Capítulo 12

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Quanto mais se esforçar para seduzi-lo, mais deve acreditar em sua sinceridade.
Do capítulo intitulado «Se isso não é amor, então o que é?»

No início da tarde fazia calor no salão barroco. Ou talvez, admitiu Robert para si mesmo, estivesse nervoso. Não muito, mas o suficiente para que a gravata o incomodasse, embora a tivesse ajustado duas vezes. Tocar para um grupo, até para o reduzido número de convidados de Brianna, não era algo que aceitasse com frequência. Às vezes tocava para a família e o tinha feito, a pedido de sua avó, nas íntimas e discretas bodas de sua mãe com seu conde italiano. Lázaro tinha escolhido Vivaldi, é obvio, e isso agradou Robert, pois o maestro italiano era um de seus favoritos. E depois, quando sua mãe, com aquele traje nupcial que a fazia parecer tão jovem e encantadora, se aproximou com lágrimas nos olhos e o abraçou emocionada, ele ficou com olhos embaçados. Porque a amava e era comovente vê-la feliz novamente depois da devastadora morte de seu pai.
— Imagine o conquistador mais famoso de Londres, um verdadeiro ímã para o escândalo, famoso por sua afeição às damas encantadoras e aos jogos de azar, interpretando um dueto com uma senhorita jovem e virginal durante uma reunião campestre, só para agradar sua cunhada.
O sarcástico comentário fez com que Robert olhasse de esguelha para seu irmão, que tinha se aproximado para se colocar ao seu lado.
—Ninguém acreditaria, assim estou bastante convencido de que minha fama ficará intacta.
Damien tinha uma expressão inocente, mas isso não era novidade.
—A mim mesmo custo a acreditar. Diga-me, há algo nesse par de olhos cor de água-marinha que seja o motivo para que tenha se tornado tão pródigo com seu talento? Brianna me disse que estava encantada por Rebecca tê-lo convencido a tocar. Ouvi perfeitamente que fez Colton acreditar que a esposa dele havia pedido isso. De fato, mentiu como um velhaco, e isso não é próprio de você. Nem tampouco tocar em público. Pergunto isso, já que a deliciosa senhorita Marston é um denominador comum em ambas as situações.
Isso se aproximava muito de um território desconfortável, e Robert lançou um olhar sombrio ao seu irmão.
—Não basta usar sua inteligência para lutar contra Bonaparte? Estou convencido de que minha vida privada não pode ser comparada com intrigas dessa categoria.
—Infelizmente, Bonaparte está longe. Você, no entanto, está aqui. - Damien fez um barulhinho com os dentes, como uma risada.
O problema era que o par de olhos água-marinha tinha algo que levava Robert a fazer coisas irracionais, tais como brincar de correr pelos jardins à luz da lua. Diabo.
Esqueceu esses problemas quando os convidados ocupavam seus assentos, dispostos em um canto do grande salão, ao redor do palco onde estava o piano. Tinha que interpretar essa peça endemoninhada porque dera sua palavra a Rebecca, mas se alegrava por tê-lo aconselhado a ensaiar antes. Era uma composição desconhecida e por isso mesmo intrigante.
A partitura que um dos lacaios entregara-lhe pela manhã estava escrita à mão. Sem dúvida era uma transcrição em que não havia o nome do compositor quando foi copiada. Falaria com ela assim que terminasse a breve audição. As notas tinham uma qualidade digamos perturbadora que o havia surpreendido, pois eram suaves e, entretanto potentes, poesias líricas e comoventes. Robert estava convencido de não tê-la ouvido antes e tinha um vasto repertório, então era estranho. O estilo era único, preciso e brilhante.
—Ela tem um charme único esta noite, você não acha? — Foi uma simples pergunta, uma observação.
—Sim. — Robert desejou que sua voz soasse natural, mas teve a sensação de não ter conseguido.
Rebecca entrou no recinto com seus pais, é obvio. Ao vê-la, ele ficou paralisado e ficou de lado por um momento, incapaz de se mover. Estava com os cabelos ligeiramente presos, de modo que alguns cachos estratégicos dançavam sobre a silhueta de seu pescoço delicado.
A cor do vestido era em um tom prateado e o decote, na moda, ficavam justo na altura do opulento seio. Caminhava discreta entre seu pai e sua mãe, e esta última disse algo ao que respondeu com um leve gesto de assentimento. Em seguida foi para o palco, sentou-se ao piano e percorreu a sala com o olhar até que o localizou, ali de pé, perto de Damien.
Era um pouco difícil passar despercebido com um violoncelo nas costas, mesmo ficando parado na porta. Robert inclinou a cabeça, não para indicar que a tinha visto entrar, mas como um tributo a espetacular beleza dessa noite. Embora não tivesse importância que Rebecca soubesse, não é?
Ela respondeu com um sorriso indeciso que o impulsionou a amaldiçoar em voz alta, algo que provavelmente os convidados que abarrotavam o salão de sua cunhada não considerariam de boa educação. E pensando em seu próprio bem, Robert concluiu que estava começando a sentir uma admiração excessiva por esse sorriso, como um pretendente apaixonado que fosse escrever um livro inteiro cheio de poemas e rimas para a curva deliciosa desses lábios.
Tinha chegado o momento de acabar com isso.
Cruzou o salão e entre o público se fez silêncio. Talvez, supôs Robert, fosse porque se dispunham a escutar com educação, mas a maioria ficou atônita ao ver que ele iria tocar. Olhou ao seu redor para se assegurar de que as damas já estavam sentadas e ocupou a cadeira que haviam colocado para ele.
Diabos, estava muito perto dela para aspirar a essência de seu perfume.
Colocou imediatamente no suporte a partitura que ela havia enviado, provou o arco do violoncelo, e olhou para Rebecca para indicar a ela que estava preparado. Ela levantou suas delicadas mãos e inspirou.
E começou a tocar.
No final de dois compassos ele percebeu a magnitude de seu insulto anterior. Rebecca tocava com a sutileza de um anjo, e a beleza das notas fez com que a reduzida audiência desaparecesse por completo e ficasse em um segundo plano. Robert esperou com o arco levantado o momento de entrar e quando brotou das cordas de seu instrumento o primeiro acorde suave e melodioso, sentiu-se transportado a um lugar onde ninguém mais escutava, respirava o mesmo ar ou existia, salvo a mulher ao seu lado e a música que compartilhavam.
Não percebeu que a peça estava chegando ao fim até que uma última nota vibrante emudeceu. Robert deixou de observar a partitura que tinha ante si e virou a cabeça para ver Rebecca, inclinada ainda sobre o teclado, muito quieta, com a expressão de alguém que estava sonhando. Então o público estalou em explosões de aplausos e elogios, e tudo terminou.
Agora podia fugir, e isso deveria enchê-lo de alegria.
Não foi assim. Preferia continuar sentado e voltar a tocar.
Mas só haviam ensaiado uma peça, de modo que se levantou, inclinou-se cortês diante de Rebecca, e como não lhe ocorria nada para dizer, abandonou o palco e foi ocupar seu lugar entre o público.
Por desgraça a poltrona livre estava ao lado da mais jovem das senhoritas Campbell, que aplaudiu e sorriu radiante quando Robert se sentou.
—Excelente lorde Robert. Não tinha ideia de que você tocava tão bem — disse —de fato não tinha ideia de que soubesse tocar.
"Que Deus me proteja de fêmeas com o riso solto." Robert sorriu e se preparou para ouvir quando Rebecca começou outra peça. Tampouco reconheceu a sonata. Nem a seguinte. No final, ela interpretou um pouco de Mozart e Scarlatti, mas a maior parte da atuação consistia de obras que não tinha ouvido antes. Toda sua atuação foi brilhante.
Ao acabar, ela se levantou e ruborizou ante a entusiasta resposta, e chegou o momento de todos passarem para a sala de jantar. Robert se viu obrigado a acompanhar a senhorita Campbell, que se pôs de pé olhando-o com expectativa.
Então, para piorar ainda mais as coisas, viu que o colocaram sentado na mesa imensa junto à mãe de Rebecca. Deveria parecer engraçado que lady Marston dissimulasse tão mal o desagrado que ele produzia, mas por alguma razão o incomodou muito. Ela elogiou a contra gosto sua atuação, e o assombro em sua voz refletiu com toda segurança o que Robert teria que ouvir assim que voltasse para Londres.
Quando ele comentou o extraordinário talento de Rebecca, ela fez um gesto desdenhoso.
—Não é mais que um passatempo, é obvio. Todas as jovens bem educadas devem ter certa destreza musical.
—Certa destreza? — escapou sem pensar, como um protesto oculto. Talvez fosse a taça de vinho que acabava de ingerir de um gole só. — Madame, sua filha tem tanto talento como beleza. O compositor choraria de felicidade se ouvisse uma execução tão eloquente de sua obra.
Teria sido melhor que não mostrasse tanta veemência, mas a indiferença daquela mulher o incomodava. Então a mãe de Rebecca lhe dedicou um olhar frio e superficial, como se de repente o visse não só como um jovem de reputação duvidosa, mas sim como um autêntico perigo em potencial. Robert teve que se perguntar o que exatamente seu marido havia contado.
— Obrigada, milorde. Transmitirei a minha filha seus elogios sobre seu talento no piano — ela murmurou.
Em outras palavras, ele não deveria dizer a Rebecca em pessoa. «Que diabo esperava?» Disse a si mesmo. Mesmo que sir Benedict tivesse uma relação cordial com ele, a metade dos bons partidos de Londres tinha pedido a mão de Rebecca e tinham sido rejeitados. Era óbvio que seus pais eram seletivos, e deviam sê-lo. A senhorita Marston possuía tudo o que um homem desejava em uma esposa. Beleza, postura e talento. E havia aquele sorriso sedutor, inconsciente.
Se um homem desejasse uma esposa.
Porém isso não tinha importância. Esse não era o seu caso. Não neste momento, não com sua idade, não quando era dono de sua vida. Ele não desejava. Ou sim?

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