Não Sou Nada

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Eu não sabia ao certo o que fazer naquela situação. Não sabia o que ela de fato teria conversado com a minha mãe. Gelava-me o corpo só de lembrar que ela viu o que aconteceu na pousada. Mas como eu poderia explicar que aquela mulher que demonstrava não me conhecer naquele momento era a minha professora de Literatura Inglesa?
Designer de Interiores? Me poupe!

— Fernanda, né? Prazer, Thomas Oliveira. — Estendi a mão, mas sem sorriso no rosto. Ela quer brincar? Então vamos.

— Fique tranquilo, escolheremos móveis belíssimos para a sua sala. — Ela sorriu apertando minha mão. Em seguida recolheu suas revistas na mesa. — Eu devo ir. Tenho outra casa para visitar em alguns minutos. Agradeço a confiança Sra Marta.

Ela saiu sem deixar nenhuma pista do seu motivo de estar ali. Ela pode levar muito a sério o regulamento de não se envolver na vida dos seus alunos e por isso fingiu não me conhecer. Prefiro acreditar nessa possibilidade.

— Tomy, está tudo bem? Está parado aí feito um dois de paus. Anda, o Peter está no seu quarto te esperando. Ele vai passar a noite aqui hoje. Você sempre dorme lá, não tinha como eu recusar.

— O Peter está aqui? — A ultima coisa que eu queria era ter que falar com o Peter sobre o que aconteceu.

Fui para o meu quarto e fiquei parado na porta durante alguns longos segundos. Eu estou aprendendo poesia, não teatro. Não sei quanto tempo eu conseguirei me manter nesse personagem que eu criei.

Abri a porta do quarto e Peter estava ali, cabisbaixo. Seus cachos castanhos perdiam a definição por causa do peso de sua tristeza. Ao ouvir a porta abrir-se, olhou-me e tentou sorrir. Correspondi à tentativa e fui sentar-me ao seu lado. Não perguntei nada. Algo no meu coração sabia que ele não queria perguntas, ele queria um amigo. E ali estava eu, esse tempo todo querendo evitar vê-lo enquanto ele precisava de mim.

— Thomas, eu estou me sentindo patético. — Sua voz era pura rouquidão

— O que houve? Aconteceu alguma coisa com a sua família?

— Não! Está tudo bem com eles.

— Então me diz. O que houve? — Insisti

— Ver você beijar a Roberta me entristeceu bastante Thomas... — Ele abaixou a cabeça.

Pronto. Beijei a garota da qual meu melhor amigo estava apaixonado. E o pior, eu nem queria ter a beijado. E pior ainda, EU ESTOU NAMORANDO ELA.

— Peter, eu... Eu cansei. Eu cansei de mentir. Talvez eu só esteja sem forças de mentir pra você porque eu me importo com as consequências que podem te atingir como estão atingindo agora. Eu entrei no curso de Poesia por pensar que eu poderia finalmente ser eu mesmo. Pensei que seria o momento de finalmente acreditar em quem eu sou. Mas deu tudo errado. Peter, eu errei com você e errei com a Caroline. Não sei com qual dos dois eu errei mais. Eu beijei a garota que você é apaixonado. Com a Caroline eu... — Quando as palavras já tinham força própria para saírem da minha boca, o Peter me interrompeu.

— Thomas, eu não sou apaixonado pela Roberta. Eu sou apaixonado por você.

Eu podia sentir o abstrato se tornando concreto. Foi um nervosismo que senti vindo por dentro da minha espinha, chegou até a ponta dos meus dedos e parecia que era palpável. Por mais que todas as palavras que estavam na minha boca tivessem desaparecido deixando um vazio, os olhos do Peter preenchiam com todo o brilho que eles tinham enquanto olhavam os meus.

— Peter, eu gosto muito de você, mas a gente precisa conversar antes de qualquer coisa.

— Você acha mesmo que precisamos conversar. Lembra-se do nosso soneto? Lembra-se da noite de maratona de terror? Isso tudo não fala por si só? — Ele se aproximou mais um pouco e pôs a mão em meu rosto. Senti seus quatro dedos segurarem minha nuca enquanto o polegar se mantinha próximo ao meu lábio. Seu dedo passava do lábio até a bochecha fazendo um carinho delicado.

A Noite Ainda Será de Poesia [LGBT]Onde histórias criam vida. Descubra agora