Capítulo Sete

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O mordomo olhou para os pratos que trazia nos braços e pensou o quanto teria que trabalhar para provar de uma comida como aquela. Conseguiria se juntasse alguns meses de salário — ou mais. Era absurdo a quantidade de restos nos pratos de Estela Deschamps!

Por isso não se sentiu humilhado ao mergulhar o garfo na comida esquecida e provar o sabor delicado do bacalhau. A textura fez a carne desmanchar sobre sua língua e sorriu de olhos fechados para o gosto delicioso: continuava perfeito, mesmo se tratando de restos.

No entanto, a degustação do mordomo durou pouco, já que logo teve que arrumar os próximos pratos sobre o carrinho, para então levá-los ao salão. Seu trabalho seria muito mais fácil se a Condessa Dubois não tivesse dispensado todas as cozinheiras no final daquela tarde, deixando-o sozinho para servir os pratos já preparados.

Ela dissera algo sobre desejar que a casa estivesse o mais vazio possível naquela noite de celebração. O mordomo apenas concordara, silencioso.

Empurrou o carrinho pelo corredor que levava ao salão de jantar, aspirando o cheiro saboroso dos filés. E então, instantes antes de se tornar visível para os convidados, o mordomo parou e tirou do bolso o pequeno vidro esverdeado.

Segurou os lábios para evitar a nova crise de tosse que ameaçava surgir, puxou o buxão da minúscula garrafa e pingou algumas gotas do líquido transparente sobre um dos pratos.

Você se verá comigo, Dubois. Isso é para lembrá-lo de nunca esqueci a humilhação de anos atrás. Aquela sua brincadeirinha quase me custou a vida e isso jamais deixarei impune! Pensou. Nada como um pequena humilhação para colocá-lo em seu lugar.

Guardou o vidro no bolso e continuou seu trabalho, o sabor da vingança misturando-se com o do bacalhau, ambos frescos eu seu paladar.

[302 palavras]

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