33- Meu verdadeiro lar.

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"Se existe uma solidão em que o solitário é um abandonado, existe outra onde ele é solitário porque os homens ainda não se juntaram a ele."

André Malraux.

"Ricos continuam ricos porque são mesquinhos, e Lucien é a prova vivíssima disso. Quinhentas libras por uma lavagem de sofá? Ele queria me extorquir."

Eu terminei a refeição mais devagar, refletindo sobre o absurdo que era aquele valor. Lucien terminou primeiro, pegou a tigela e a colocou na lava-louças. Bem que Marcela poderia colocar uma lá na pensão, mas ela sempre dizia que preferia "trabalho braçal". E foi nesse costume de bucha e sabão que, até quando fui morar com Nicholas, eu ignorava completamente a existência de uma máquina de lavar louças.

Pensar em Nicholas, no entanto, me lembrava que todas as minhas roupas e produtos de higiene estavam na casa dele. Eu precisaria ir pegar. Certamente ele nem estaria lá, mas voltar ao mesmo lugar onde experimentei tanto os melhores quanto os piores momentos trazia um certo desconforto. E o pior seria quando eu voltasse para a pensão, de mala e cuia, e Marcela descobrisse que Nicholas havia terminado comigo, voltando para sua esposa, depois de me prometer que nunca me faria sofrer.

— Que merda! — praguejei, batendo a mão na mesa. A dor foi imediata, e soltei um "Aí!" enquanto começava a sacudir a mão, tentando aliviar o desconforto. Logo, comecei a praguejar baixinho.

— Tome cuidado, ou você vai quebrar minha mesa... Ou está afim de aumentar a sua dívida? — Lucien disse com um sorriso irônico.

— Não sabia que sua mesa era feita de areia, e muito menos que eu havia feito um trato com um agiota. — retruquei, irritada. Ele soltou uma gargalhada, e eu revirei os olhos, mas não consegui segurar o sorriso que surgia.

— Você é uma graça! — comentou, me fazendo sentir uma mistura de vergonha e diversão. — Mas me diga, qual é o motivo desse surto repentino? — perguntou, curioso.

Respirei fundo e relaxei os ombros, tentando retomar a calma.

— São tantas coisas que eu não sei por onde começar. — suspirei, sentindo o peso da situação.

— Nicholas terminou comigo, estou desempregada, com uma dívida sem sentido, que espero sinceramente que seja só uma brincadeira sua. — fiz uma pausa, respirando fundo. — E ainda tem as minhas coisas que ficaram no apartamento... E, por último, e talvez o pior de tudo, estou sem coragem de contar pra Marcela sobre o término. Tenho medo dela ir até a empresa atrás de Nicholas com um cabo de vassoura. — terminei de falar e, por um momento, Lucien ficou em silêncio.

Ele começou a rir, mas logo parou quando percebeu que eu não estava brincando.

— Essa parte do cabo de vassoura é só uma piada, né? — perguntou, com um sorriso nervoso.

Mantive a seriedade.

— Eu queria que fosse. Mas, quando se trata de mim, Marcela arrumaria briga até com a Rainha Elizabeth. — respondi, e observei a expressão de Lucien mudar, seus olhos se entristeceram por um segundo, mas ele rapidamente disfarçou com um sorriso forçado.

Ele então se levantou, abriu o lava-louças e começou a guardar os pratos, como se quisesse desviar a atenção da conversa pesada.

— Olha pelo lado bom, tem alguém que se importa o suficiente com você para ir até uma empresa com um cabo de vassoura te defender... — ele tentou descontrair, e eu não pude deixar de sorrir, imaginando a cena. — E, bem, ela vai descobrir, de qualquer jeito, mesmo que não seja por sua boca. Nicholas e Amélia são figuras públicas, e alguém vai acabar noticiando a reconciliação deles. — completou.

REALIDADE PARALELAOnde histórias criam vida. Descubra agora