4 - Stalker

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  Quando se despiu para tomar banho e percebeu que sua calça e calcinha estavam sujas, Elizabeth finalmente entendeu porque durante a manhã chorara por uma simples mensagem não respondida. A sua menstruação infelizmente tinha descido, e agora teria de conviver sete dias com isso.

  Quando terminou o banho, secou-se e se vestiu, colocando o absorvente interno e pegando seu celular para anotar o dia em que viera. O aplicativo devia ter mandado alguma mensagem para lembrá-la, mas ela devia ter apagado junto com as outras notificações. Sentia-se uma péssima mulher por nunca se lembrar dessas coisas e nunca perceber quando estava de tpm, e nem o aplicativo que tinha para lembrar-lhe disso a ajudava.

  Suas roupas eram leves e confortáveis: uma blusa de pijama com mangas compridas e uma calça escura de moletom. Estava pronta para poder aproveitar sua noite sozinha e fazer o que queria. Amarrou o cabelo e passou uma pomada na espinha do nariz, saiu do banheiro e desceu as escadas.

  Mais cedo, tinha ido ao mercado e comprado um pote de sorvete de chocolate, cobertura e uma bandeja de morangos, tudo para comer enquanto assistia televisão e chorava por alguma outra besteira. Era tudo o que ela queria agora, sentar-se em algum lugar e chorar por um filme bobo de romance dos tipos que Caty odiava.

  Então foi até o congelador e pegou o pote, lavou e cortou os morangos, misturou com o sorvete em uma vasilha e jogou a cobertura por cima. Pegou uma colher e sentou-se no sofá, ligando a televisão e escolhendo o filme que veria essa noite. Ela sempre demorava séculos para decidir o que ver, então já havia escolhido o filme mais cedo.

  Já tinha comido uma boa parte do sorvete e acabado com todos os morangos quando seu celular tocou. Na primeira vez, percebeu que o tinha esquecido na cozinha, ele estava longe demais e ela estava confortável demais para se levantar. Mas na quarta vez seguida que ele tocou já a incomodava profundamente, então Lizzy pausou o filme e foi atender. Estava tão nervosa por ter saído do cobertor quente que nem olhou o número antes.

  — Alô?

  — Oi — o outro respondeu. Ela conhecia aquela voz, só não se lembrava de onde. Quando ia perguntar quem era, ele continuou: — É... meio que você tá com meu casaco e...

  Ela congelou. Era ele, o garoto que derramara café nela. Como o encararia sabendo que tinha chorado por ele ainda naquela manhã?

  — Então o senhor mal educado decidiu me responder? — Perguntou, cheia de escarnio. — Até que enfim.

  — Bom, você poderia ter atendido antes, saber que estava me ignorando de propósito me magoa. — Sua voz escorria sarcasmo, Lizzy percebeu. Aquilo a deixou com raiva, ele é quem a estava ignorando. — Ah, desculpa não responder sua mensagem antes, não gosto de conversar com alguém sem ver o rosto, então eu gostaria de me encontrar com você e pagar por algum café, já que manchei suas roupas... claro, se você quiser. — Sua voz tinha um nervosismo e uma urgência que Lizzy não entendia.

  Ela queria xingá-lo, jogar na cara dele que a havia feito chorar, mas respirou fundo, aquilo era um efeito dos dias estressantes que tivera, da cólica e da tpm. Não devia ser irracional. Respirou novamente, equilibrou a voz e respondeu:

  — Tudo bem, então. Pode ser amanhã de manhã? No Lance's?

  — Hum... com manhã você quer dizer que horas? Não sou muito de acordar cedo, então talvez eu me atrase. — Um risinho ansioso passou abafado pelo telefone.

  — Às oito. — Ela sorriu, vingativa, mesmo sabendo que odiaria acordar tão cedo. — Não se atrase. Eu não gosto de atrasos.

  — Bom, sinto muito, mas não posso prometer isso. Vou chegar atrasado, mas vou pagar a conta, então peça o que quiser, não se preocupe. Enfim... terei que desligar. — Ouviu-se um "Caesar, venha ver o que a Becky fez pra gente!" — Hum... tenho que ir. Até amanhã.

  — Tá bom, então. Preciso falar sobre outra coisa também, é importante. Não se atrase. — E desligou.

  Lizzy colocou o celular no bolso, se apoiou no balcão, respirou fundo. De repente sentia-se ansiosa demais para ficar de pé ou fazer qualquer coisa. Ela o veria amanhã, o garoto que derramou café nela e a emprestou o casaco, o garoto que por algum motivo estava com as chaves de sua casa. Olhou para o sofá, onde estavam seu cobertor e o pote de sorvete quase vazio, a televisão ligada, e quis largar tudo aquilo para ir dormir e poder chegar logo ao outro dia..., mas bastou alguns instantes para perceber o quão tola estava sendo. Ele era só um garoto qualquer, e não seria a primeira vez que ela estaria com um garoto.

  Desencostou-se do balcão e voltou para o sofá, sentando-se confortavelmente e estendendo os pés. Pegou o pote de sorvete e recomeçou a devorá-lo enquanto assistia o filme. Em dez minutos mudou de posição várias vezes, tirou e colocou o cobertor nas pernas, soltou o cabelo, adiantou o filme, tomou todo o sorvete, mas ainda não conseguia se sentir menos ansiosa. Quando finalmente admitiu para si mesma que estava assim por causa daquela ligação, tentou resistir ao máximo para não pegar o celular e olhar novamente a foto do tal Caesar, mas cedeu em pouco tempo.

  Respondeu Ben e Lilith, que a haviam mencionado no grupo da escola, perguntando se ainda faria o trabalho com eles — o que ela havia esquecido que faria, e abriu a conversa com Caesar. Ele havia respondido um "ok", que ela ficou tentada a responder alguma coisa, mas logo afastou essa ideia ridícula. Abriu novamente a foto dele, onde o garoto sorria para uma menininha. De súbito, lembrou-se da carta que havia encontrado no bolso do casaco dele, falando de uma tal Sophia. Ela sentiu o coração se apertar com aquele pensamento, mas torceu para que estivesse errada, a garotinha estava tão feliz na foto...

  Sua mente dizia para desligar o celular e continuar vendo o filme, mas Lizzy não conseguia evitar, precisava saber mais sobre aquele garoto. E se ele fosse um maníaco? Precisava ter certeza antes de ir se encontrar com ele. Então foi até o Facebook e pesquisou pelo nome dele, mudando os filtros para somente pessoas de Verweef. Encontrou-o rapidamente, só havia ele com aquele nome que morava em Verweef.

  O perfil de Caesar não tinha muita coisa, só algumas fotos dele — que ela acabou por curtir umas sem perceber e entrou em desespero para descurtir — e marcações de amigos, mas foram o suficiente para ela perceber que não estava errada sobre sua suposição, a menininha da foto de perfil dele no WhatsApp realmente era sua irmã e aparentemente havia morrido há cerca de um ano atrás. Lizzy sentiu seu coração se apertar, desejando poder não ter sabido disso. Saiu do Facebook e desligou o celular, voltando para o seu filme e seu sorvete.

  Não demorou muito para que tivesse que pegar o celular novamente, quando uma notificação chegou e ela foi responder. Leu pela barra de notificações e arquejou ao ver quem enviara.

  Por que está me stalkeando?

  — Estúpida — disse a si mesma, sentindo um frio na barriga ao ler a mensagem.

Efeito BorboletaOnde histórias criam vida. Descubra agora