Cap 09 - Melodias

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Eu amo música! Músicas me fazem relaxar, me alegram, me fazem chorar, me fazem pensar... E aqui, relaxada no sofá, estou fazendo isso: pensando.

O encontro com Sérgio despertou sentimentos conflitantes, mas a frase que ele usou era o que mais me tocava. Eu exalava essa vontade de salvar um homem? Isso estava tão na cara assim?

Se estava, era minha perdição. Porque eu não conseguiria salvar ninguém, só acabaria machucada e confusa. Como estava agora.

O demo tocava no meu som, mas eu ainda não estava analisando profissionalmente como deveria, apenas ouvia a música, com a cabeça em outro lugar.

Peguei o celular e enviei uma mensagem pro Rico. Ele não estava online, mas torci que lesse logo.

Valerie: Você estava certo desde o início... A síndrome de salvadora é minha tragédia.

Rico não respondeu. Devia estar ocupado. Com alguma criança ou mulher. Eu nunca sabia o que sugava mais as forças do meu amigo, e me dei conta de que fazia um tempo que ele não falava de alguma conquista nova. Renegerado?

Ri. Não! Isso não fazia o estilo de Rico. Talvez o trabalho o tivesse sugando. Meu amigo é o melhor pediatra de todos! Quando está com uma criança, parece outra pessoa, tão doce e encantador. E com aqueles olhos dourados, é fácil criar clientela, as mães o adoram!

Olho o celular e nenhuma resposta. É melhor deixar meu drama em suspenso e me concentrar no trabalho.

Passo a hora seguinte ouvindo de verdade o demo, volto as músicas algumas vezes e estou impressionada. Os caras são muito bons. Um pop rock de muito estilo e personalidade. A voz do vocalista era rouca, deixando as músicas bastante envolventes. Ponto positivo! As mulheres adoram esse tipo de voz.

Escolho a música preferida do demo, que tem cinco no total, e coloco para repetir. Fala sobre escolhas e erros, talvez tenha caído nos ouvidos certos.

Enquanto a música toca, pego o envelope e passo os próximos minutos lendo a entrevista e avaliando as fotos. O grupo é formado por quatro rapazes.

O maior segura baquetas, com certeza baterista. Usa um chapéu preto, blusa de listras pretas e brancas e calça preta, um tênis velho. É loiro, nariz meio torto que deixa ele charmoso. Tatuagens no pescoço e na mão direita, mas pela foto não dá pra saber de que é.

Tem outro do lado que em contraste é o menor do grupo. Não dá pra saber o que ele toca, porque não está segurando nada. Tem uma cara engraçada e uma barba grande que o deixa muito mais velho do que sei que ele é. Nenhuma tatuagem à vista, mas a calça cáqui com a blusa vermelha o deixam irreverente, também usa um alargador na orelha esquerda.

O grupo tem estilo.

Do lado oposto, tem outro loiro, estatura mediana e rosto alegre, com cara de 16 anos e sorriso bonito. As meninas vão suspirar por ele. Isso é muito bom! Roupa quase normal, calça jeans, blusa preta e um coturno com a borda xadrez, que eu adorei!

E por último o vocalista. Sei disso porque está mais à frente e tem cara de líder. Diferente de todos os outros, ele não parece um garoto, mas um homem. Tem uma barba por fazer bem desenhada nos cantos, um sorriso bonito e olhos pretos firmes e focados, como se dissesse com os olhos o que quer.

Fico olhando um tempo pra ele. Pego outras fotos e o olhar focado está sempre lá. É a marca dele. E desse, são as mulheres que vão gostar.

O barulho do celular me desconcentra. Se passaram duas horas desde a mensagem que mandei pra Rico, mas não era ele.

Clara: Como ta indo?
Valerie: Bem, a banda é boa. Acho que já tenho algumas coisas em mente
Clara: Boa garota!
Valerie: :)
Clara: Grite se precisar
Valerie: Obrigada Clara! Até amanhã!
Clara: Até!

Dei uma olhada no contato do Rico e fazia mais de quatro horas que ele tinha usado o aplicativo, torci para que ele logo desse notícias. Sentia que apenas ele poderia me entender de verdade naquele momento, torci também que não tivesse acontecido nada demais.

O resto do dia foi produtivo. Anotei todas as ideias, para que conseguisse elaborar um projeto focado e firme. Como o olhar do vocalista. Aliás, qual o nome dos garotos?

Lúcio, o baterista. Verner, o guitarrista. Leandro, o baixista. E Romeu, o vocalista.

Romeu. Podia ser mais clichê? Ri. As garotas e mulheres babariam por ele. Com esse nome então, poderiam até morrer. O caminho era bom e promissor.

O resto do dia eu passo ouvindo músicas. Tudo que tinha nas mais variadas playlists, rock, jazz, sertanejo, mpb... Eu ouço de tudo e sou grata por trabalhar com isso.

Tomei banho e fui deitar cedo. Talvez as emoções do dia tivessem sido intensas, e eu me sentia exausta. Adormeci.

Batidas na porta me acordaram sobressaltada. Ainda estava escuro. Olhei o celular e era 02:15. Quem batia na minha porta aquela hora?

Acendi a luz da sala, ainda me sentindo sonolenta e confusa. Olhei pelo olho mágico e era Rico. Estremeci e rápido abri a porta.

-Desculpe não ter respondido a mensagem.

-Não precisava vim até aqui pra responder.

Ele sorriu e eu soube que tinha alguma coisa muito errada.

-Entra logo, já me acordou mesmo.

Ele entrou e se jogou no sofá.

-Vou fazer um chá, você quer?

-Chá?! - Resmungou - Não tem nada mais forte?

-Café?

-Algo com álcool?

-Não.

-Traz a droga do chá então.

Fiz chá de camomila com laranja para nós dois. Voltei pra sala e Rico estava com o olhar perdido.

-Não me diga que você veio aqui a essa hora só pra tomar chá e olhar minha cara amassada. - Falei sentando ao lado dele no sofá.

-Você me dá paz Vale.

Disse tocando no meu joelho e apertando. Ele parecia um garoto perdido e eu estava ainda mais confusa.

-Eu não quis ir pra casa. Ficar sozinho olhando pras paredes.

-Você sabe que pode vim quando quiser. Mas, o que houve Rico?

Ele tomou um gole do chá e fez uma careta. Depois olhou pra mim e seus olhos eram tão tristes. Eu apenas o abracei e ele chorou. Eu nunca tinha visto o Rico tão abalado.

Ele não parecia pronto para falar. Então ficamos num silêncio confortável, esperando que as palavras se sentissem prontas para sair. É bom se ter um amigo que divide até os silêncios da vida com você. O Rico também me dava paz.

Ímã de Traste (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora