Te vejo, ali, parado bem na minha frente. Talvez eu não tenha te superado e ainda esteja delirando. Talvez minha mãe estivesse certa e ter usado drogas na adolescência destruiu meu cérebro. Te vejo, você continua ali. Me lembro de quando você se foi, em meus braços, de quando senti teu corpo leve e pesado ao mesmo tempo, de quando não pude sentir seus ossos, sua carne, não senti seu sangue correndo em suas veias. De como tudo perdeu o sentido, do vazio que senti, como se eu houvesse perdido uma parte de mim.
A dor me invade, a dor da sua perda. Passei dois anos lamentando sua partida, o tempo que me matei por dentro desde que você se foi. A fúria invade meu corpo, o desespero toma controle. Os dois anos nos quais criei expectativas de te encontrar, e nos quais matei minhas próprias esperanças, foram em vão. Todas as tardes nas quais eu pensei ter te visto nas ruas e convenci a mim mesmo de que não passava de um delírio, podem ter realmente acontecido. Eu posso realmente ter esbarrado em você, posso ter realmente sentido seu cheiro e ter feito meu cérebro pensar que era apenas mentira.
Repasso os dois últimos anos de minha existência na minha cabeça, lembro de tudo o que vivi, de tudo o que pensei, nas coisas que fiz e nas que deixei de fazer, de quantas vezes lembrei de você. Penso em silêncio enquanto encaro sua imagem que permanece estática a me encarar. Não consigo me mover, estou paralisado de medo. Até que você se move. Eu permaneço onde estou.
- Oi, Deimos, quanto tempo. – você diz, dando um passo em minha direção com um sorriso tímido no rosto.
Não me movo, apenas te observo por um tempo, esperando sua imagem desaparecer. Esperando tudo voltar ao normal. Mas você continua a me olhar, com a sua mesma jaqueta jeans de sempre, aquela que você comprou no show que fomos da sua banda favorita. Você permanece no mesmo lugar, com seus tênis all-star desgastados de tanto serem usados. Você se veste como personagens de livros de romance, daqueles bem clichês, a diferença é que estes livros costumam ser fofos e felizes, o que não faz bem o seu tipo.
- Como você está? – você pergunta, me tirando do meu pequeno mundo dos pensamentos no qual eu havia me perdido. Um onda de adrenalina percorre meu corpo e consigo me mover.
- Como eu estou?! É isso que você tem a me perguntar?! Essa é a primeira coisa que você tem a me dizer depois de desaparecer por dois anos?! – eu me deixo tomar pela raiva. – o que está acontecendo? Como você pode estar na minha frente agora? Como você pode ser real? Por que você ainda não se foi? Geralmente não fica mais do que dois minutos. – lágrimas escorrem pelo meu rosto e molham minha camiseta.
- Nós temos muito sobre o que conversar, mas antes eu preciso que você se acalme. Eu vou te explicar tudo o que você quiser saber.
- Calma... que conveniente você me pedir isso nesse momento. – meu corpo treme, eu não tenho mais controle sobre eu mesmo.

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Suplício
Roman pour AdolescentsDeimos Cipriano precisa lidar com a perda de alguém importante, mas a maior dor que ele tem de enfrentar é a de ter perdido a si mesmo. A torturante tarefa de lutar contra a dor, solidão e abandono podem destruir as mais belas almas.