E lá estava aquele trem descarrilhado, indo em direção a lugar algum. Ele tinha o azar de ser um passageiro. Já tinham desgraçado tudo, de uma maneira que achava impossível piorar mais a situação. Claro, era um devaneio. O outro membro da família de merda - seu irmão - resolveu cortar mais um fio errado de uma das bombas-relógio escondidas do clã, explodindo o último pilar que mantinha um pouco da ordem.
Mas ele era inteligente, sabia bem da maldição carregada em seus avôs e pais. Deveria ser algo enrolado até mesmo nas almas de seus ancestrais. O amor existia, sabia bem disso. Não era um jovem frustrado com romance quando decidiu ir pelo celibato. Nunca sentiria o gosto da carne, o fogo dos corpos para aquecê-lo no mais frio inverno.
Não pensava em si, mas na pessoa ao seu lado. A maldição a arrastaria e quatrocentos mísseis viriam em direção a pequena cidade do seu cérebro a qual chamamos de sanidade. Vê-la partir para sempre seria o seu fim.
Observou bem o término dos romances da família, toda a tragédia por não conseguirem lidar com sua solidão. Disso, procriaram, era a vez dos novos herdeiros carregarem o fardo. Se dependesse dele, o ciclo seria quebrado.
Mas tinha seu irmão, seu lindo e adorável irmão mais velho, aquele que, como diziam, arranjava um jeito para tudo, com a sua luxúria do tamanho do seu ego, talvez até maior. Foi em uma noite que descobriu, o quanto longe iam os membros daquele hospício, loucos para saciar o desamparo.
A porta entreaberta lhe fez um convite. Ouviu o primogênito arfar e não pensar muito no que fazia, era um animal totalmente a mercê do prazer pecaminoso daquele ato blasfemo. Na cômoda, o retrato de sua falecida mãe os assistia. Sentia que a mulher que lhe deu a luz, estava de alguma maneira, assistindo junto com ele aquela perversão. Seus ouvidos se preenchiam com as palavras sujas que ele soltara ao aumentar a força das estocadas. Sim, tinha chegado ao limite, o forte gemido rouco o havia entregado. O irmão dava seu líquido ao seu pai, como o progenitor fez com sua mãe, dando-lhe a vida.
Assim, movia-se o mundo. Os seres humanos em sua constante busca por alguém. Cada pessoa, ao escolher juntar seu corpo com algum membro da família, morreria sem explicações.
Todavia, era impossível para eles se fecharem completamente. Chegou o momento onde decidiram não arriscar mais a vida de estranhos, não significando o fim de uma boa dose de sexo.
Eram amaldiçoados, então encontravam conforto entre si. O próprio sangue. O trem estava cada vez mais próximo de bater.
Contudo, ele agradecia, não havia tido uma irmã. O resultado, caso tivesse tido uma, seria catastrófico. Ela engravidaria, dando à luz a uma criança amaldiçoada de várias maneiras, a calamidade que carregavam não seria a única coisa que a pobre inocente sofreria, teria que chamar seu próprio avô ou seu próprio irmão de pai.
Novamente, digo e volto a repetir sobre o como ele pensava mais do que todos os outros juntos, apesar de que sua mente esteja a se dissolver pouco a pouco pelo ácido das palavras e imagens que ouvira aquela noite:
"Oh! Jovem! você sabe o que fazer, sua salvação é aquilo, na última gaveta da cômoda. Apenas em caso de emergência, você me diz? Isso é uma grande emergência!".
Um, dois três...Contou até meia noite, precisava ter certeza de que ninguém sairia de casa pela manhã. Respirou fundo, bebeu sua última cerveja, assistiu seu programa favorito uma vez mais. Recordou do amor que nunca teria, amando-a apenas em sua completa melancolia - até o bater do relógio -
O soar do medidor era o sinal, o encerramento do romance não concretizado e a agonia de vinte primaveras que mais pareciam mil. Compreendia que, os atos asquerosos não fossem o fim de tudo. Um dia, acabariam agindo sem pensar, emprenhando uma desconhecida por acidente, talvez em noite de bebedeiras. O ciclo vicioso de antes retornaria.
Entrou em quarto em quarto, disparou seu ódio em todos os presentes, não permitiria outro infeliz, outro dele, privado de algo que o faria humano. Não, não permitiria mais alguém preso em uma jaula, assistindo os amores alheios, sem poder ter o seu próprio.
Quando terminou, sentiu que não poderia confiar em si mesmo, não saberia por quanto tempo conseguiria manter aquela maneira de vida. Enfim, disparou em seu próprio coração, o local que mais lhe machucava.
O trem havia batido.
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Em algum canto do mundo
Random"Em algum canto do mundo" são pequenos contos sobre pessoas tentando lidar com problemas e algumas situações bastante delicadas, tendo um leve toque sombrio. Em um conto, um homem sem um nome revelado tenta lidar com a perca de seu primeiro amor. Em...