Mãe África

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"Ó, mar salgado
Quanto do teu sal
São lágrimas"* da mãe África
Que viu seus filhos
Sequestrados e amarrados
Presos em fundos de navios
Atravessar os oceanos
Para uma vida de agonia
E tristezas infinitas...

Sei que choras infinitamente
Por essa cruel brutalidade,
Sei que cada gota de sangue
Que desceu pelo tronco
Foi uma lâmina em tua carne,
Mãe África...
Cada chibatada, um grito
Que atormentou seus ouvidos
E te enlouqueceu para sempre...

Seus filhos não tiveram
Uma vida digna no passado,
Foram massacrados,
Agredidos e açoitados e até hoje
São jogados ao inferno do homem
De cor clara e luxúria de ouro.
Sei que ainda choras,
Mãe África...
Porque dói essas persistentes marcas.

Virou uma chaga no teu seio
E a luta contra os preconceitos
Continua viva e ardente
Dentro do peito de cada preto.
Dói, arde, agoniza a cicatriz
Do povo que foi morto
E que vive em nossos livros de história,
Posso sentir teu gemido afogado
Pelo próprio sangue que desceu de teu ventre.

Mãe África, a humanidade
Talvez jamais consiga
Secar tuas lágrimas de sal ferventes...
A ignorância e a calamidade
Fecha os teus olhos para caçar
Em tua carne... diamante.
Calam tua boca para sugar riquezas
Dentro de tuas veias
Sangue negro, denso e rico... petróleo.

Tua alma se parte, Mãe África...
Sei que cada pedra preciosa
Arrancada de teus músculos
Causam feridas profundas
E destruição de teus frutos.
Lamentável, posso sentir
A tristeza de teu riso sem brilho
Sem os dentes dos teus bichos
Que viraram relíquias de caçador.

Teus filhos famintos perecem,
São ossos perdidos no deserto
Perseguidos por dogmas antigos
Ou por hipocrisia maldita
Profanada por religiosos.
Teu corpo padece, mãe África
Diante dos olhos do mundo frio
Ao redor iceberg de ouro cru
A lutar dentro de famosas reuniões.

E quem me dera um dia sequer
Papéis te saciem a fome
Remédios sejam usados
Para salvar sua dignidade quase morta.
E quem dirá um dia talvez
Que o passado não bata mais
De face em face na negritude
Nascida, crescida e criada
Por dentro e por fora de tua legítima

Mãe África.

*"Os Lusíadas", Camões

10/2018

Para Sempre Carla - A Vida é Um PoemaOnde histórias criam vida. Descubra agora