Capítulo II

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- Pai, o que tu queres-me contar.- Digo insistente. Mas o mesmo continua calado e eu continuo a insistir.- Nós nunca escondemos nada um do outro e agora não me queres contar.

- Eu não te quero contar isto desta forma, mas também não te quero esconder nada, tu sabes que não temos segredos um com outro, mas...a tua mãe ligou-me há uns dias.

E é nesse momento que paraliso ao ouvir a palavra "mãe", uma palavra que julguei já não existir na minha vida, começo a mexer nos anéis dos meus dedos freneticamente prestando a máxima atenção no que ele dirá a seguir.

-Ela quer que vás passar o próximo verão com ela no Algarve.- Disse ele num tom mais calmo possível, soltando um suspiro, parecendo já saber a minha reação seguinte, tentando ao máximo não mostrar o seu nervosismo.

- O que?- digo chocada- Ela pensa que é quem para pensar nessa possibilidade, depois de nove anos sem contacto algum basta ligar para ti fazendo esse convite estúpido e eu vou a correr ter com ela como se nada tivesse acontecido?

- Mas é uma oportunidade de compensar o tempo perdido, filha.- Diz ele com uma pontada de tristeza na voz.

- O quê? Tu só podes estar a gozar comigo, ela abandonou-te, deixou-nos para viver a sua vida feliz e perfeitinha, e tu ainda a defendes, eu não quero ver essa mulher que nos abandonou à primeira oportunidade que teve.

-Mas ela é tua mãe por mais erros que tenha cometido, ela pode ter-me abandonado, mas isso não quer dizer que ela não te ame.

- MAS EU NÃO A QUERO VER! Será que é difícil perceberes que se ela me amasse assim como tu dizes ela não me teria deixado para trás quando eu ainda era uma criança, numa fase em que eu precisava mais dela.

-Mas tu não sabes o real motivo dela ter partido.

- Jura que até isso me escondeste.

- Eu não te escondi nada... - Diz ele desviando a cabeça para ver se vem algum carro.

- Pois só omitiste a verdade. - Começo a sentir uma lágrima fria e salgada a sair do meu olho esquerdo. Eu tinha-me proibido de verter mais uma lágrima pela minha mãe, mas parece que muitas vezes os nossos olhos são traiçoeiros. - Pai sabes que eu nunca soube lidar bem com este assunto, eu finjo que estou bem e que nada disto me afeta mais, mas no fundo eu sei que esta é uma ferida que nunca vai cicatrizar. - Digo um pouco mais calma.

- Eu sei filha, ninguém consegue passar por essa dor de um momento para o outro, ainda por cima com a tua idade. Eu sei que já lá vão uns nove anos, mas talvez se falasses com a tua mãe melhor poderias... sei lá... tentar perceber o lado dela. - diz, acalmando-se.

- Pai acho que não estou pronta para perdoá-la, - digo entre um sussurro - pelo menos não agora. Foi muito tempo, é muito para assimilar. Eu tenho dezasseis anos eu não me devia preocupar com estas coisas.

- Eu sei, eu sei. Mas promete-me que vais pelo menos pensar na proposta da tua mãe de ires passar o verão com ela.

- Ai está bem! - digo rebolando os olhos.

O meu pai toca-me na bochecha e dá-me um beijo na testa. Só neste momento é que reparo que ainda estamos com o carro em movimento. Olho para a frente e vejo o carro a despistar-se.

- PAI CUIDADO! – Esta é a última coisa que me lembro depois do carro se despistar.

Perdida nas tuas ondasOnde histórias criam vida. Descubra agora