Olhos alaranjados se abriram e pequenos movimentos de despertar foram feitos.
- Vou chamá-la de... Ellen. – Disse a mulher que segurava o frágil bebê nos braços.
- Aquela que brilha! Nada mais justo. Os olhos se parecem com o sol - Falou outra mulher.
A criança estava envolta em uma manta antiga, porém sagrada, apenas as filhas das maiores bruxas da época tinham esse privilégio, época em que a magia estava em seu ápice movendo o mundo, tanto do bem quanto a do mal. Não era atoa que todo o convém estava presente no parto de Kira, uma bruxa mestra na arte da ilusão. A partir daquele momento, todas as atenções estavam na pequena bruxa que acabara de nascer.
Os dias se passaram como águas de um rio, o engatinhar havia virado passos, os passos ficaram mais largos, e aos 15 anos Ellen se tornara uma menina saudável e divertida, uma filha que dava orgulho e uma aluna excepcional, no entanto, sua magia ainda não despertara. Faltava apenas 2 meses até a cerimônia de iniciação e antes disso a maioria dos aprendizes de bruxaria já haviam descoberto suas afinidades no mundo mágico, aquelas que não despertavam seguiam vivendo uma vida normal sem se preocupar com os perigos que poderia surgir, mas também sem desfrutar da maravilhosa magia que existia. E a última coisa que Ellen queria era ficar fora disso.
Muito pelo contrário, seu entusiasmo para aprender mágica era implacável, leitura de pergaminhos, grimórios e selos eram passatempos prediletos, mas ao por suas habilidades em prática seu interior não conseguia externar a força, aquilo que muitas bruxas chamam de mana. A frustração era clara e o sentimento de injustiça crescia, porque não conseguia fazer magia? Perguntava-se todas as noites antes de dormir, mas não perdia as esperanças e jurava para si mesma que um dia, conseguirá evocar nem que seja a magia mais fraca.
O dia da provação estava chegando perto e o conselho das bruxas decidiu fazer a última reunião à meia noite antes do tão esperado momento. Era um salão bem espaçoso, a luz vinha de gloriosos lustres que estavam acima de uma mesa avantajada em largura, lá estavam as 13 maiores bruxas da congregação.
- Às que estão presentes aqui hoje, boa noite, o dia da cerimônia se aproxima e muitos alunos esperam ansiosamente para isso, como estão os preparativos? – Quem falava era a criadora da ordem que estavam seguindo, chamava-se Aurora.
- Está tudo pronto! Esse ano nossas crianças estão mais do que preparadas. – Falou entusiasmada a mais nova do convém. Não houve discordância das outras, apenas gestos de satisfação, o que deixou Aurora muito contente.
- Nem todas. – A voz que interrompeu o silêncio de aprovação viera de uma das bruxas mais rígidas da ordem, Drosera.
Olhares de confusão podiam ser vistos por toda a mesa, menos por aquela que havia se pronunciado. Seu olhar era firme e direto.
- Ellen não está nem perto de ser uma bruxa.
- Como pode ter tanta certeza? – Kira lançou um olhar frio, não gostou nem um pouco daquilo
- Ora, Kira, sejamos realistas! Sua filha não chegou perto de despertar a mana.
- Ela pode não mostrar a mana agora, mas um dia despertará!
- Um dia? Mas esse dia precisa ser até a cerimônia de iniciação, ou espera que ela desperte depois disso? Quem diria que a mestra da ilusão seria iludida dessa forma. – Levou uma das mãos à boca na tentativa de segurar o riso, mas em vão, ele já havia saído.
- Drosera, se você falar mais alguma coisa...
- Vai fazer o que? – A aura das duas bruxas circulava pelo salão, era como se a gravidade tivesse aumentado, o vidro das janelas vibrava e o ar sufocava a respiração a cada segundo. Mas antes que um embate fosse travado, Aurora interrompeu.
- Chega! Parem imediatamente com essa briga. Aqui não é lugar para batalhas sem sentido, Drosera, nunca duvide de uma aprendiz, e kira, controle-se mais. Esta reunião está encerrada, espero que não haja mais desavenças.
A luz das tochas dançava pelo ambiente, iluminando a cripta onde todos estavam, era tão grande que as luzes não chegavam ao teto. As arquibancadas de pedras estavam todas apontadas para o centro circular, como um funil, bruxos e bruxas esperavam o começo da cerimônia. As vozes ecoavam, e a ansiedade aflorava.
Um portal se abriu no meio do círculo, Aurora apareceu por ele, todos ficaram em silêncio.
- Senhoras e senhores, bem vindos a mais uma cerimônia de iniciação. Este ano, no entanto, será diferente, os candidatos terão apenas uma tarefa.
Murmúrios pela cripta, o evento era em sua maioria composto de 10 tarefas e todas sempre avisadas antecipadamente.
- Essa tarefa será de extrema dificuldade, e que por esse motivo será suficiente para a iniciação. Optamos pelo elemento surpresa para ter um verdadeiro desafio pela frente, sem nenhum preparo. Peço a compreensão de todos e principalmente de nossos candidatos.
Ellen estava atenta ouvindo a explicação da tarefa, era aparentemente simples, cada candidato deveria se aproximar de uma esfera que aparecerá no centro e conseguir ter controle sobre ela sem que ela tenha controle dos candidatos. Mas caso a esfera consiga isso, será irreversível, e deixará em um estado vegetativo aquele que sucumbir ao controle mental. Todos estavam apreensivos, era praticamente uma questão de vida ou morte.
Eram 20 bruxos e bruxas que estavam prestes a serem iniciados, Ellen era um deles, ela estava de olhos fechados e Kira a observava pela arquibancada.
- Você vai conseguir minha menina. – Afirmou a mãe, seu coração começava a acelerar e a tensão interna crescia.
- Quem será o primeiro a cumprir esta tarefa? Levante a mão. – Falou Aurora em alto e bom tom, mas apenas o eco de sua voz fora ouvida, porque o silêncio imperou mais uma vez naquela cripta. Os iniciados estavam nervosos, ninguém queria correr o risco de ser controlado pela esfera. Ainda de olhos fechados, Ellen se concentrava com todas as forças.
- Eu consigo. – Falou para si mesma, tentava manter a calma e se concentrar na tarefa, precisava fazer aquilo, queria fazer.
- Eu vou! – A mão subiu em meio aos aflitos, Ellen anunciara sua vontade, e assim andou em direção a esfera. Os olhos estavam fixos naquela bola maciça por fora, mas volúvel por dentro, que parecia fazer uma dança de tons vermelhos e negros. A cada passo dado sua respiração pesava, e o arrependimento de ter se apresentado crescia em seu peito, era um aperto tão forte que desejava apenas sair dali para cessar a dor, mas já era tarde demais.
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Contos de um escritor em treinamento
Short StoryOito contos, mas todos completamente diferentes entre si. Viaje em um mundo de fantasia, sinta medo, desvende mistérios. Acompanhe um treinamento.