Subo as ladeiras da favela dentro do carro do meu irmão, com os olhos cheios de lágrimas. Minha mente bagunça e sinto a cabeça latejar..
Daniel, meu irmão, é motoboy por vontade própria nunca quis saber de crime, não tem um emprego melhor por falta de oportunidade, pessoas inconvenientes que não estende a mão a um favelado pra mudar de vida.. ele me conta com entusiamo sobre tudo que aconteceu aqui fora.. me alegro com a alegria dele..
Minha mãe ainda seca as lágrimas de felicidade e eu peço para ela parar.. por que isto também me faz chorar. E agora eu quero só sorrir.. pelo menos nesse momento.
Daniel: Bianca, hoje você vai pro baile você tem que vê, vai tá daquele jeito!- Diz meu irmão, animado.
Bianca: o que eu mais quero é um baile hoje.. depois de comer um pratão daqueles de comida e um banho bem demorado né, lógico! -Falo brincando e ele me olha com dó, finjo não vê.
Um prato de comida e um banho, na rua é lixo. Na cadeia e luxo.
O carro do Daniel passa reto da casa da minha mãe, eu estranho.. mas não falo nada...
meu silêncio durou pouco tempo.
Bianca: vamos pra onde? -Pergunto.
Renata: pra sua casa, você não tá com o Cauê, mas não esquece que a casa é sua. Não precisa viver nesse muquifo que eu vivo só com 3 cômodos. - fala me olhando pelo retrovisor.
Minha família nunca foi rica, o que eu tinha era pelo dinheiro sujo do crime.
Já a Minha mãe nunca teve muito e sempre que tentei ajudar ela não quis, sempre dizia que nenhuma nota que venha de fita errada próspera..
Hoje em dia eu concordo, olha de onde eu to saindo..
Eu tenho minha casa, eu paguei junto com o Cauê, eu que a escolhi. A casa é minha. Mas senti tanta falta do chamego da minha mãe, do cheiro da sua comida, mesmo quando eu acordava em cima de um colchão no chão por que não tinha cama pra eu e meu irmão dormir.. Eu queria muito ficar alguns dias lá..
Saio dos meus pensamentos com o Daniel parando em frente minha casa, essa favela mudou demais, as pessoas não são as mesmas, as ruas com outras casas e cores...
a minha casa tava totalmente diferente!
Bianca: ele não tá aqui né? -pergunto pro meu irmão. Se referindo ao Cauê, ele balança a cabeça negando.
Daniel: ele só pediu pra te entregar a chave, a casa é sua irmã.. fica suave! -Fala me dando um abraço, já do lado de fora do carro.
Entro na casa e minha mente balança... Quantas lembranças tenho aqui, me seguro pra não chorar na frente dos outros.. mas eles percebem e se afastam. Subo pro quarto que era nosso.. a cama de casal enorme e em cima tinha sacolas de roupas novas, sandália, joias.. Abri uma por uma.
Renata: ele pediu pra moça da loja de roupas escolher cada peça pra você desde cedo e também pediu pra te entregar esse celular, já tá com o chip cadastrados -chegou por tras de mim e Me entregou um IPhone dos novos.
Olhei pra minha mãe e balancei a cabeça sentando na cama.
Confusão mental tava rolando agora dentro de mim. Penso.. repenso! Ela me olha e eu aperto os olhos..
Isso é o mínimo que ele deve fazer, pro tanto que já passei por conta dele. Se pudesse, faria ele de tapete todos os dias.
Não vou devolver porra nenhuma, vou usar mesmo... Sofrimento de 4 anos me fez vê, que tem gente que me deve mais que a alma e esse filho da puta me deve até o último dente.
Daniel: vai lá tomar um banho e se trocar, antes da gente sair pro baile, vamos passar ali num restaurante novo que abriu aqui na quebrada pra gente jantar, eu, você e a mãe.. -Abro um sorriso, pensando no quanto eu sonhei com isso.
Minha mãe foi pra casa se arrumar e o Daniel tomou banho no banheiro de baixo, ele já tinha trago as roupas.
Entro na suíte do meu quarto e tomo um banho daqueles, já tinha tudo ali pra mim e Cauê sabe exatamente do que eu gosto, do que eu uso.. na verdade usava!
Saio do banho de toalha com o cabelo molhado, olhei pra janela e vi o fim de tarde.. já anoitecendo.
Aquele vento no rosto, o sol caindo.. agradeci calada!
Me vesti, abri meu guarda roupa e minha maleta de maquiagem estava intacta, me maquiei me olhando no espelho, quanto tempo não me sinto bonita.. dou uma volta e vejo que emagreci com isso deixa a impressão que meu silicone fica maior que o normal, arruma o cropped no corpo e desço as escadas.
Ativei minhas redes sociais sentada no sofá, enquanto esperava minha mãe avisar que já estava pronta, olhei minhas fotos é só fotos minha loira.
Nunca imaginei que tacaria o foda-se e passaria esse preto, mas como vou tratar um cabelo loiro dentro da cadeia?
Tiro uma foto e atualizo o feed na hora.
Em segundos começa subir os likes no Instagram, meu direct começa a acionar, não respondo ninguém. Saio de casa com o Daniel indo em direção a casa da minha mãe.. no carro escutávamos alguns funks e eu ria com tudo que ele me falava.
Gente feliz parece idiota, ri de tudo.
Daniel estaciona na calçada e minha mãe entra no carro..
Vejo uma ligação no celular, não atendo, ñ sei quem é e nem quero saber..
Quando meu irmão vai dar partida com o carro vem uma moto na maior velocidade e para com tudo na nossa frente. Minha mãe solta um gritinho e meu irmão olha como se já soubesse quem era..
Encaro de dentro do carro e o indivíduo Levanta o capacete e me olhando.. aqueles olhos eu conheço de longe.
Cauê: Desce! -Diz Autoritário, como sempre.
"Liberdade é pouco, o que sonhamos ainda não tem nome.."
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