Partidas não tão empolgantes de xadrez.

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Eu não costumo trazer ninguém em casa, e meu pai não aceitaria bem um estranho, principalmente um garoto da minha idade com uniforme da legião.

Ele certamente veria James como uma ameaça, a minha virtude, e a minha segurança. Porque; A- James é até atraente e B- Ele é um garoto da Legião.

Mas, como posso pensar em James atraente, se meus pensamentos são tão focados na beleza de Jordan? Eles são um tanto diferentes, Jordan é popular, os cabelos curtos e finos penteados sempre para trás, o sorriso perfeito. E James, tem uma cicatriz estranha no rosto, cabelos loiros bagunçados e pra baixo das orelhas e não parece se importar tanto com a própria aparência. Vaidade e desleixo, como podem pesar de forma igual na balança da atração?

Balanço a cabeça, me negando a ir adiante com pensamentos tão estranhos, preciso pensar mesmo é em uma forma de pegar o carro do meu pai ao anoitecer sem que ele perceba, ou de falta.

Combinamos de nos encontrar as dez da noite no outdoor a um quilômetro da minha casa, não tem erro, é uma grande placa indicando os cuidados básicos ao entrar numa cidade com ursos humanóides. Ele vai estar me esperando, e então voltarei para casa, andando talvez, de todo jeito, preciso ajudar, independente do quanto eu precise andar depois.

Papai está na cozinha, cozinhando alguma coisa que não consigo imaginar o que, nunca senti um cheiro tão doce antes, então aposto que é algum prato oriental para a Kate, sua nova namorada. Talvez Kate venha jantar hoje, o que pode ser bom, significa que vão deitar bem cedo, para aproveitar bem a noite. Eca.

Preciso ajeitar algumas coisas na minha mochila, James pode precisar de itens de higiene; Escova de dente, escova de cabelo, toalha, camisetas extras. As minhas são grandes o suficiente para que lhe sirvam, de todo jeito, ele nao pode reclamar, está fugindo só com a roupa do corpo. Também não posso me esquecer da minha Butterfly, vai ser de grande ajuda, lanterna, pilhas, corda, esqueiro, spray de pimenta. Hmmm... Sinto que estou esquecendo algo.

Enquanto caminho pelo quarto suspirando e pensando no que mais ele pode precisar, ouço o som de um carro baixo e silencioso. Espiando pela janela detecto o Tesla azul de Kate. É realmente um carro muito bonito. Seria muito cruel roubar? Mesmo que por um bem maior?

Não, ele não é nenhum pouco discreto, Kate provavelmente mandaria a polícia atrás, e isso não seria bom para o James.

Uma coisa chama minha atenção no quarto, as peças de xadrez no chão, tenho certeza de que estavam organizadas quando saí, papai deve ter entrado. Isso não é um problema, não escondo revistas de garotos nus embaixo do colchão, e nem tenho um histórico de pesquisa muito interessante no notebook. De qualquer forma, não posso perder as peças de algo que foi tão importante para mim um dia.

Começo a reorganizar as peças no tabuleiro em cima da escrivaninha, deixando exatamente como deveria ficar caso uma partida fosse começar.

Analisando bem, talvez essa seja minha chance de tomar uma decisão melhor, instintivamente meus dedos movem um peão branco, uma segunda personalidade assume o comando das peças pretas.

E assim um jogo empolgante, ou nem tanto, entre eu e eu começa. Preciso jogar querendo ganhar de ambos os lados, para assim parecer um jogo justo.

Quando eu era criança, meu pai me ensinou boas jogadas, ele dizia que as peças eram como minhas decisões, que assim que eu colocar em prática, e andar uma casa, devo estar preparada para ganhar ou perder, que assim como as peças, eu posso ter tomado ou não boas escolhas. Ele dizia que não havia como reverter, que eu teria que lidar e usar uma nova estratégia, usar uma nova peça. E assim, jogar xadrez foi se tornando uma lista de lições de vida.

O silencioso mundo de Sammy Bloodstern Onde histórias criam vida. Descubra agora