7- Paixão.

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Entro em um daqueles prédios que só de olhar você já paga e até a música ambiente deve ser cobrada na conta. Sentamos em uma mesa no canto e nos trazem uma toalha quente junto com o cardápio.
Encaro Alexander com cara de "o que fazemos com essa bendita toalha?!" e ele ri, a pegando e limpando suas mãos; tudo faz sentido e eu o imito, como se sempre soubesse que restaurantes chiques não têm pia pra lavar as mãos.
-Vamos logo ao assunto que nos trouxe aqui...
-Comida grátis!
-Meu personagem!

Ele esbraveja.
-Vou pedir minha comida e depois conversamos, Caleb.

Quem diria que o famoso ator Alexander fica bravo quando está com fome. Resolvi olhar o cardápio e juro que meu coração quase saiu pela boca com aqueles preços.
-E-eu conheço um lugar bem melhor pra comer... talvez a gente pudesse ir lá!
-Se esse lugar for mais caro eu topo.
-Quando você me levou pra almoçar nós comemos um hambúrguer! Que reviravolta é essa? E você é o ator rico aqui!

Ele ri.
-Bom, eu não estava dando conselhos naquele dia. Agora sou valioso.
-Não tanto! Eu descubro sozinho, se precisar.
- Você não tem a menor graça! Eu pago, senta aí.

Sentei, segurando um deboche para o final da noite, depois que ele me ajudasse e não tivesse mais poder sobre mim.

•••••

Quando enfim a comida chegou, encarei Alexander em uma tentativa de conseguir o que eu precisava para salvar meu personagem... E minha carreira. Mas tudo que ele fazia era se animar com a comida e colocar várias garfadas seguidas na boca.

Após uma longa pausa, ele me olhou.
- Qual sentimento caracteriza seu personagem?
- Obsessão.

Ele sorriu; não o suficiente para me fazer sorrir de volta. Sério o suficiente para saber que havia errado.
-Isso faz parte dele, mas não é um sentimento. Talvez uma mistura de emoções mas, não um único. Qual é o sentimento que forma sua obsessão, Caleb?

Pensei. Ódio, não. Raiva, não.
-Eu... não sei. Ele deseja, ele possui, ele...
-Ama.

O encarei, quase engasgando com a comida, cara demais para ser cuspida.
- O quê?!
- O que falta no seu Oliver é aquele fogo nos olhos, aquela... paixão que ele sente pelo Júlio. Você pensa que ele ficaria furioso ao ver que Júlio se machucou, mas ele na verdade estaria tão preocupado ao ver sangue e tão aliviado ao ver seu bem mais precioso vivo, que não teria espaço para ficar bravo.
- Nunca tinha pensado... dessa forma.
- O seu ponto de vista é que não te  permitiu pensar assim. Para você Oliver é um doente, um histérico mas, quando perceber que o que você chama de doença, poderia ser visto como amor extremo, sua visão vai mudar.
-Ele é doente! Nada em extremo é bom, Alexander. É um amor doentio que não traz bem a ninguém, justamente porque ele não tem controle!
-Ele não faz bem, mas Oliver tem um extremo controle. Ele jamais levantaria a voz para Júlio, jamais o machucaria, jamais o deixaria ir. Por isso a série tem tal final... porque seria impossível os dois viverem. Justamente por ele ser extremo é incapaz de ver que está fazendo o que mais abomina...machucando a pessoa que ele ama.

Nesse momento eu senti a diferença das nossas atuações. Eu mal entendi o personagem e ele já havia entendido o final de uma série que mal começamos a gravar.
- Você fala como se doesse em você.

Dessa vez um sorriso triste assumiu lugar em seu rosto.
- Doía.

•••••

- Obrigada por...tudo.

A visão do seu rosto contorcido não me deixa em paz; como doía, no passado, se ainda parece incapaz de desapegar.
- Eu que agradeço a sua adorável companhia, dobrando a conta desse belo estabelecimento, o qual eu paguei, na esperança que pudéssemos sair novamente.

Alexander tira seu chapéu invisível, provavelmente de um cavalheiro imaginado.
-Oh, meu bom senhor! Como és gentil! Eu sei que daria tudo pela minha companhia e, se me deixares escolher o próximo estabelecimento, eu pagarei de bom grado!

Rimos.
- É, uma coisa é certa, Caleb.
- E o que seria?
- Eu daria tudo pela sua companhia.

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