As pulseiras coloridas da Yurca

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Acho que não dá pra disfarçar quando se gosta de alguém. Pior ainda quando se é criança. A Yurca estudou por uns tempos na mesma escola que eu.

Uma vez a professora mandou a delegada fazer uma lista dos barulhentos e indisciplinados. Por causa disso a turma ficou quieta uns minutos. É sempre assim. Depois começam a fazer confusão. Uns a falar atoa, outros a cantarem, outros na fofoca, ainda tinha o Ramos que ficava a imitar o jeito daqueles camaradas que falam na rádio. Mas, eu estava calado.
Por causa disso, todos estavam a me olhar. A delegada a me olhar, esperando eu dar um só “Pio” pra me por na lista. Eu nem já!

Em vez disso, eu só ficava a olhar na Yurca. Nas pulseiras bem bonitas que ela tinha. Toda bonita na cadeira da frente, a fazer barulho também, e eu todo babado, nem dava pra disfarçar. Eu estava com um bilhete na mão que tinha escrito pra ela. Mas não podia, senão iria para a lista. Uma colega, a Carina olhava para mim, me concentrando.

— É o que então você? — Sussurrou ela pra mim.

— Não é nada chê, me deixa!

— Isso aí na tua mão é o que?

— Hãmm, isso? — Falei levantando o papel — Isso é… — Ela puxa o papel antes de terminar de falar e entrega o papel na delegada.

A delegada se levanta e desdobra o papel, endireita os óculos e se põe em pé. Ela começa a ler o bilhete:

“ Yurca.
Não consigo mais comer pão com marmelada, nem bolinho com kitaba. Não consigo mais ir deitar sem sonhar com você.

Com o teu olho bem bonito. Tô cheiro de morango bem fixe, e tua pele tipo chocolate, teu cabelo bem grande. Me deixas atrapalhado com esse teu sorriso bem bonito que fazes com essa tua boca de falar”

Depois desenhei eu dando uma flor a ela, mas acho que não estava assim tão bom, a delegada fez cá uma cara. E continuou:

Essa flor é pra ti. Eu te amo Yurca”.

Quando ela acabou de ler deu uma gargalhada bem esquisita e depois dobrou e guardou no estojo. Eu dobrei os braços e baixei a cabeça na carteira.

Agora é que os meus amigos iam me estigar. Até o fim do ano.
Yurca não disse nada, nem se virou para me olhar. Assim que termina a leitura, a professora entra. Para o meu espanto ninguém me estigou. Até os estigadores nem me tocaram. Só fiquei envergonhado diante da Yurca que na saída vinha com a cara trancada na minha direção. Ao passar por mim sorriu, e me deu um beijo na bochecha. Eu fiquei parado aí. Saí dali uns 30 minutos depois.

A Yurca tinha um sorriso bem bonito, um cabelo bem grande, e umas pulseiras coloridas bem bonitas.

SE MEU CORAÇÃO FALASSEOnde histórias criam vida. Descubra agora