Capítulo 5

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No dia da eleição, sentei-me no meio de Mike e Kevin em frente a biblioteca. Kevin estava um pouco mais distante, mas Mike estava tão dolorosamente próximo que os braços das nossas cadeiras conseguiam se tocar. Sua perna esquerda pulava para lá e para cá, parecendo uma mancha caqui, e o assoalho rangia tão alto que soava como um golpe em minha testa. Ele fazia de propósito, é óbvio, qualquer coisa para me irritar. Minha saia de preguinhas espetava minhas coxas, dando-me a maior coceira, mas eu não saía do lugar, nem um centímetro. Não queria arriscar tocar em Mike acidentalmente, nem mesmo que nossos uniformes se tocassem.

Parecia que a escola inteira havia se reunido ali para ouvir o resultado. Connor Hughes sentou-se na fileira da frente, com a gravata solta ao redor do pescoço, virando-se quando alguém atrás dele começava a cantar, "Dom-ski, Dom-ski". Várias outras vozes uniam-se ao coro. O ambiente todo ficou barulhento e subitamente tive dificuldade de engolir a bala que estava em minha boca.

Em um mundo perfeito, essa competição não existiria. O candidato mais qualificado venceria. Mas Mike Domski tinha muito mais amigos que eu, muito mais. Rapidamente tentei me preparar, caso as coisas não saíssem do meu jeito. Vislumbreime tendo de sorrir, apertando as mãos de Mike, pois é assim que um perdedor educado faz. Esfreguei as mãos nas pernas, estavam úmidas e frias. Por mais difícil que fosse, recusava-me a dar a Mike a satisfação de me humilhar na frente de todo mundo. Ia me proibir de chorar caso perdesse. Eu me afogaria por dentro antes de permitir que uma única lágrima rolasse pelo meu rosto. Isso seria exatamente o que ele iria querer. Natalie Sterling chorando por causa de uma eleição do conselho estudantil.

Perder nem seria a pior parte. O ruim seria ter de sair do conselho estudantil. Não queria isso, claro, mas o que mais poderia fazer? Decidi que a melhor atitude seria escrever uma carta de demissão à Srta. Bee em vez de falar pessoalmente com ela, assim nem tentaria me convencer a ficar. Não ia fazer isso comigo mesma. E por mais que soubesse o quanto a Srta. Bee ficaria desapontada, ela não desejava que a minha participação custasse a minha dignidade. Eu sabia o que aconteceria: Mike ficaria entediado com toda a responsabilidade e o trabalho e jogaria tudo para cima de mim. Ele tentaria fazer de mim sua secretaria particular, alguém em quem pudesse mandar. E para mim, absolutamente, não havia meio de lidar com isso. A Srta. Bee estava sentada no escritório da biblioteca. Dava para vê-la pelo vidro, de cabeça baixa, contando as cédulas. Seu cenho parecia mais cerrado do que o comum, o que me deixava preocupada por razões óbvias. Sentei-me ereta e tentei manter contato visual.

— Nervosa?

Mike me olhava de forma presunçosa, suas sobrancelhas grossas como taturana encontravam-se no meio da testa. Apertei os lábios e o ignorei. Um sorriso passou pelo rosto dele, e ele esfregou o queixo com a barba por fazer. É claro que Mike não ia se incomodar em barbear-se para o dia da eleição. — Tenho de dizer, Natalie, seu nível de intensidade é ardente

— disse, batendo no colo estou até sentindo uma movimentação bem aqui. Olhei para Kevin Stroop, que mantinha seu olhar preso ao chão. Podia até ter sido uma estratégia de campanha. Enquanto Mike e eu brigávamos, Kevin ganhava tudo, mas eu duvidava disso. O mais provável era que Kevin tinha medo de Mike Domski, ou ele não estava nem ar em ver um cara que dizia coisas repugnantes para uma garota. Não que eu precisasse que Kevin me defendesse. Eu podia dar conta disso sozinha. — Pare de falar comigo — disse, o que foi bem mais curto do que a resposta dura que esperava dar a ele.

— Ei, deixa disso, Natalie. Só estou brincando com você — falou, esboçando um sorriso major. — Você jamais me deixaria de pau duro. Você é como um... Antídoto para o tesão.

A raiva percorria todo o meu corpo, então segurei firme os braços da cadeira. Mike Domski queria me ofender, e o melhor que conseguia fazer era me chamar de feia. Precisei de todo o meu autocontrole para não lançar a maior e mais tímida cusparada bem no meio dos olhos dele. E eu teria feito isso se não fosse a Srta. Bee movimentando-se em meio à multidão, com a mão levantada chacoalhando um pedaço de papel — Muito bem! Obrigada pela paciência de todos! Vamos lá!

Spencer apareceu na porta ao lado de outras garotas. Quando nossos olhares se cruzaram, ela acenou e me mandou um beijo, um gesto mais constrangedor do que 29 reconfortante. Tentei encontrar o rosto de Autumn no meio da multidão, mas, como não consegui, fiquei olhando para a parede à esquerda, em que os retratos dos antigos presidentes do conselho estudantil da Academia Ross estavam pendurados. A maior parte era composta de retratos de garotos de blazer, com um sorriso que revelava uma ambição descarada e indesculpável.

Só havia algumas garotas, todas carrancudas, nada de sorriso. Senti a semelhança logo de cara. A Srta. Bee ficou na frente da biblioteca. O cheiro apimentado do seu perfume me reconfortava, só um pouquinho. — É maravilhoso ver tantos de vocês interessados no conselho estudantil este ano. Nossa primeira reunião será na segunda-feira, e espero que aproveitem esse entusiasmo para se inscrever em pelo menos um de nossos comitês.

Esperei. Um sorriso vazio congelava em minha face enquanto ouvia os nomes dos vencedores. David Goss ganhou como secretário. Dipak Shah, como tesoureiro. Martin Gedge, como vice-presidente. Sorri para Martin para parabenizá-lo, e ele me retribuiu com um olhar de preocupação que me rachou ao meio. A biblioteca abafada sentia o morno aplauso das pessoas que esperavam pelo evento principal. A Srta. Bee pigarreou e o local ficou em silêncio. Tudo quieto, exceto o meu coração, que batia louca e aceleradamente.

— E na eleição para o nosso novo presidente do conselho estudantil, tivemos o resultado mais apertado da minha história como orientadora. O vencedor, por apenas alguns

votos, é Na...

Alguém dentre os simpatizantes de Mike começou a vaiar, e eu não consegui ouvir o restante do meu nome. Não que isso tivesse importância. De algum lugar do fundo da sala, Autumn veio rapidamente em minha direção, impedindo a passagem da multidão com a sua enorme mochila. O cabelo dela estava na frente do rosto todo, e ela gritava o máximo que conseguia. Levantei-me, sorrindo tanto que até doía. Autumn me abraçou com muita força, e balançamos tanto que quase caímos no chão. Pulamos para cima e para baixo, sem parar, nós duas, gritando e rindo.

Percebi que Mike estava de pé com seus amigos. Connor sorriu para mim. Creio que achou minha comemoração engraçada. Mas Mike não conseguia esconder sua repulsa. Separei-me de Autumn e fiquei bem na frente dele. Sabia que minha camisa branca estava com enormes marcas de suor na parte das axilas, mas eu não estava nem aí. Depois de rapidamente prender meu cabelo em um rabo de cavalo, estendi a mão e esperei o aperto de Mike. — Você não vai me parabenizar? — disse no tom mais sarcástico que consegui. Todos os amigos dele estavam ouvindo. Connor Hughes. Todo mundo. E eu estava adorando cada segundo.

Mike olhou para a minha mão e tirou sarro. — Parabéns por ser o tipo de fracassada

para quem esse tipo de coisa é realmente importante. Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, Autumn me tirou de perto e perguntou: — Tudo bem, Srta. Presidente? — e começou a massagear minhas costas como se fôssemos lutador de boxe e treinador depois de uma longa luta. A biblioteca começava a esvaziar, mas ainda havia vários alunos que ficaram por perto para me parabenizar. O momento pareceu-me tão adequado, tão Belo. Como o destino. Como todos aqueles momentos que alteram a nossa vida devem ser: fáceis.

Não sou este tipo de garota.Where stories live. Discover now