You're my tear

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— …respeita,…apenas migalhas…outras? — ouço uma voz abafada por trás das portas de incêndio do auditório, assim que tento fugir com Taehyung para lá. Ergo minha sobrancelha e solto a maçaneta da porta na mesma hora.

É uma surpresa, mas ao mesmo tempo não. A porta de incêndio do auditório sempre estava aberta, não é incomum que alguém se esconda aqui, mas apenas meu grupo ainda estava na escola, conversando e rindo, jogando tempo fora, eu e Taehyung havíamos dado uma fugida já tinha algum tempo.

Se isso se tratar de quem acho que se trata… 

— O que foi? — Tae pergunta, aproximando o rosto de meu pescoço e deixando um beijo na parte de trás dele, arrepio e sinto vontade de me voltar em sua direção e beijá-lo, mas o corto fazendo sinal de silêncio e encostando a cabeça na porta para tentar ouvir a resposta, mas não consigo, graças ao isolamento acústico do local. 

É então que Júlia berra, mais uma vez.

— VOCÊ QUE NÃO QUER! — pela tonalidade de sua voz, ela está chorando — ME SOLTA!

Esse berro até Taehyung ouviu.

— É a Júlia? — Tae cochicha e eu faço que sim.

Ele também encosta a cabeça na porta, tentando ouvir, mas o som sai abafado, mantendo o assunto apenas dentro da grande sala de apresentações. Mas eu não preciso ter acesso a conversa saber para saber sobre o que se trata.

De repente, o último domingo volta como uma facada em meu estômago. Após a saída repentina de Taehyung do jogo de Paintball e de minha ida pra casa juntamente com Júlia, eu a assisti ligar para Pedro e combinar uma conversa. Eu a assisti derrubar algumas lágrimas. Júlia sempre é tão forte… tão sorridente, tão viva! Como pode? Como um garoto se atreve a fazê-la chorar? Eu quase tomei o telefone dela naquela hora, mas é o relacionamento dela. Não deveria me meter. 

Mas agora, espreitando a conversa de ambos por trás da porta de incêndio, em um dos corredores pouco movimentados do colégio, sou tomada por uma raiva incondicional. 

Percebo o silêncio e alguém se aproximando da porta onde estávamos ouvindo tudo, rapidamente empurro Taehyung para o outro lado do corredor, no desespero de ser flagrada testemunhando uma conversa que não me convém, apenas beijo Tae, o encostando na parede oposta e levando suas mãos a minha cintura. Não tínhamos o costume de ficar juntos desse jeito em público, tirando na festa, quando estávamos extremamente bêbados. 

Ele se assusta com minha atitude e parece não entender até que a porta é aberta. Faço questão de dar um pulo para trás, como se houvesse sido surpreendida. Pedro carrega um rosto pouco emotivo e apenas nos observa com estranheza. Olho para Taehyung que tem as bochechas coradas e o susto escancarado em sua expressão. Ele coça a nuca e limpa a garganta.

— Pedro! Que vergonha! Nós não sabíamos que… — tento disfarçar uma expressão de nojo em direção a ele e começo a justificar a cena, fingindo não saber o que ele fazia lá dentro, mas o garoto apenas faz um sinal com a mão de quem não dá a mínima e vai embora pelo corredor. 

Eu observo o garoto sair e, quando tenho certeza de que ele não ouvirá, me viro para Tae novamente.

— Desculpa. — murmuro — Prefiro que ele pense que estávamos apenas juntos do que ouvindo a conversa. — afirmo, Tae faz que sim com a cabeça.

— Acho melhor você entrar e falar com ela. — ele diz, apontando para a porta com o queixo.

— Nos vemos amanhã? — pergunto.

— Com toda a certeza. — ele diz, me dando um beijo na testa que parece aliviar toda a tensão se meu corpo — Saranghaeyo.

Saranghaeyo, Taehyung. — sorrio, me afastando e colocando minha mão na porta, a empurro, adentrando o ambiente, dessa vez, me preparando não para lidar com o fogo dos beijos adolescentes que Tae e eu compartilhamos, mas sim, com o coração quebrado de minha amiga. 

Adentro no ambiente com cuidado e de forma atenta. Júlia chorava copiosamente, sentada no primeiro banco da primeira fileira de cadeiras, meus passos eram silenciosos em sua direção, caminhei até onde ela estava, sem dizer uma palavra, a assisti com as mãos no rosto, cobrindo as lágrimas e a expressão de tristeza, apenas me sentei ao seu lado. Ela já havia percebido minha presença, mas não disse nada também, somente virou de lado e se deitou em meu colo, chorando.

Fiz carinho em seu cabelo enquanto ela se debulhava em lágrimas quentes, que escorriam de seu rosto e molhavam minha calça e pernas.

— Ele é um babaca, um cretino, um miserável… — a raiva tenta explodir em suas palavras, mas ainda é o momento de suas lágrimas falarem sozinhas.

Infelizmente não consigo dizer nada.
Júlia é a garota mais cheia de vida do grupo todo, sempre de bem com a vida e extrovertida. É ela que nos dá o suporte necessário, sempre que as lágrimas invadem nossos olhos.

Lembro de quando Laysa ficou em recuperação em física, seus pais eram extremamente rígidos com os estudos da filha, jamais aceitariam uma nota baixa sequer. Foi Júlia que a deu suporte.

Quando Vitória e Sarah brigaram feio, precisaram de uma intermediadora. Eu ajudei, mas foi Júlia que fez a maior parte do trabalho.

E quando eu sofri, com minha avó no hospital, no ano passado, Júlia largou tudo e foi me ver.

Ela é o elo, a alegria do nosso grupo.

Mas, neste momento, quem está precisando de amparo é ela.

Penso nessas coisas enquanto a assisto deitada em meu colo, ainda sem saber o que dizer. Então minha amiga se levanta e me encara, tento enxugar seus olhos com a ponta de meus polegares, enquanto ela continua falando.

— Ele não quis me assumir, — ela diz, fungando — mas não foi apenas questão de não querer um relacionamento sério comigo. Lembra que ele não tava no paintball na semana passada? — faço que sim com a cabeça, tentando assciar cada coisinha dita por ela — Ele não foi porque estava com outra menina. — Júlia faz uma cara de dor, que franze seu queixo e seu cenho e projeta o lábio inferior em um bico, enquanto a mesma fecha os olhos.

— Ele o que? — pergunto, incrédula.

— É, é. Eu sou uma idiota. — Julia respira fundo e engole o choro, enquanto limpa o próprio rosto — A Gabi já tinha me avisado que o Pedro não era gente boa mas eu insisti, disse que ele havia mudado, que estávamos apaixonados e… — ela tenta pagar de forte, mas, em seguida, cai em lágrimas, mais uma vez — Ai meu Deus! — esbraveja, deitando em meu colo novamente — Por que dói tanto?

Ficamos ali por mais alguns minutos, que parecem uma eternidade. É como uma tortura ouvir o choro de Júlia, ela é a garota mais cheia de vida e sorridente que todo o Clarice Lispector já viu, além de ser forte e sincera. Ver que ela ficou ali, despida em seus sentimentos, mostrando o mais profundo do seu ser, tudo o que a feriu, para um garoto estúpido, por causa dele.

Garotas fortes também choram. Ela é apenas um ser humano que está sofrendo. Minha cabeça me avisa. É, ela está realmente sofrendo, e me sinto uma completa inútil por não poder ajudar. Não sei o que falar, o que fazer. Em determinado momento, ela parece chorar menos. Nessa hora penso em dizer algo.

— Você quer que eu fale algo? — ela faz que não com a cabeça — Quer que eu dê na cara do Pedro? Ou que proponha um linchamento contra ele? — Júlia se ergue e me lança um sorriso triste, mas faz que não com a cabeça.

Penso mais um pouco.

— Você quer ir pra sua casa? — sugiro, ela faz que não também — Quer ir pra minha casa, então?

— Antes triste de barriga cheia do que com fome. O que tem de bom pra almoçar lá? — ela pergunta e eu dou risada.

— Essa é a Júlia que eu conheço. — digo, rindo ainda mais.

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