Cap 04 - Florais e Pedras

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Eu estava sorridente e confiante, tinha conseguido marcar minha consulta com a terapeuta Magda Luz, para o final da tarde naquele mesmo dia. É claro que liguei nas primeiras horas da manhã e a secretária dela não gostou muito da minha ligação, mas por favor, todo mundo já está acordado às 6:00 da manhã!!

Mesmo com o mau humor da secretária, ela logo agendou minha consulta e eu garanti que era caso de vida ou morte, já que meu coração não aguentaria outro golpe parecido.

Passei a manhã ignorando as mensagens do quarteto. Até silenciei o grupo no Whats. Eles não iam desistir e uma hora eu iria perdoá-los, mas me dava prazer ser má um pouquinho.

O dia no trabalho foi agitado, eu não podia pensar muito, então consegui fazer bem todas as tarefas acumuladas desde o sumiço de Alex, então era muita coisa mesmo.

Almocei um sanduíche e um suco de manga, sem tirar os olhos do computador e meu novo relatório. Agora a análise era sobre o potencial de uma dupla romântica. Eram dois irmãos, o menino fazendo a primeira voz e a menina a segunda. Para mim eles pareciam bons, mas faltava certa originalidade. O que não impedia o sucesso, já que o rapaz era um gatinho e as adolescentes cairiam em cima.

Depois de algum tempo fazendo essas análises, algumas coisas acabavam virando instinto. Berne, meu patrão, sempre elogiava meu desempenho nas reuniões trimestrais e Clara ficava orgulhosa de eu ser sua pupila.

Terminei o expediente e tinha folga no tempo para chegar pontualmente à terapia. Estava me sentindo ansiosa. Essa Magda Luz tinha de ser boa. Estava apostando todas as minhas fichas nela, só esperava não ficar falida também.

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O consultório da tal Magda não ficava num edifício comercial suntuoso, como eu esperava. Na verdade, era uma casa bem simples que ficava no subúrbio e que me fez errar o caminho inúmeras vezes, até eu me lembrar da existência do bendito GPS.

Estacionei e respirei fundo, será que era a coisa certa?

Tinha de ser. Que outra alternativa eu tinha?

Fui até a frente da casa, que tinha um simpático jardim com umas flores brancas, que eu não fazia ideia de quais eram. Mas não tinha nenhum interfone ou campainha que eu pudesse tocar. Bati palma como se faz no interior, aquilo era bem pitoresco.

Não demorou a que uma moça baixinha e magrela, viesse abrir. Ela sorria e eu retribui. Se aquela era a secretária, eu esperava que não brigasse comigo pelo horário que tinha ligado.

-A senhora Magda Luz a aguarda.

Fui conduzida a uma sala com uma mesa redonda, forrada com uma toalha roxa, cheia de estrelas douradas. Insenso dava um ar perfumado, que eu odiava! Insenso fede, as pessoas não notam isso?

Sentei numa cadeira e aguardei. Magda Luz entrou por uma porta que tem aquelas cortinas que fazem barulho, cheia de pedrinhas. Eu também odeio isso!

Mas dei um desconto, se ela resolvesse meu problema, poderia acender todos os insensos do mundo e passar por aquelas cortinas barulhentas quantas vezes quisesse.

-Boa tarde querida...

-Valerie.

Estendi a mão para cumprimentá-la. Ela pegou minha mão, apertou com força e fechou os olhos por alguns segundos.

-Problemas querida?

-Sim.

Por que eu estaria aqui se não tivesse problemas?

Pensei enquanto ela indicava que eu voltasse a me sentar. Aquilo estava estranho. Eu esperava um divã, uma mulher com óculos, terninho e postura impecável, com cara de paisagem e me perguntando sobre meu pai. Não era assim que os terapeutas eram?

Aquela mulher parecia mais uma vidente ou uma tentativa. Com seus cabelos vermelhos de fogo, volumosos como os da Maria Betânia. Tinha uma sobrancelha tatuada, que deixava seu olhar artificial, mas de certa forma combinava com todo o resto, caricato.

Não se prenda às aparências! Ralhei comigo mesma.

Magda pegou um cristal que era pontudo e estava preso num cordão de couro. Começou a balançar na minha frente como se quisesse me hipnotizar. Hãn?!

-Senhora...

-Não fale querida, isso atrapalha a energia.

Me calei. Mas minha mente fervilhava. Eu não acreditava naquelas bobagens, aquilo não era terapia! Acho que ela percebeu a ruga em minha testa e parou.

-Agora fale querida.

-Desculpe meu desconhecimento, mas a senhora é formada em Psicologia?

Ela deu uma risada estranha.

-Sou formada pela vida querida, por aquela sabedoria que os livros não dão.

-Hum... É que  a verdade eu queria entender algumas coisas sobre mim sabe? Freud explica e tal... - Falei sem jeito.

-Freud era um sujeito complicado, não acho que ele possa explicar nada a ninguém.

Eu ri. Achei que era uma brincadeira para quebrar o gelo. Mas ela continuou me fitando impassível. Parei. Era sério tudo aquilo. Onde eu tinha me metido?

-Por que não me conta seu drama Valerie?

A forma que ela pronunciou drama, me fez sentit uma histérica adolescente que chora porque quebrou a unha. Mas quem está na chuva tem de se molhar, é a regra.

-Meu problema é com homens.

-Sempre é querida.

Falei tudo. Saiu como uma enxurrada de palavras e frases desordenadas. Ela apenas assenria e manteve a expressão de quem sabe tudo.

-É isso. - Falei me lembrando de respirar.

-Bem... Acho que posso ajudá-la.

Sorri aliviada. Esperava mesmo que pudesse.

Ela começou a recitar um mantra, repetindo "aum, aum", depois balançou o cristal e saiu. Quando voltou, trazia consigo algumas garrafinhas e pedras.

-O problema está nas suas energias. - Começou - Acho que você precisa desenergizar seu coração. Aqui está tudo de que precisa.

Olhei para o que ela tinha trazido e tentei não parecer assustada demais. Ela estava falando sério?

-O que é isso?

-Florais querida. E pedras energizadas. Uma do amor, outra da paixão e outra da tranquilidade.

Continuei olhando-a descrente. Mas ela não pareceu notar, ou fingiu.

-Este aqui, você tomará pela manhã, três gotas.

Ficou lá falando suas instruções esdrúxulas e eu me sentindo mais uma vez enrolada. Eu deveria tomar florais três vezes ao dia, dar banho de sal nas pedras e mantê-las pelo de mim. Pronto, era a fórmula do sucesso. Eu também deveria retornar uma vez por semana, para que ela limpasse minha energia com um ritual de Heiki. É claro que tudo aquilo custava uma fortuna.

Dei uma desculpa sobre não ter levado o cartão de crédito, e que voltaria no dia seguinte para pegar os florais e as pedras.

Paguei a consulta, uma fortuna! E fui embora.

Mais pobre e muito confusa.

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Desculpem a ausência dos travessões, escrevo no celular e meu teclado não tem. Obrigada pela leitura! Espero a opinião de vocês!
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Ímã de Traste (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora