Prólogo

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Eros

A noite estava quieta.

     Esse era um daqueles momentos tranquilos da vida, grilos fazendo suas músicas, a brisa balançando as folhas e as estrelas brilhando no céu infinito, até mesmo a Lua parecia ter chegado mais perto da Terra para aproveitar a paz da noite. Sim, era uma daquelas noites que ficarão gravadas para sempre em sua mente, uma lembrança que apesar de velha, sempre vai estar fresca em sua memória.

     Eu só não queria que fosse assim.

     Não queria a tranquilidade do mundo, queria que o céu se rompesse em tempestades tormentosas e que o vento gemesse em agonia. Eu não queria essa calmaria, queria que tudo a minha volta estivesse como eu me sentia por dentro.

     Estilhaçado. Caótico. Perdido. Destruído.

     Mas até nisso o destino criado pelas Moiras contrariava o que eu desejava.

     Observei os vaga-lumes a minha volta, brilhando na escuridão da noite e me obriguei a contentar-me com o que o universo me oferecia, aquela seria a última vez que a veria e apesar de preferir o caos, eu sabia que ela gostaria dessa noite assim, mesmo que após isso ela não fosse lembrar-se dela. Então continuei em meu esconderijo, havia passado os últimos meses escondendo-me nas sombras, era quase natural agora.

     — Sabia que você viria. — Pandora. Não precisei olhar para saber que era ela, havia crescido ouvindo suas broncas e conselhos, conhecia bem sua voz, bem o bastante para reconhecer o pesar nela.

     — Sim... Mas eu devia ter vindo? — Deixei sair a dúvida que estava assombrando-me desde que chegara aqui.

     Ela sentou-se ao meu lado e encarou o mesmo ponto não tão distante que eu observava. Pilares de mármore circulavam um pátio amplo, iluminado por tochas e pelas estrelas e Lua, graças a ausência de um telhado. Era uma construção simples, o evento daquela noite não necessitaria de algo grandioso, na verdade, quanto mais discreto e esquecível fosse, melhor seria. Por enquanto, as únicas presenças ali eram das tochas que queimavam, mas eu sabia que logo ela apareceria e que Pandora teria que ir e que depois disso... Bem, depois disso não haveria mais nada.

     — Ter vindo ou não, isso não faz diferença. — Ela faz uma pausa e me viro para olhá-la, os olhos castanhos repletos de compreensão. — Mas acho que você fez bem. É importante saber dizer adeus.

     Então era esse o motivo de eu ter ido ali... Dizer adeus.

     — O que... — Engoli o nó que se formou em minha garganta e tentei novamente. — O que vai acontecer agora?

     Silêncio.

     Grilos e folhas farfalhando.

     Mais silêncio.

     Mesmo que eu já soubesse o que aconteceria, precisava que alguém me dissesse, precisava saber que seria um fato, não criação de minha mente, mas Pandora não me diria isso, ela não conseguiria me dizer que a mulher que eu amava preferia esquecer toda sua existência até aquele momento, apenas para se livrar das memórias em que eu fazia parte. Era uma das criaturas de espírito mais forte que eu conhecia, mas ainda assim, ela não me diria o que eu precisava ouvir.

     Ela sabia que eu não era forte como ela.

     — Eros... Eu... — Suas palavras sumiram e ela desviou o olhar, mas não a tempo suficiente para que eu não percebesse o brilho úmido que surgiu neles. — Queria não ter que fazer isso.

Eros & PsiqueOnde histórias criam vida. Descubra agora