Capítulo 15
Dessa vez, eu consegui manter meus olhos abertos. Pude ver todos os borrões nos quais os prédios, árvores, pedestres e carros tinham se transformado com a velocidade, contrastando com o cinza tempestuoso do céu. Pude aproveitar o vento revigorante de cada metro velozmente percorrido pela moto de Louis, que roncava alto como se tivesse vida própria e gostasse da adrenalina. Pude sorrir com a sensação gostosa de estar praticamente voando sem asas.
Diferente da ida, paramos em vários sinais vermelhos. E em nenhum deles, Louis sequer demonstrou se lembrar de que eu estava bem atrás dele, agarrada com firmeza às suas costelas. Mesmo sem poder olhar em seus olhos, eu soube que aquele era novamente o Louis de sempre. Ele tinha voltado a se trancar em seu casulo impenetrável, e eu sabia que eu talvez não voltasse a ver o que se escondia dentro dele. Porque eu não pretendia me deixar cair na tentação novamente. Eu não podia fazer isso com Hazza, por mais difícil que fosse resistir à atração que Louis exercia sobre mim.
Não demoramos a chegar à minha casa. Assim que ele estacionou a moto, eu desci e entreguei seu capacete, que ele colocou no bagageiro sem nem me olhar. Eu o observei subir na moto outra vez, com sua expressão indecifrável, e finalmente tomei coragem de dizer alguma coisa.
- Hm, obriga...
Nem bem eu abri a boca, um ronco de motor ecoou e ele foi embora. Suspirei, sem nem me dar ao trabalho de terminar a palavra. Eu já devia saber desde o início que seria assim, Louis não era o tipo de cara que se preocupava com os sentimentos dos outros. Pelo menos não o Louis que eu estava acostumada a ver.
Entrei em minha casa vazia e calmamente subi até meu quarto, sem saber direito o que fazer nem o que pensar. Eu já não me sentia tão culpada como da primeira vez, e algo me dizia que o motivo pra isso não era dos mais angelicais. Eu não tinha me esquecido de que aquilo era errado e muito menos tinha deixado de amar Hazza, mas ficar com Louis era melhor do que praticamente tudo. Poucas vezes eu me lembrei de querer tanto alguma coisa como eu queria agora. Eu queria passar o tempo todo sentindo os arrepios que as mãos dele provocavam em meu corpo, me sentindo tão desejada apenas com um olhar, o olhar dele, sempre intenso em mim como se eu fosse sumir num piscar de olhos.
Me perguntei por um momento se Louis estaria arrependido por ter me levado até sua casa, ou pelo que fizemos. Me perguntei se ele já havia se cansado de mim, se já tinha realmente conseguido o que queria, como ele mesmo disse uma vez, mas não consegui me convencer de que isso tenha sido a razão por trás de sua frieza. Se ele havia esperado e insistido por tanto tempo para finalmente me fazer ceder, ele já teria conseguido se entediar tão cedo? Talvez fosse algum motivo que eu não tivesse como descobrir, ou talvez fosse o mesmo sentimento que eu carregava comigo: culpa por Hazza. Tudo bem, retiro o que disse, Louis não sentia remorso nem culpa por nada, isso estava mais do que claro.
Estava tão imersa em pensamentos que só voltei a prestar atenção no que estava fazendo quando um trovão ecoou pelo apartamento, e eu me encontrei deitada em minha cama, encarando o teto. Coloquei uma mão dentro do bolso da calça e de lá tirei o bilhete que Hazza havia me dado na escola. Fechei os olhos, apertando o papelzinho em meu peito, que pulsava de acordo com meu coração acelerado. Por menos culpada que eu me sentisse em relação a Hazza, fato que continuava me fazendo sentir um monstro, eu ainda estava refletindo sobre tudo que tinha feito com Louis. E por mais que eu tentasse pensar em Hazza durante o resto do dia, meus pensamentos voltavam a ser atraídos para o professor Tomlinson, como um disco irritantemente arranhado, ainda mais com o tempo chuvoso e cinzento, que só me fazia lembrar da comparação que Louis havia feito. Naquele dia, o tempo realmente poderia ser comparado ao meu estado emocional.
Toda vez que eu me pegava sem nada pra fazer, aqueles olhos profundamente Azuis voltavam a me perturbar, e quando isso acontecia, eu recorria ao bilhete de Hazza. Sua caligrafia esforçada para parecer legível não me fazia sorrir mais, e sim pensar em uma única coisa, que mesmo que eu não quisesse, fazia meu corpo se queixar involuntariamente: o fim de semana estava próximo, e se Hazza cumprisse o que ameaçava fazer no bilhete, nós o passaríamos juntos. Talvez ele me levasse para viajar, talvez ficássemos em seu apartamento, talvez ele me surpreendesse com alguma outra alternativa. Mas não era isso que me agoniava.
Eu não podia mais pensar em Louis. Por um momento, pude jurar que não conseguiria. Se eu estava disposta a manter todos os meus podres em segredo, não podia parecer pensativa, nervosa, ausente demais durante meu fim de semana com Hazza. Eu tinha que parecer íntegra, completamente feliz e plena, o que eram emoções que se distanciavam um pouco da realidade. Mas por Hazza, tudo valia a pena. Mesmo que não fosse ele quem habitasse meus intermináveis sonhos naquela noite.
- Você já falou pra sua mãe que vai ficar “lá em casa” esse fim de semana, né? – Katherine perguntou, assim que o sinal tocou às 7 da manhã de sexta-feira.
Apenas assenti, sem saber se realmente estava pronta pra surpresa de Hazza. A proximidade da descoberta fazia meu estômago revirar de curiosidade e tensão. Pelo menos eu não tive que me preocupar com a desculpa para sumir de casa por dois dias, já que a mãe de Katherine teria que viajar a trabalho justamente naquele fim de semana. Bastou usar um pouco de minha lábia e do beicinho de Katherine pra que mamãe me deixasse acompanhá-la durante aqueles dois dias solitários em sua casa. Coitadinhas de nós, só nos faltavam asinhas de anjo.
- Eu juro que não te entendo – Katherine bufou, subitamente parecendo irritada, e eu franzi a testa, sem entender – O homem da sua vida te prepara uma surpresa e tudo que você sabe fazer é ficar com essa cara deprimida o tempo todo! Parece que não tá feliz com a maravilha que tem nas mãos, credo!
- Me desculpe, Katherine, eu estou com sono – falei pausadamente num tom ironicamente calmo, enquanto subíamos os degraus da escola rumo às nossas classes – Não fiquei acordada quase a noite toda porque quis, sabe.
Tudo bem, eu confesso, existe um motivo além do sono atrasado, e que também está por trás dele. Quer dizer, Katherine não precisava ficar sabendo que eu andava sonhando demais com o professor Tomlinson, certo? Ela nem sabia que eu tinha ido ao seu apartamento! Pra que sair contando tudo quando eu podia praticar meu controle emocional e mentir pra ela? Seria tão mais produtivo, e ainda me ajudaria muito em futuras omissões. Já passou da hora de começar a pensar também no futuro, e não só em aliviar os incômodos do presente.
- Você e esse seu sono me estressam – ela disse simplesmente, revirando os olhos assim que chegamos ao nosso andar – Vê se melhora essa cara, parece até que eu tô mais empolgada que você!
Soltei um risinho espontâneo, surpresa com a capacidade sensitiva de Katherine. Pra quem não sabia da pior parte, até que ela estava boa de chute.
As aulas antes do intervalo foram entediantes e superficiais. Não me lembro de absolutamente nada que os professores disseram, mas não parecia ser nada de importante. Pelo menos pra mim, não era nem um pouco importante no momento, isso eu posso afirmar.
- Mel! – ouvi uma voz cochichar quando eu estava saindo (lê-se: me arrastando pra fora) da sala, como sempre, após todos já terem corrido para a liberdade limitada do pátio. Hesitei por um momento ao ouvir o chamado, e respirei fundo antes de me virar na direção da sala ao lado, de onde Hazza me encarava com um sorriso sapeca.
- Vem cá, fujona – ele sussurrou, me pedindo pra entrar com um gesto de mão, e eu me esgueirei pra dentro da sala deserta junto dele. Mal Hazza fechou a porta atrás de nós, suas mãos percorreram minha cintura e ele me abraçou, unindo nossos lábios num beijo carinhoso. Eu tinha que admitir, ficar com ele jamais perderia a graça. Bom, pelo menos não totalmente.
- Espero que esteja preparada pra sumir de casa nesse fim de semana – ele sorriu quando partiu o beijo, daquele seu jeito encantador, e eu me vi dando o sorriso mais largo e espontâneo dos último cinco dias. Eu preferia não incluir os sorrisos involuntários que surgiam em meu rosto quando me pegava pensando em Louis nessa conta.
- O que você tá aprontando, hein? – perguntei, involuntariamente contagiada pela atmosfera gostosa que o rodeava constantemente, e ele balançou negativamente a cabeça.
- Logo você vai descobrir – foi só o que Hazza disse, tocando a ponta de meu nariz com o dedo indicador e me dando um selinho em seguida – Por enquanto, tudo o que você precisa saber é que meu seqüestro começa hoje à tarde, algumas horas depois da escola, e só termina na segunda-feira.
Arregalei os olhos, surpresa, e o sorriso esperto dele aumentou.
- Como assim? Começa hoje? Mas já? – indaguei, enquanto ele colocava meus cabelos pra trás da orelha – Hazza, dá pra parar de mistério?
- Dá pra parar você de ser tão ansiosa e esperar? Falta pouco, pequena! – ele retrucou, imitando meu jeito afobado e me fazendo rir – E aproveita essa agitação toda pra se arrumar rapidinho depois da escola, porque eu quero você às três horas lá em casa. Ah, e se eu fosse você, levaria uma mochila com algumas roupas.
- Claro que eu vou levar uma malinha, não pretendia passar três dias usando as mesmas roupas – falei, logo depois virando a cabeça pro lado em sinal de dúvida – Mas que tipo de roupas?
- Biquínis são obrigatórios, e algumas roupas bem leves – ele respondeu, olhando pro teto como se estivesse pensando – Mas “leves” não significa “curtas”, muito menos “indecentes”, ouviu bem? Estarei de olhos bem abertos.
Não gostei muito do rumo que a conversa estava tomando, alguns flashbacks de fatos que eu preferia esquecer estavam dando o ar da graça em meus pensamentos. Tentei fingir que estava tudo bem, e logo tratei de reprimir aquelas lembranças. A empolgação pela surpresa tinha finalmente borbulhado dentro de mim, e eu não ia deixar que meros detalhes estragassem tudo novamente.
- Entendi, roupas leves – assenti uma vez, e ao ver Hazza erguer autoritariamente as sobrancelhas, quase tornando visíveis em sua testa as palavras “Não está esquecendo nada?”, eu revirei os olhos e completei a revisão – Mas nada curto nem indecente demais.
- Agora sim – ele grunhiu, relaxando os ombros e fazendo uma carinha emburrada que me fez sorrir feito idiota – Você é só minha e de mais ninguém, que isso fique bem claro.
Hazza apertou o abraço em minha cintura, e senti um nó se formar em minha garganta, junto com o suor frio de pavor, que já dava suaves sinais de vida. Foi quando eu decidi que estava na hora de desconversar.
- Acho melhor irmos – balbuciei, fazendo a cara mais despreocupada possível e olhando pra porta fechada – O inspetor vai começar a desconfiar.
- É mesmo – ele sussurrou, com uma falsa expressão amedrontada, e me deu um tapinha no bumbum, como se me mandasse ir – Até mais tarde, amor.
Mordi o lábio inferior ao ouvir do que ele tinha me chamado, e o nó na garganta começou a latejar de remorso. Ele raramente me chamava assim, dizia que era “brega, mas de vez em quando, parecia certo”. Porque eu era o amor dele. E doía saber que eu não merecia aquele sentimento tão puro e transparente.
- Ei, espera – cochichei, segurando o rosto dele carinhosamente e olhando fundo em seus radiantes olhinhos verdes – Eu só queria dizer que... Eu te amo. Muito.
Mesmo com todos os recentes (e incríveis) acontecimentos com Louis, eu não me senti falsa ao dizer que o amava. Porque aquilo não tinha deixado de ser verdade. Meu coração bombeou alívio para todos os cantos de meu corpo com o bom resultado de meu teste. Nada tinha mudado. E se eu tivesse controle sobre a parte devassa de minha mente, o que eu definitivamente não tinha, tudo continuaria igual.
Mas mesmo repetindo pra mim mesma que tudo estava intacto, havia uma voz baixa, porém muito poderosa, que me dizia que eu estava errada, que tudo estava mudado. A voz dele. Estremeci de leve, mas felizmente ele não percebeu. Meus conflitos internos ainda me denunciariam, fato. Respirei fundo e me recompus, deixando pra refletir sobre minha situação afetiva num outro momento.
Hazza piscou algumas vezes, assimilando minhas palavras, e abriu um sorriso lindo de orelha a orelha. Ele aproximou lentamente seu rosto do meu, fazendo carinho em minhas bochechas com seus polegares, e quando estava prestes a me beijar, pude ouvi-lo murmurar:
- Eu faria qualquer coisa... Só pra ouvir você me dizer isso.
Meus olhos, que miravam perdidamente os lábios dele, se ergueram até encontrar seus olhos, intensamente ternos. Senti algumas lágrimas se formando, mas as contive quando ele me beijou daquele jeito especial, só dele. Mas eu não era mais só dele. E nunca mais seria.
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Biology
FanficAqui vai ser contada a história de Mellany Brown, também conhecida como Mel, você acha que nunca iria se envolver com um professor, imagine dois Obs: Essa fanfic não é minha, ela é postada no site fanficobsession.com.br