02. papel mache.

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se eu o colocasse na boca e mastigasse como uma bola gigante de chiclete de cereja, a sua existência não seria tão corrosiva quanto foi para os meus olhos naquela sexta feira de madrugada onde eu estava faiscando num fascínio assassino de fugir desse pesadelo norte americano.

pra mim, han jisung chegou como uma nuvem pequena no meio da tempestade de granizo e raios assassinos: com um sorriso cafajeste, guitarra nas costas e uma caixa de filmes de romance velhos prontos para o descarte.

e a galinha?
haha,
ela atravessou a rua.

o show precisa continuar, nem que seja com você beijando a boca de um estranho lunático, kim yerim.

talvez a minha própria cabeça estivesse mais em perfeita sanidade do que o meu corpo, porque a primeira coisa que eu fiz quando me aproximei dele foi pegar dentro daquela caixa o pior filme que eu poderia chamar alguém para assistir comigo. estranhas necessidades são como espelhos que se quebram facilmente com a força do pensamento antes de refletirem toda a solidão que habita no meu rosto só de você dar uma leve inspecionada em tudo que me compõe nessa caixa de boneca barbie que a minha versão infantil fez de papel machê bem no exato dia em que foi abandonada pela mãe no dia de buscar o boletim no jardim de infância. mas eu não a culpo pela minha falta de medo de me decepcionar loucamente com pessoas estranhas no meio da rua.

uma vez eu vi o dono de um posto de gasolina em que eu costumava calibrar os pneus da minha bicicleta jogando uma bituca de cigarro num arbusto e sem que ele sequer percebesse, o arbusto pegou fogo.

e o final é previsível, todo mundo já sabe.

os dois viraram um amontoado explosivo de cinzas incendiárias. tanto o dono quanto o arbusto.

naquela noite em que eu encontrei jisung na rua com aquela caixa velha lotada de filmes que um adolescente pseudo-culto acharia uma relíquia perdida, eu o levei para o meu quarto de hotel e nós conversamos das coisas mais triviais até sobre teorias da conspiração, e ao chegar na porta do quarto, ele me beijou.

eu não entendi muito bem, do mesmo jeito que eu não entendo o porquê de ele não ter me contado que tinha um carro antes de me fazer andar por um quilômetro e meio de calçadas, boates e bares, todos eles enfeitados com luzes neon.

naquela mesma noite, nós dois assistimos titanic e trocamos pouquíssimas palavras. e sendo sincera, eu até que senti vontade de ligar pra polícia, mas com um colar feito com as cordas arrebentadas da sua guitarra e a sua voz silenciosamente suplicando por mais uma dúzia de beijos, talvez os policiais poderiam me esperar por mais alguns dias; (se é que eles levariam-no dali ao invés de mim, porque já ficou mais do que claro que quem quis trazê-lo para dentro do meu hotel fui eu) só que eu não me arrependo de tê-lo conhecido. de maneira alguma, porque quando ele adormeceu, eu já não sentia mais que estava presa à redoma de penumbra em que eu estive antes.

é engraçado como eu sou facilmente comprada com qualquer demonstração de afeto ou uma migalha de sentimentalismo. eu quero chorar todas as mágoas e decepções num aquário roubado e quero colocar um filhote de tubarão lá dentro, mesmo que dentro do meu quaero e ao lado da minha cama. quando eu acordasse, eu poderia tropeçar propositalmente dentro da sua jaula aquática improvisada, sentar no chão e esperar para que o pior aconteça, deixando jisung com cara de espanto quando acordar pela manhã em busca das suas roupas íntimas todas espalhadas pelo aposento, vendo então, metade do meu rosto de porcelana sendo mastigado por um peixe assassino.

mas aquele tubarão não conseguiria me matar tanto quanto eu mesma já quis, mesmo que eu tente.

qual é o pior que pode acontecer à uma garota que ja nasceu machucada?

um recomeço não cura joelhos ralados e a minha ferida ultrapassa qualquer camada da minha epiderme sangrenta.

naquela noite, eu não consegui dormir.

mas eu fiz nevar.

mesmo que somente dentro das minhas narinas.

🌴

tá pegando fogo o circo?
resposta: ainda não !!!

capítulo especial em comemoração ao aniversário da mari): kimlipstick te amo caralho que SACO

já pode ser presa heinKKK

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