Morar em Nova York não era uma tarefa fácil, principalmente quando se queria morar sozinha. Faltava luz no meu apartamento quase toda semana e demorava bastante para que todas as fases voltassem a funcionar. Meu maior medo era o inverno, quando Don Juan passaria muitas horas sozinho em casa sem que eu soubesse se tinha faltado energia e se o aquecedor estava ligado ou não.
Embora eu e Don Juan tivéssemos ficado sem luz - de novo - naquela tarde, conseguimos tirar uma soneca bem longa antes do meu horário no Chikas Lokas começar. Antes que o sol se posse, separei meu uniforme ridículo - uma saia curta e vermelha, uma blusa branca amarrada em cima da barriga e um boné vermelho com os dizeres "Soy Una Chica Muy Loca!" - e tomei um banho rápido e gelado.
Me vesti depressa e despedi-me de Don Juan antes que ficasse escuro de mais para sair. Encontrei a senhora do 203 discutindo com o senhor do 205 sobre a falta de energia, o que não era uma novidade. Os vizinhos sempre perdiam a cabeça quando a gente ficava sem luz. Acenei para os dois, logo vendo o senhor do 205 morder o lábio inferior e piscar para mim. Eca. Eu odiava aquele uniforme e aquele apartamento.
Enquanto caminhava até o metrô que me levaria até New Jersey, recebi uma mensagem da minha mãe perguntando se eu estava bem e se precisava de alguma coisa. Eu precisava que alguém me ajudasse a carregar minha mochila pesada e a terminar meu trabalho de Desenvolvimento da Infância... mas eu não ia escrever aquilo para ela. Mamãe sempre chorava quando eu me abria, então era melhor responder apenas "tudo certo". Meus pais moravam a uma hora da minha faculdade e insistiram para que eu ficasse com eles enquanto cursava psicologia, porém minha reposta sempre foi "não" e "nem pensar". Continuar morando na minha antiga cidade estava fora de cogitação.
Eu havia me afastado depois de ser aprovada na faculdade, porém minha maior motivação para mudar foi quando Laura, minha melhor amiga, começou a namorar Lucas, o cara por quem eu fui apaixonada a vida toda. Eu e ela sempre íamos para a quadra de esportes da escola ver Lucas jogar vôlei e éramos as maiores fãs do time dele. Laura dizia que Lucas seria louco se não me desse uma chance e sempre me empurrava para falar com ele depois dos jogos. Ele era o cara mais lindo que eu ja tinha visto e Laura vivia dizendo que queria ser nossa madrinha quando nos casássemos. Por isso, imagine minha confusão quando ela parou de me fazer companhia nos jogos dele e me proibiu de falar sobre o Lucas na frente dela?
Quando pressionei Laura sobre o que estava acontecendo, ela assumiu que eles tinham ficado e que estavam apaixonados. Eu fingi estar feliz por ela e insisti que não havia nada de errado naquilo, mesmo com o meu coração em milhares de pedaços. Tentei aceitar que Lucas a tinha escolhido e ficar perto dos dois, mas era doloroso de mais para mim. Por isso, quando recebi minha carta de aprovação na faculdade, não pensei duas vezes antes de me mudar e assinar um contrato de aluguel de um ano.
Antes que eu me mudasse, Lucas me chamou para perguntar como eu achava que era a melhor maneira de pedir Laura em casamento. Eles estavam namorando fazia dois meses, mas Lucas já estava certo de que queria passar o resto da vida com ela. Casamento. Depois de dois meses. Aos 19 anos de idade! Era muito para o meu pobre coração. Por isso, sempre que as coisas ficavam difícil em Nova York, eu lembrava o que me tinha feito mudar e ficava quieta no meu canto.
Usei minha longa viagem de meia hora até o Chikas Lokas para ouvir a nova musica da minha banda favorita, os Chasing Queens. Eles eram uma banda de Nova York que estava estourada em todo o país, com chances reais de alcançarem uma fama internacional com a nova musica que iam lançar. Eu estava ansiosa para ouvir "Lucky" e confirmar se era mesmo tão boa quanto eles haviam prometido no Instagram.
O metrô estava lotado, mas isso não me impediu de quase chorar ao ouvir as batidas doces da música e a voz impecável de Ian Hunter cantando sobre alguém que não tinha nada na vida, mas se sentia a pessoa mais sortuda do mundo apenas por ter quem amavam por perto. Merda. Eu não podia chorar no metrô lotado e borrar a maquiagem pesada que eu tinha feito para o Chikas Lokas, mas aquela canção realmente seria um sucesso. Ouvi-la quase me fez querer me apaixonar de novo.
Quase.
Desci do metrô e caminhei rapidamente até o restaurante, que ficava em um lugar não tão legal de New Jersey. Entrei pela porta principal- o que o gerente, Stan, odiava - e fui imediatamente colocar meu laptop e meu telefone para carregar. A noite seria longa e eu planejava trabalhar um pouco nos meus deveres da faculdade enquanto os clientes comiam.
— O Stan acordou do avesso hoje - avisou Hope, passando por mim com uma bandeja cheia de cervejas e batata frita.
Respirei fundo, logo vendo o homem gigante, careca e suado que era Stan caminhar em minha direção.
— Você tá atrasada, mala - reclamou ele, cruzando os braços. Stan me chamava de "mala" ou invés de "Molly".
— Desculpa, mas não tô - respondi, trocando minhas sapatilhas por tênis - você falou semana passada que eu podia começar meu turno às sete da noite para sair às sete da manhã. Você disse, bem irritado, que odiava me ver saindo quando o movimento da manhã começava a pegar.
A expressão de Stan suavizou.
— Talvez eu tenha dito isso - retrucou ele, dando um leve sorriso e mostrando os dentes separados - e se eu não falei, é melhor você fazer esse horário mesmo. - Ele apontou para uma mesa ao fundo do restaurante. - Seus motoqueiros favoritos chegaram faz meia hora e querem ser servidos por você. Estão te esperando. Ainda não comeram nada.
Respirei fundo, sentindo vontade de sair correndo. Eu odiava Stan, odiava aquele trabalho e odiava os motoqueiros que estavam me esperando.
Mas eu não ia desistir.
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A Vida é Dura Para Quem é Molly (Livro I) [DEGUSTAÇÃO]
Roman pour Adolescents_Livro 1 da Série Chasing Queens_ Molly tem certeza de que a vida dela é o roteiro ruim de uma novela mexicana. Quanto mais ela se mexe, mais as coisas dão errado. O primeiro ano de faculdade está muito mais difícil do que ela pensava, o trabalho à...