Capítulo 1

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E lá estava Anna observando as nuvens pela janela do avião outra vez, pensando que essa poderia ser mais uma simples viagem para entrevistar algum estilista em ascensão ou uma modelo de sucesso, como as tantas vezes em que lhe foi concedido ser a primeira a revelar nomes poderosos da moda na revista em que era jornalista, o que lhe permitia - e obrigava - usar roupas caras e os cabelos sempre arrumados.  Mas essa não era uma viagem qualquer, não estava apenas de visita em algum lugar moderno para encontrar sub-celebridades da vez, não havia nenhuma reserva em um hotel chique e uma passagem de volta já garantida nas mãos. Dessa vez, seus olhos vagavam pelas nuvens pensando em toda sua carreira jogada no lixo e, ao mesmo tempo, sem conseguir focar pensar em nada direito. Seu olhar também estava bem diferente de quando ela se mudou de sua cidade natal pela primeira vez, - após se formar em jornalismo na única universidade pública do Estado em que morava - ele estava perdido, e não encontrava-se sequer um resquício da esperança que aquela jovem e recém-formada Anna, repleta de sonhos, de 4 anos atrás, havia no olhar quando partiu sem medo e cheia de sonhos rumo a um novo lugar que lhe possibilitaria inúmeras oportunidades.

A verdade é que, após se dar conta que desperdiçara quatro anos de sua vida trabalhando numa revista de moda e deixando de fazer o que sempre amou, que era escrever textos sobre a vida e, quem sabe, um livro, Anna decidiu pedir demissão do emprego e abandonar de vez sua antiga vida tão agitada e diferente do que tanto almejara para seu futuro. A perspectiva de estar prestes a se deparar com uma vida nova e totalmente incerta, deixava a jovem com um misto de embrulho no estômago e insegurança, mas não havia como negar que uma fina centelha de adrenalina também crescia dentro dela.

— Passageiros coloquem os cintos de segurança, em 5 minutos pousaremos no aeroporto de Carrilhos.

As divagações de Anna logo foram interrompidas e seu olhar perdido foi substituído pelo desespero de que estava prestes a chegar ao seu novo destino: Belas Velas.

Após o pouso em um aeroporto que não era, nem de longe, parecido com os aeroportos internacionais enormes, elegantes e lotados que Anna já estava acostumada a transitar, a jornalista pegou um dos poucos ônibus que partiam rumo à ilha e, ao adentrar na pequena rodoviária, a ficha de que seu rumo de vida estava mudando novamente, continuava caindo aos poucos. Poucas pessoas rondavam por ali, em sua maioria famílias que estavam voltando para casa após umas férias ou jovens visitando seus pais no fim de semana. Sem ar-condicionado, um local nada luxuoso, com alguns mosquitos a rodeando num calor insuportável.

— Acho que alguém chegou ao lugar errado.

Quando Anna olha para trás se depara com um homem bronzeado, sorrindo de lado para ela e só quando ele balança a cabeça em direção ao seu look invernal, ela se dá conta de que aquele loiro de camisa azul e bermuda marrom está falando com ela. Sem graça e se sentindo tonta por ter escolhido um sobretudo habitual e botas de cano alto de couro para viajar para o litoral, ela olha para suas botas e retira sua echarpe vinho e seu sobretudo branco.

— Ah, bem mais agradável assim! - Diz sorrindo para o homem que, ao observá-lo melhor, devia ter a idade dela, uns 26 anos. Então ele a fita mais uma vez com seu sorriso bonito e se afasta, indo em direção à saída da rodoviária.

Anna demora seu olhar alguns segundos sobre a porta que o homem com cabelos de um dourado escuro acabou de passar e constata que chegou, de fato, ao seu destino. Ao observar as janelas do ambiente, ela já consegue vislumbrar o céu azul e sem nuvens que se encontra do lado de fora. E só então se dá conta que está cheia de malas e é melhor sair dali, não sem antes checar se a cidade tem Uber. Mas ao checar que não, não existem Ubers circulando por lá e nem em um raio de 8 quilômetros, ela finalmente, sem ter mais o que fazer por ali, encontra o sol raiando ao atravessar a porta que não se abriu para ela, e ela teve que puxar com todo o resto de força que ainda detinha. Estava realmente com muita fome.

Teve que admitir para si que o local a surpreendeu positivamente; o cheiro da brisa do mar a acolheu e Anna inspirou fundo aquele ar puro, sentindo o perfume oceânico a relaxar, após anos sem parar para respirar de verdade. Isso ela teria que contar para Cecília, que acreditava que Anna estava sendo insana ao se mudar para um local 'completamente pacato, quente e cheio de mosquitos' nas palavras da amiga da antiga revista em que trabalhava. Mas, por hora, ela decidiu focar em conhecer melhor o local e, Ceci, como Anna a chamava, poderia esperar um pouco para saber da novidade.

Anna foi andando com suas duas gigantes malas de rodinha e uma bolsa, e logo percebeu que a ilha era como uma vila, e não havia necessidade de serviços de carro que a levassem aonde ela quisesse, uma vez que era um lugar bem pequeno, bucólico e com uma quantidade bem limitada de comércios. A jovem mulher ficou surpresa ao não se sentir irritada com esse novo mundo, ela sentia liberdade.

Tão livre que, enquanto andava distraída, mais observando tudo do que fazendo o que deveria fazer, que era procurar pela imobiliária em que alugou a pequena casa pela Internet, não se deu conta de que havia uma pessoa andando na mesma direção que ela, em sentido contrário ao seu e logo sentiu um baque no rosto. Quando olhou para frente só conseguiu enxergar uma parte de um peitoral moreno.

Pela segunda vez ao dia, em sua nova vida, Anna foi pega com sua cabeça no mundo da lua e, ao olhar para cima, encontrou um par de olhos verdes a fitando e imediatamente deu um passo para trás, envergonhada.

— Você é nova aqui né? - Perguntou o dono do abdômen moreno e, ao reparar melhor, bem definido.

"Por Deus, todos os homens aqui parecem deuses gregos que saíram da capa de uma revista sexy e nada vulgar?"

Ao escutar a risada exultante do homem parado bem à sua frente, Anna percebeu, tarde demais, que havia proferido aquelas exatas palavras em voz alta. A jornalista passou a adquirir rapidamente um tom vermelho em todo seu rosto que, infelizmente, não se devia ao sol, mas sim à mais outra vergonha passada no dia.

— Am, é... você... acho que você... é... entendeu errado sabe, o que eu disse... - Anna disse essas palavras colocando uma mecha de seu cabelo castanho atrás da orelha e de forma nada convincente, mais parecendo alguém que foi pego no pulo.

— Eu entendi bem o que você quis dizer. - Disse o homem que Anna não sabia até agora o nome, enquanto continuava com um misto de sorriso no rosto, seus olhos denotando divertimento com a nova moça na vila. - Não se preocupe, já estou acostumado!

Agora foi a vez de Anna rir e ficar levemente irritada:

— Homens... tão previsíveis, iguais em qualquer parte do mundo.

— Hum, então quer dizer que a lady é viajada!

Anna se permitiu sorrir e, recobrando pelo menos um pouco do senso, perguntou onde ficava a imobiliária Amaral.

— Ah, eu te levo lá. É a única imobiliária daqui. - Disse enquanto pegava uma de suas malas sem pedir. – O que você carrega dentro dessas malas? É algum tipo de sequestradora? Tem algum corpo aqui?

De fato as malas de Anna estavam extremamente pesadas, sua sorte era que a maioria de seus pertences chegariam no outro dia, por uma empresa que Anna contratou quando ainda estava em Capecócia.

E assim seguiram caminhando por uma rua estreita, até que viraram à esquerda e por fim chegaram a uma porta de madeira que passaria facilmente despercebida por Anna. A caminhada levou 2 minutos, mas se ela estivesse sozinha, pensou, definitivamente levaria horas procurando e não encontraria nada.

O carinha de olhos verdes e abdômen moreno e bem definido abriu a porta da imobiliária para Anna.

— Foi bom te conhecer, agora eu tenho que ir! - Dito isso, o homem, que até agora Anna não sabia o nome, apertou um botão que deveria chamar o imobiliário, deu um sorriso, virou-se, abriu novamente a porta e seguiu pela rua a fora.

A jovem esperava encontrar um senhor de meia idade descendo as escadas, vestido de forma elegante. Mas, como sempre se surpreendendo nessa cidade, e ainda sem perceber que ninguém usa terno por lá, após alguns segundos de espera, quem desceu as escadas foi um detentor de olhos azuis vestindo uma blusa azul e uma bermuda marrom.

— Ora, se não é a moça da rodoviária!


Eii gente! Primeira vez que estou escrevendo um livro, espero de coração que vocês gostem 💛
Qualquer crítica construtiva é sempre bem-vinda também!

Até o próximo capítulo, beijinhuss!
Luíza.

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