NÃO SIGA ESSAS REGRAS

CAPÍTULO XI

ONZE

Você sabia que as abelhas morrem logo após picar alguém? Porque deixam o ferrão grudado em nossa pele, sendo ele uma parte de seu esqueleto. As vezes, nos comportamos como abelhas: Preferimos ferir os outros, mesmo que isso nos custe caro.

Maria Luísa e eu voltamos para casa juntos dessa vez, no carro que meu pai comprou.

– Você não dirige? – Ela disse sem tirar o olho da estrada.

– Não gosto, na verdade. – Fiquei em silêncio por alguns segundos, e logo completei: – Seus pais sabem que você é lésbi... digo, bissexual?

– Por que acha que me largaram aqui? Seu pai tem uma visão meio irônica da vida. – sorriu ironicamente

– Eu sei. – Escorei a cabeça no banco e vi um filme do passado rodando em minha cabeça.

Aos cinco anos de idade, descobri que eu preferia assistir as aulas de ballet através do vidro, do que jogar futebol na quadra da escola, e era isso que eu fazia. Meu pai me levava para as aulas extras em turno inverso na escola e eu ficava na porta da turma de dança observando as crianças que eram em grande maioria meninas.

Contei para minha mãe algumas semanas depois, e ela acabou me trocando para a aula ballet, sem que meu pai soubesse. E assim se estendeu por cerca de seis anos.

Um dia meu pai encontrou o treinador de futebol no mercado, e acabou perguntando como eu estava me saindo nos treinos. Já da pra imaginar, né?

Apanhei, apanhei muito. Fui proibido de dançar e, mesmo depois que meu pai foi embora, prometi para mim mesmo que não mais o faria. Até hoje.

Fui arrancado das minhas lembranças quando avistei Lana sentada na biblioteca Municipal através do vidro.

– Pare o carro! – Falei em um tom alto e me arrependi assim que Maria Luísa freou o carro de soco. – Ai, porra!

– Porra digo eu, seu idiota. O que aconteceu?– Disse e colocou a mão para fora do vidro mostrando o dedo do meio para o motorista do carro de trás que buzinava sem parar.

– Nada, eu preciso descer aqui. Obrigado pela carona, e por hoje. Diz para minha mãe que chego antes do jantar. – Tirei o cinto e desci dando as costas apressado logo em seguida.

Quando entrei na biblioteca, Lana estava sentada bem ao fundo, sozinha. Observei o livro que ela tinha nas mãos, "Camões" foi o que consegui ler de longe na capa.

Peguei meu celular rapidamente e  pesquisei uma poesia qualquer na internet, levei alguns segundos para decorar.

– "Amor é fogo que arde sem se ver" mesmo? Ou será que Camões estava enganado? – Citei me aproximando da mesa em que ela se encontrava.

Ela me encarou um pouco confusa, se mantendo em silêncio. Logo ergueu uma das sobrancelhas formando um semblante que mais me parecia deboche. Fui descoberto, porra.

– É esse contentamento, descontente, mesmo. – Disse e logo riu.

– É o que? – Assim que fiz a pergunta percebi que ela provavelmente estava dando continuidade ao poema que citei, e eu não sabia o restante pois nem se quer sabia quem era Camões. Resolvi abrir o jogo. – Tudo bem, eu nem sei do que estamos falando, na verdade não entendi nada. Nem sei que diabos é Camões, acabei e pesquisar no Google. O esforço vale algo?