Capítulo 4 - Lua Cheia

35 9 1
                                    

Santarém, 2017

Dessa vez, ela estava posta em uma vitrine, ao lado de objetos tão antigos quanto ela. O lado bom era que de onde estava, podia visualizar algo diferente do mar conhecido em Encantos. As pessoas que ali passavam, costumavam chama-lo de rio. E podia sentir o brilho da lua cheia entrar pelo vidro. Sempre que essa fase chegava, um rapaz vinha admirar a vitrine. Ele tinha olhos castanhos e um sorriso tímido. Parecia estar sempre procurando o ponto mais bonito. Ela torcia para que ele continuasse vindo, era o mais próximo que ela chegara a uma relação.

Santarém, 2018

Belle não entendia por que depois de tanto tempo no mesmo lugar, não era levada embora outra vez. Mas, essa era a semana que veria aquele rapaz quase todos os dias. Seu olhar brilhava tanto quanto a lua quando a observava e ela podia sentir. Mas, em seu íntimo, temia seu sentimento. Caso ele se apaixonasse, significaria a sua mais nova amargura.

Santarém, 2019

Depois de tantos anos sentindo e convivendo com inúmeras dores, Kauê comemorava a primeira de suas muitas vitórias. Fora aprovado na Universidade, estava estudando com as folhas perdidas próximas as escolas, e cursinhos pré-vestibulares. Juntamente com as doações que Jão conseguira. Deixou de comer para comprar livros, mas não se arrependia. Infelizmente, sua nova rotina não permitia as visitas mensais à bailarina da vitrola. Mas, ele se aproximava do sonho de a ter.

Santarém, 2025

Seis anos se passaram e agora Kauê era um homem formado. Estudou o bastante para conseguir o que tanto almejou. Por conhecer a cidade inteira e principalmente por ser admirado, agora trabalhava em um escritório renomado. Tornou-se um advogado, mas, carregava no peito a dor de ter perdido quem mais acreditou nele para o vício: Jão. Por isso, desde aquela fatídica noite ele visitava o túmulo de seu melhor amigo. A bailarina da vitrola era menos visitada, ele já a conhecia de cor. Era uma manhã de sábado quando percorreu a travessa 15 de novembro em direção à avenida Tapajós. O grande dia chegou, ele finalmente iria adquirir a caixa de músicas.

— Quanto custa a bailarina? — perguntou a vendedora mais próxima da vitrine. Depois de tanto tempo, ainda estava lá. Empoeirada e com a pintura gasta, talvez fosse o destino.

— Custa R$ 4035, senhor. É uma peça muito antiga— A vendedora ofereceu, sem deixar de torcer a boca com o valor — Posso lhe dar um desconto de 10% à vista.

Talvez não fosse o destino, ela não havia sido vendida por que custava caro demais. Ainda assim, estava balançado em compra-la. Mesmo com seu salário atual, a conta demoraria anos para ser paga.

— Kauê? — A jovem que costumava lhe oferecer água enquanto ele trabalhava por ali a tarde chamou. Ele sempre a esperava na mesma vitrine. — Eu posso mudar esse valor, vem. Sei que você deseja isso há muito tempo, ninguém vai nem dar falta dessa peça.

A Bailarina da Lua CrescenteOnde histórias criam vida. Descubra agora