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      Naquele dia em especial, eu sentia como se estiveste prestes a acontecer algo que talvez mudasse minha vida que seguia tão rotineiramente. Não que eu tivesse problema com a rotina, muito pelo contrário, preferia os meus hábitos diários do que algo novo acontecendo cada vez que piscasse os olhos, sei que é exagero, mas é exatamente assim que me sinto com mudanças. Estava quase anoitecendo, o céu já assumia o seu tom azulado com o preto reconfortante da noite, sempre acreditei que durante esse período é que a vida começava a ficar mais ativa do que a manhã e a tarde. Após passar um longo tempo no transporte coletivo pensando no que fazer da vida, por fim havia decidido que seria melhor descer na próxima parada e observar um pouco a praia. O vento já me envolvia no momento em que desci do ônibus, pessoas conversavam, sorriam, brincavam e alguns músicos deixavam sua melodia preencher o ambiente juntamente com as risadas e vozes dos outros.

      Eu segui caminhando até alcançar a orla da praia, sentei em um dos bancos e no mesmo instante tudo sumiu, era apenas o céu, o som do mar e os batimentos do meu coração. Pensamentos inundavam minha cabeça, como se esperassem apenas e exclusivamente por esse momento para que pudessem tomar conta de mim, os olhos marejados observando o mar indo e vindo com suas ondas que varriam a areia. Sem sucesso para segurá-las, o calor das lagrimas caindo no meu rosto, empurradas pelo vento forte que parecia querer limpa-las, acalmando-me aos poucos, sorri em retribuição.

      Quando consegui por fim parar de chorar, comecei a prestar atenção nas outras pessoas que praticavam exercícios com um vigor absurdo que parecia me faltar. Alguns cachorros levavam seus donos para passear ali também, um em especial me chamava atenção, corria animado pela areia, fugindo quando a onda se aproximava de suas patas, a dona sorrindo de uma maneira tão animada que acabou me fazendo sorrir também. Era isso que me deixava revigorada, me retirava daqueles pensamentos que tomavam vida própria. Acho que era algo que me seguia desde a infância, gostava de observar as pessoas seguindo suas vidas na casualidade dos dias, ás vezes até mesmo imaginando estórias mágicas para elas, alguém correndo poderia estar fugindo de uma fada que buscava lhe amaldiçoar por ter roubado seu pozinho mágico, ou havia entrado por um portal e após anos seguidos preso naquele universo paralelo, conseguiu sair e corre para encontrar com sua amada que não havia deixado de amar-lhe.

     Meia hora já tinha se passado quando precisei levantar e voltar ao meu caminho, era necessário voltar para casa, a noite já cobria todo o céu, que estrelado sorria de maneira carinhosa e maternal para mim. A parada estava cheia, alguns casais abraçavam-se, algumas pessoas voltando do trabalho se espremiam para caber nos ônibus que chegavam e partiam. Consegui subir no terceiro que havia chegado desde que comecei a esperar, em pé, mas mesmo assim no trajeto já. Morava um pouco longe do ponto mais animado da região central, então era um tanto complicado locomover para ir em locais que seriam meus pontos de calma maior na cidade.

     A necessidade de desligar todos os meus pensamentos nos últimos meses crescia de uma forma quase incontrolável, por isso costumava fazer algo que ajudasse a calá-los. Mas não era apenas eu que parecia sentir isso, ao observar as pessoas, conseguia perceber o quão diferente e parecido eram de mim, elas também necessitavam parar e recolocar-se no mundo de uma maneira menos opressora, colocar uma sementinha de um único pensamento positivo para que dessa forma fossem capazes de seguir com a semana e seus afazeres diários.

     Já faziam quase duas horas desde que peguei o primeiro ônibus, presa em um engarrafamento sem final, revirei os olhos e encostei minha cabeça no ferro, o cansaço já tomava conta de todo o meu ser, a bolsa pesando nas minhas costas. Senti um toque em meu braço, virei a cabeça um pouco assustada, uma menina que estava sentada se ofereceu para segurar, tinha sido totalmente um milagre dos céus. Sorri carinhosamente para minha salvadora, porém travou de forma meio instantânea, a surpresa de seu sorriso em retorno ao meu tinha me paralisado, era ofuscante, não de uma maneira ruim, minha atenção voltou ao normal em milésimos de segundo quando seu rosto havia passado para uma expressão que questionava. Voltei a minha razão quase que instantaneamente, virei um pouco o rosto com uma certeza de que parecera uma idiota, um tempo depois olhei de relance para ela novamente.

Encontro com a Filha da LuaOnde histórias criam vida. Descubra agora