Nunca ninguém diria, quando o Sol e a Lua se conheceram, que seria um caso de amor à primeira vista. Mas a verdade é que assim foi.
Ainda o mundo não era mundo e já os dois trocavam olhares de enlevo, já os dois se iluminavam como candeias acesas na escuridão do universo.
Quando, de uma enorme explosão cósmica, a Terra surgiu, logo o Sol e a Lua decidiram velar por aquele pedaço de matéria, que não era mais do que uma massa disforme e sem vida.
O Sol encarregou-se de tratar dos solos. E não tardou que altas montanhas se erguessem, que árvores frondosas enfeitassem os vales e que planícies infindáveis se fizessem perder no olhar.
Depois nasceram as pedras e sempre soube o Sol colocá-las no local preciso: ora no cimo dos montes escarpadas, ora dispersas,salpicando o solo fértil das terras planas, até se tornarem areia fina,escondida sob os leitos silenciosos dos rios.
À Lua coube a tarefa de criar as águas. Águas profundas quedividiram grandes pedaços da Terra e águas mais serenas que desciamdas montanhas e se alongavam pelas planícies.
Tudo perfeito. Mas acharam, o Sol e a Lua, que alguma coisafaltava naquele mundo à medida. E como sempre se haviam entendido,a novas tarefas se propuseram.
Assim surgiram animais de toda a espécie: grandes, pequenos, unsmais dóceis, outros mais atrevidos, uns que caminhavam pelo chão,outros que se aventuravam pelos ares e ainda outros que só habitavam oreino das águas.
Agora, sim. Todos viviam em harmonia: o mundo do Sol e o mundoda Lua. E eles continuavam cada vez mais enamorados.
O Sol aquecia a Terra e dava-lhe a vida. A Lua embalava-a edava-lhe sonhos repousantes e noites lindas, tão claras que até pareciamdia.
Mas ― todas as histórias têm um se não ― certa altura em que Sol eLua andavam entretidos nas suas tarefas, vislumbraram, bem lá no meiode uma planície, uma espécie de animal que não se lembravam de tercolocado onde quer que fosse.
Não voava, não nadava, nem andava de quatro patas. Pelo contrário,erguia-se como o pescoço de uma girafa e parecia querer ser o rei dosanimais.
Decidiram vigiá-lo, não fosse ele perturbar o encanto daquele mundo.
Vigiaram dia e noite, noite e dia, sem interferir. E, ao longo dosséculos, no correr dos milénios, não gostaram do que viram.
―Então que faz ele às árvores que eu ergui? ― interrogava-se o Sol.
―E que faz ele das águas que eu pus a correr? ― indignava-se a Lua.
De comum acordo combinaram assustá-lo. Mandaram fortes raios deluz sobre a Terra, mas o animal protegeu-se em quantas sombras havia.Mandaram trombas de água infindáveis, mas ele fechou-se no seu covil ede lá não saiu enquanto os rios não voltaram ao normal.
E tudo o que Sol e Lua puderam fazer não foi suficiente para pararaquela espécie, que ainda hoje habita um planeta chamado Terra e dequem diz ser seu legítimo dono.
Vocês já ouviram falar dele?
Pois nunca esse bichinho reparou no trabalho do Sol, nem no labor daLua. Nem em quanto eles são apaixonados um pelo outro. Nem emquanto eles querem bem a esse planeta perdido na imensidão doUniverso.
E é por tudo isto que vos contei, acreditem, que a Lua tem aquele arsempre tão triste, quando, nas noites em que está cheia, ela nos olhasempre como num queixume.
E é também por causa disso que o Sol por vezes se esconde atrás denuvens sombrias: vai buscar conforto à Lua e lembrar-lhe, sim, que nuncaé de mais lembrar, o quanto ele é apaixonado por ela.
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Roda de Leitura
Short StoryUm pequeno livro, criado como resultado de um Projeto de Extensão realizado por alunos do 7º período do curso de Pedagogia da Universidade Metodista de São Paulo (2020). Aqui buscamos escrever alguns contos e pequenos textos para que sejam lidos...