52• Fim

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O dia havia amanhecido chuvoso, genuinamente melancólico e com ele ideias e pensamentos igualmente assustadores.

O reitor da universidade não me ligou, mas eu ainda tinha a oportunidade de um emprego em oxford: uma pequena editora no centro da cidade. Eles me pagariam o suficiente para o aluguel e as compras do mês, e os bônus salariais ainda conseguiam cobrir as passagens para vir visitar meu irmão

Era uma oportunidade perfeita. Simples, porém perfeita

Logicamente teria que passar os primeiros meses sem moveis ou coisas do tipo, mas aos poucos isso iria se ajeitando. O importante era que querendo ou não eu tinha uma oportunidade de sair daquela cidade e ter uma vida descente

Respirei fundo antes de subir no skate. Ele me ajudava a pensar, e se tem algo que eu preciso nesse momento é pensar

O skatepark estava vazio, como de costume nas férias após o ano letivo, e lá estava eu, prestes a tomar mais uma decisão horrível

Eu cai algumas vezes, nada muito grave

Me sentei no chão e então notei como todos estavam viajando com os seus pais. Eu sei que não tem muito haver, mas aquilo me fez pensar de verdade. Ou melhor, me fez ter uma guerra comigo mesmo entre esquecer e lembrar

Algum tempo depois eu estava em um ônibus tomando uma decisão da qual eu provavelmente me arrependeria horas mais tarde. Passei toda a hora seguinte me questionando se era algo que eu realmente deveria fazer

De qualquer forma, eu não tinha nada a perder

Quando desci no ponto senti um frio na espinha. Eu não queria ir, mas minhas pernas já funcionavam sozinhas aquela altura

Se a família de todos é um pouco fodida, a minha está um nível acima. Com o tempo cheguei à conclusão de que somos apenas pessoas normais com belos problemas.

Lembro de cada uma das vezes em que eu pensei que não fosse aguentar, mas aqui estou eu. Eu aguentei tudo

Enfiei as mãos no bolso do casaco e encolhi meus ombros. A rua não estava tão diferente, ainda tinham os arbustos aonde eu escondia o skate, mas a pintura dos muros estava mais desbotada e repleta de rabiscos e pichações de todos os tipos. Se tinha algo que aquele lugar não se parecia era com um lar, e todos nós sabíamos disso. Eu principalmente

A última vez que estive ali foram dois anos atrás, depois nem sequer tive notícias dos meus pais. Não sabia se estavam vivos ou mortos, sabia que meu pai havia sido preso, o que facilitou meu irmão a conseguir minha guarda, mas depois disso não fazia ideia. Sua pena acabou em algum momento no começo do ano, mas como ele não se deu ao trabalho de nos procurar resolvi que também não o faria

Caminhei sem me preocupar com os minúsculos pingos de chuva deslisando pelo meu rosto, e meus pés pisando nas pequenas poças suavemente

E de repente eu estava em frente a casa

Nela havia uma placa "Indo a leilão, procuramos ofertas" presa a cerca branca desbotada

As paredes já não tinham mais buracos ou rachaduras, estavam lisas, mas a grama parecia maior e mais descuidada.

Caminhei até a porta em passos determinados e respirei fundo. No caminho, enquanto subia os degraus até a varanda pensei em simplesmente girar nos meus calcanhares e ir embora, mas por algum motivo nem sequer hesitei em tocar a campainha. Mordi o lábio inferior e fiz um muxoxo quando percebi que não havia barulho algum, então bati na porta

Segundos torturantes se passaram até que uma senhora abrisse a porta. Ela tinha cabelos encaracolados e uma pele negra, com olhos claros contrastando. Suas roupas eram bastante coloridas, porém desbotadas, combinando vagamente com a casa

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