma parcela grande de culpa. Eles me encaram, claramente esperando que eu fale algo em seguida, mas sinto vergonha. Eu errei, reconheço isso.

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